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sábado, 16 de fevereiro de 2019

Uma demissão desnecessária


O caso Bebianno não poderia se encerrar com a aparente derrota de Carlos Bolsonaro, o filho 02, ou a do próprio presidente, obrigado a suspender, pelo menos temporariamente, a demissão do chefe da Secretaria-Geral da Presidência. Mágoas certamente ficariam, de todos os lados, e dificilmente seriam superadas. O vereador Carlos, ao retomar suas funções, assinou uma petição na Câmara do Rio para homenagear o vice-presidente da República Hamilton Mourão. De quem insinuou certa vez ter interesse na morte de seu pai. É um recuo e tanto para um pitbull como Carlos que, ao contrário de seu poodle Pituka, não é de amansar a troco de nada. Vê-se agora que sabia que venceria essa queda de braço.
O caso fora resolvido com a desistência temporária de demitir seu ministro porque Bolsonaro fora confrontado com a gravidade da situação por ministros militares do nível do Chefe do Gabinete Institucional (GSI) Augusto Heleno, e políticos, como o Chefe do Gabinete Civil Ônix Lorenzoni. O primeiro, dando a dimensão da crise institucional que a demissão intempestiva acarretará, o outro mostrando a importância politica de manter-se o governo fora de turbulências desnecessárias, especialmente agora que a maioria potencial do governo precisa ser organizada para aprovar a reforma da Presidência.


Essa dimensão do cargo que ocupa, de que não é mais um deputado, como salientou o presidente da Câmara, é o que parece estar faltando a Bolsonaro. A foto dele despachando com ministros e assessores vestindo a camisa falsificada do Palmeiras é exemplo de que não respeita a liturgia do cargo, de que não tem nem quer ter a compostura que a presidência da República exige. Bolsonaro precisa descer do palanque imediatamente. As sandálias de plástico que usava na foto oficial são da mesma origem das caspas que Jânio Quadros jogava sobre os ombros, para compor um personagem “gente como a gente”. Mas Jânio deixava o populismo para o palanque, era até excessivamente formal no cotidiano presidencial.
O agora ex-ministro Gustavo Bebianno negociou sua permanência no cargo com políticos e militares, e surpreendeu o presidente Bolsonaro no primeiro momento com o apoio que recebeu. Agora o governo terá que dobrar esforços no Congresso para superar a falta de intermediários gabaritados durante as negociações sobre a reforma da Previdência. Um dos casos que tocou um nervo exposto da família Bolsonaro foi o contato de Bebianno com interlocutores considerados “inimigos”, na busca de ampliar apoios para a aprovação da reforma.

A demissão do ministro Gustavo Bebianno é a confirmação de que existem no governo três figuras mais importantes que ministros, ou qualquer outro assessor, ou mesmo aliado político: os filhos do presidente. Para piorar, os três têm mandatos eleitorais, Flávio de senador, Eduardo de deputado federal e Carlos de vereador. Podem, portanto, defender suas ideias e projetos das respectivas tribunas, e cada palavra que proferirem será considerada uma mensagem do presidente à sua base política.
A saída de Bebianno gera uma crise política extemporânea, no momento em que o governo quer aprovar a reforma da Previdência. Bolsonaro tem apenas uma suposição de base majoritária na Câmara, que vai precisar ser organizada, e os coordenadores do PSL não têm experiência. Bebianno seria um interlocutor do governo com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que deverá comandar as negociações. Não foi por acaso que Maia deu uma declaração forte, afirmando que Bolsonaro não é presidente da associação dos militares.
A relação do presidente da Câmara com o ministro do Gabinete Civil nunca foi boa, apesar de os dois serem do mesmo partido, o DEM. A conexão entre Rodrigo Maia e Bebianno, assim como com o ministro da Economia Paulo Guedes, é que ajudaria a facilitar a tramitação da reforma da Previdência. A impressão que ficou entre os políticos é que o presidente estava usando o filho para forçar a saída de Bebianno. E o sentimento generalizado é de preocupação, pois Bebianno era considerado um homem de confiança de Bolsonaro, e nessa qualidade ganhou a simpatia dos políticos como canal de comunicação com o Palácio do Planalto.


Se na primeira discussão com um dos seus filhos o presidente joga ao mar um aliado de primeira hora, o que dizer de outro qualquer? Os militares também se preocupam com a ingerência dos filhos, pois acham que nenhum ministro ousará discordar deles, o que causa imensa insegurança institucional.
Merval Pereira - O Globo