Dilma, Temer e o Congresso foram avisados várias vezes nos últimos 42 meses sobre os riscos de paralisação do país. Ninguém se mexeu. Deu nisso que está aí
É farta a
documentação demonstrando que Dilma, Temer, governadores estaduais e o
Congresso passaram os últimos 42 meses, literalmente, enrolando na discussão de
alternativas para o setor de transporte de cargas. O custo da letargia será um
bilionário subsídio, socializado pelo aumento de tributos no curto prazo. No
domingo, 26 de outubro de 2014, quando Dilma foi reeleita, o problema já
dormitava em sua mesa no Planalto. Nem prestou atenção, até porque vivia um
paradoxal “luto” da vitória, segundo a descrição feita pelo aliado Lula, no
livro “A verdade vencerá”: “A sensação que tive foi de que ela não tinha
gostado de ganhar.” Ambos governaram segurando os preços da Petrobras.
Ela
demorou a reagir. Em fevereiro de 2015 houve bloqueio de rodovias, sob a
alegação de que mais de 90% do frete entre São Paulo e Nordeste estavam sendo
consumidos no custo de óleo diesel, pedágio e manutenção dos veículos. Dilma
autorizou Miguel Rossetto (PT-RS), chefe da Secretaria de Governo, a receber
representantes do setor. Depois do carnaval. Duas
semanas depois, sancionou em ato fechado a Lei dos Caminhoneiros, aprovada pelo
Congresso. Rossetto tratou-a como dádiva pela “liberação das rodovias”. A lei
previa coisas não efetivadas, como isenção de pedágio para caminhão vazio —
anunciada de novo no último domingo, agora ao custo de R$ 50 milhões mensais.
Nada
aconteceu nos oito meses seguintes de 2015, além de três reuniões, a última num
certo “Departamento de Diálogos Sociais” do Planalto. Até que na terça-feira 9
de novembro, caminhões pararam em 14 estados. José Eduardo Cardozo (PT-SP),
ministro da Justiça, anunciou aumento de multa por bloqueio. Os
protestos voltaram em janeiro de 2016. Dilma acenou com uso da força: “Meu
governo não ficará quieto”. Cardozo enxergou “vários crimes”, e o ministro dos
Transportes, César Borges (DEM-BA), viu conspiração. As conversas só foram
retomadas em abril, cinco semanas antes do afastamento de Dilma da Presidência. Em
agosto, sob Temer, caminhoneiros se queixaram no Senado dos compromissos não
cumpridos. Repetiram advertências sobre “parar o país”. Promessas legislativas
adormeciam.
Quando
Temer completou o primeiro ano no Planalto, transportadoras paulistas
divulgaram um video sobre como fazer “a sociedade entrar em colapso”. O governo
atravessou os 19 meses seguintes fingindo que o problema não existia. Na
quinta-feira 5 de outubro de 2017, chegou outra advertência à Casa Civil. Temer
foi visitar a base espacial, no Maranhão. E o chefe da Casa Civil, Eliseu
Padilha (PMDB-RS), foi para casa, em Porto Alegre, em voo da FAB por “motivo de
segurança”.
Passaram-se
sete meses. No último 14 de maio, novo documento chegou ao Planalto. Nele,
pedia-se que “o governo leve mais a sério!!!” Ameaçava-se: “Imagine o Brasil
ficar sem transporte por uma semana, ou mais???” Temer e Padilha estavam
dedicados à campanha “O Brasil voltou, 20 anos em 2”. E o chefe da Secretaria
de Governo, Carlos Marun (PMDB-MS), curtia Nova York. Novo
aviso aterrissou no palácio 48 horas depois: “É altamente inflamável, como
palha seca”. Indicava até a data (21/5) dos protestos. Nesse enredo de 42 meses
ninguém se mexeu na máquina de 53 mil órgãos, com mais de 49.500 chefes,
espalhados por 1.400 cidades. Deu nisso aí.
José Casado - O Globo