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terça-feira, 30 de maio de 2017

A campanha da fraude

A reunião do Jaburu concentrou muita atenção, por claros motivos que o Brasil ainda debate. Em segundo plano ficaram outras revelações do empresário Joesley Batista, como as que ajudaram a explicar o uso do BNDES como nova central de propina. Abonar a equipe técnica da instituição não é o mesmo que blindar as operações como se elas não pudessem ser investigadas.  Com Dilma eu falei das duas contas e ela sabia que o dinheiro era do BNDES. Falei que, se gastasse os R$ 30 milhões com o Pimentel, acabava. Ela falou para encontrar o Pimentel e fazer a doação.” Essa foi uma das várias frases de Joesley sobre o uso do banco por Guido Mantega e Dilma.

Ele relata cada negócio com o BNDES e como era feito o pagamento. Revela que tudo foi gasto na campanha de 2014. Avisa que podem torturá-lo que não dirá que houve participação de funcionários. Mas conta que a conversa com Guido era tão clara que levava extratos das duas contas no exterior nas quais depositava os subornos pagos durante os governos Lula e Dilma.  A propina paga a Pimentel foi acertada diretamente. Depois de receber a ordem da presidente Dilma, ele foi se encontrar com o candidato a governador de Minas. “No mesmo dia eu peguei um avião e encontrei Pimentel no aeroporto e falei: está tudo certo, os R$ 30 milhões estão autorizados, e ele fez um comentário: ‘a presidente me ligou dizendo que está tudo certo e que você me daria os R$ 30 milhões’. Foi o encontro num hangar. Para viabilizar, ele me apresentou o dono de uma construtora que me vendeu 3% de um estádio, o Mineirão, e eu virei sócio do Mineirão.”

Joesley conta que a porta de entrada dele no governo foi Mantega e que o meio de chegar aos empréstimos e operações de venda de debêntures e ações foi a propina. No começo, ele foi abordado por um amigo de Mantega, Vic (Victor Sandri), que cobrava 4% sobre cada operação. Depois, ele procurou o então ministro.  “Fui bem objetivo com ele. Disse: olha ministro, eu tive umas questões pessoais com o Vic e eu queria ver se poderia tratar diretamente. Teria algum problema? Ele disse que não, que poderia falar. (...) Comecei a interagir com o Guido sobre a possibilidade de dois negócios” (as compras do frigorífico Bertin e da Pilgrim's Pride nos Estados Unidos). “Eu disse, ministro, eu tratava com o Vic e pagava para ele. Agora, como eu faço? Ele disse: ‘fica um crédito contigo, no dia que eu precisar eu falo.’ Eu disse, mas o Vic cobrava um valor, como vou acertar com você? Ele perguntou como era, eu disse que era um percentual. Ele respondeu que com ele seria caso a caso. ‘O que você achar que é importante, você credita’. Quando chegou em 2014 o dinheiro foi todo usado na campanha da Dilma”. Seguindo orientação de Guido foram abertas as duas contas, uma referente à era Lula e outra à era Dilma.

Guido só fez duas movimentações que não foram para campanha. Uma foi estornada depois de um tempo e outra foi um investimento de US$ 5 milhões numa empresa, a “Pedala Equipamentos Esportivos”. A empresa não deu certo e perdeu-se esse dinheiro.
Joesley diz que perguntou se Lula e Dilma sabiam, Mantega respondeu que sim. Com Lula, Joesley teve conversa superficial, apenas para dizer que as “doações” estavam altas demais. Lula ouviu em silêncio. Com Dilma, segundo Joesley, a conversa era aberta. Ao longo da campanha da ex-presidente, o dinheiro foi sendo repassado aos poucos, diante de pedidos de Edinho. “Ele (Guido) me dava um papel dizendo os valores: PMDB, R$ 35 milhões, PT, R$ 30 milhões, PCdoB, R$ 10 milhões. Eu passava para o Ricardo, que entrava em contato com o Edinho.” (...) “Os saques foram até zerar a conta. Acabou a conta da Dilma e depois acabou a conta do Lula. Foram R$ 360 milhões, que eram os US$ 152 milhões na época.”

O apoio foi além do setor de carnes. “Em 2011 houve a construção da Eldorado, a maior fábrica de celulose do país na época. O BNDES deu R$ 2 bilhões como financiamento. Isso só saiu porque o Guido ajudou”.  Mantega ontem admitiu que foi ministro da Fazenda por oito anos e não declarou uma conta com US$ 600 mil no exterior. Mas a principal suspeita que recai sobre ele foi ter cobrado propina. Joesley prometeu entregar documentos e isso sela o destino do ex-ministro e tira qualquer dúvida de que a campanha de 2014 foi fraudulenta, esse dilema que consome o TSE há mais de dois anos.

Fonte: Coluna da Míriam Leitão em O Globo - Com Alvaro Gribel