Preso, Lula dá falsa sensação de liberdade ao PT
Recolhido à cela especial de Curitiba, Lula enviou uma carta ao PT. Foi lida nesta segunda-feira, numa reunião do diretório nacional da legenda. No texto, o preso oferece aos companheiros uma falsa sensação de liberdade. Gostaria que vocês “ficassem totalmente à vontade para tomar qualquer decisão, porque 2018 é muito importante para o PT, para a esquerda, para a democracia. E para mim, eu quero a minha liberdade”, leu a senadora Gleisi Hoffmann, presidente do PT.Na mesma carta, Lula escreveu que ficou “feliz” com a mais recente pesquisa do Datafolha, que lhe atribui até 31% das intenções de voto na sucessão presidencial —uma disputa da qual não poderá participar, pois, além de preso, tornou-se um ficha-suja. Mas o diretório petista, submetido ao desprendimento de fancaria, renovou o apoio à candidatura do grande líder.
Lula não fez pose apenas para dentro. Sua carta acena também para fora do partido. Fala das “insinuações” que lhe chegaram aos ouvidos. Sem esclarecer a origem, anotou que o falatório dá conta de que, se Lula não for candidato, se fugir dos holofotes e se parar de criticar sua condenação, ficará mais fácil obter a liberdade no Supremo. “Querida Gleisi, a Suprema Corte não tem que me absolver porque eu sou candidato, porque vou ficar bonzinho. Ela tem que votar porque sou inocente e também para recuperar o seu papel constitucional”, leu a presidente do PT. Nesse ponto, a carta de Lula difunde desinformação.
No caso do tríplex do Guarujá, a fase da discussão sobre fatos e provas esgotou-se no TRF-4, o tribunal de segunda instância. As Cortes de Brasília não discutirão senão questões de Direito. Por ora, o que Lula reivindica no Supremo não é sua conversão de culpado em inocente, mas a reversão da regra que permitiu a prisão após condenação no segundo grau. Algo que lhe permitiria recorrer em liberdade para tentar cavar, por exemplo, uma redução na pena de 12 anos e 1 mês de cadeia. Lula não parece interessado em abrir mão de nada —nem da candidatura cenográfica nem da embromação. Preso há duas semanas, sua única nobreza é ser esplêndido em cinzas, espetacularizando seu martírio com notável esplendor. Esforça-se para transformar em pompa o que não passa de decomposição de sua biografia.
Lábia do ‘preso político’ saiu do prazo de validade
O PT
divulgou neste domingo uma mensagem que Lula
gravou em 7 de abril, antes de deixar o bunker sindical de São Bernardo
para se render à Polícia Federal. A peça exibe um personagem sem nexo. Em duas
semanas, a lábia do “preso político” saiu do prazo de validade. Admitindo-se
que o PT ainda queira participar da sucessão presidencial, a exibição do vídeo
inspira uma indagação: o que é que o partido pretende oferecer?
Na
gravação, Lula repetiu que poderia ter dado no pé. Mas ''não quis fugir porque
quem é inocente não corre.” Subiu no caixote: “Não tenho medo das denúncias
contra mim porque sou inocente e não sei se meus acusadores são inocentes”.
Lula não está em cana por conta de “denúncias”. Foi passado na tranca porque se
tornou o primeiro ex-presidente da República condenado por corrupção. É um
corrupto de segunda instância. Além da confirmação da sentença no TRF-4,
há o aval do STJ e a concordância do STF.
Quanto à
''inocência'' de Lula, esse é um estado comum a todos os presidiários, como
explicou o companheiro José Dirceu na semana passada, numa elucidativa entrevista à
repórter Mônica Bergamo. Prestes a retornar ao xadrez, Dirceu declarou que,
atrás das grades, ''todo mundo é inocente''. Didático, acrescentou: ''O cara
matou a avó, fritou o gato dela, comeu. Mas ele começa a conversar com você e a
reclamar que é inocente.” Quem se animaria a contestar um especialista?''
O Lula da
gravação repetiu: “Eu tenho muita honra e quero me defender. Por isso eu estou
muito tranquilo.” Sua honra está encarcerada há 15 dias. Nesse período, o TRF-4
indeferiu o “embargo do embargo”. Restam recursos ao STJ e ao STF. Nessas
Cortes, não há espaço para rediscussão de fatos e provas. Discutem-se questões
de Direito —o tamanho da pena, por exemplo.
Indefeso,
Lula aciona os advogados e os devotos para guerrear contra a regra que
autorizou a prisão de condenados em segunda instância. Contudo, a coerência da
ministra Rosa Weber reduziu a margem de manobra dos apologistas do recuo.
Enquanto reza por uma reviravolta na jurisprudência do Supremo, o preso rumina
a perspectiva de novas condenações. No vídeo,
Lula disse que aceitou cumprir o mandado de prisão para verificar o que queriam
o juiz Sergio Moro e procurador Deltan Dallagnol. Estava ansioso para “saber se
eles estão dispostos a discutir comigo e debater publicamente os processos,
porque quero provar que eles estão mentindo a meu respeito.”
Quer
dizer: o Lula da fita comportava-se como um Napoleão que cruzaria as fronteiras
de Curitiba por vontade própria, como se estivesse chegando a Moscou.
Decorridos 15 dias, o preso se parece mais com o general Bonaparte, que
retornou humilhado para Paris. Os russos curitibanos continuam no seu encalço.
Preparam duas novas sentenças. E Lula, com o prazo de validade já bem vencido,
não parece dispor de munição para “provar que eles estão mentindo.” Repita-se
a pergunta do primeiro parágrafo: O que é que o PT pretende oferecer? Manter um
candidato ficha-suja no jogo e registrar sua candidatura natimorta no Tribunal
Superior Eleitoral em 15 de agosto pode representar muita coisa —uma prova de
lealdade ou um gesto de desespero, por exemplo—, mas não é uma solução.
Blog do Josias de Souza