Essencial para o bom andamento dos trabalhos é que a carroça seja levada pelos bois. Do contrário, nem carroça nem bois vão a lugar algum. Mal comparando é o que acontece com a aludida candidatura de Michel Temer para presidente em 2018.
Há três hipóteses para que o assunto seja ventilado como foi pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia, em entrevista ao Estado e por ministros que falaram sob a condição de anonimato para a Folha de S.Paulo: desejo de bajular o chefe colocando-o numa dimensão maior que a real, falta de assunto melhor a tratar nesse período de interregno de poder ou produto do que se convencionou chamar de fogo amigo, mas é lança-chamas na mão do inimigo dissimulado.
Tudo o que Michel Temer não precisa é de ser posto na roda da próxima disputa presidencial. Antes disso precisa de muitas outras coisas. Passar pelo período de interinidade é a primeira delas. Não o fará com a tranquilidade pretendida se der sinais de que, uma vez efetivado, usará o cargo para se promover sem respeitar a ordem de entrada em cena de Henrique Meirelles, José Serra, Aécio Neves e Geraldo Alckmin, só para citar os mais óbvios.
Temer precisará também de dar conta do País em 2017 com um mínimo de sucesso. Para isso, precisará das reformas estruturais, para cuja tramitação no Congresso necessita de base parlamentar sólida com maioria de mais de dois terços da Câmara e do Senado. Nesse campo, precisará estar preparado para contrariar interesses políticos e corporativos, o que provavelmente não lhe renderá a condição de líder popular.
A conturbar o cenário há as incertezas da Lava Jato que não permitem vislumbrar com clareza quais políticos estarão política e eleitoralmente “vivos” em 2018. Aliás, nem sabemos se Michel Temer chegará lá na posse plena de seus direitos políticos. Hoje, o presidente em exercício está inelegível por uma decisão do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, relativa a doações de campanha acima do limite permitido, à qual cabe recurso à instância superior (TSE).
Logo, há uma boiada a ser amaciada antes de se pôr a carroça na estrada.
Força do hábito. Em 2005, quando Duda Mendonça admitiu à CPI dos Correios que havia recebido dinheiro “por fora” pelos serviços prestados à campanha de Luiz Inácio da Silva em 2002, o PT chorou de arrependimento em praça pública, o então presidente cogitou não concorrer à reeleição no ano seguinte e próceres da oposição acionaram a tecla “deixa-disso” a fim de não provocar ações contra Lula que, na concepção tucana, morreria politicamente de inanição. Quem viveu viu o tamanho do forrobodó.
Agora, João Santana diz o mesmo e mais um pouco e não causa o menor espanto. A antiga oposição, hoje governo, faz de conta que o tema não lhe diz respeito. A reação na seara petista é apenas um leve desconforto por Dilma Rousseff, a candidata que teve a campanha financiada do modo relatado por Santana, jogar a culpa no partido a fim de manter a pose da “mulher honesta”. De onde, nesses onze anos decorridos entre os dois episódios o PT além da reputação perdeu a capacidade de se envergonhar.
Duplo sentido. A operação “Resta Um”, da 33.ª fase da Lava Jato, tanto serve como referência ao fato de a empreiteira Queiroz Galvão ter sido a última das grandes construtoras a ser alcançada pelas investigações, quanto pode ser vista como uma alusão ao grande chefe sem o qual, já apontou o procurador-geral Rodrigo Janot, a organização criminosa não teria como operar um esquema tão amplo de corrupção na máquina do Estado.
Fonte: Dora Kramer - O Estado de S. Paulo