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sexta-feira, 23 de fevereiro de 2024

Lula usa sua falta de cultura para fazer o mal quando compara Israel a nazistas - O Estado de S. Paulo

J. R. Guzzo

Presidente petista não faz política externa voltada aos interesses do Brasil; só pensa em servir a seus propósitos pessoais

 

 

O presidente Lula é um grande especialista em utilizar sua própria falta de cultura, que ele insiste em manter intacta, para fazer o mal – é o que se chama de ignorância mal-intencionada. Acaba de dar mais um espetáculo do gênero numa conferência de chefes de Estado na África.

Como se entendesse alguma coisa de história – ele, que já foi capaz de dizer em detalhes que Napoleão esteve na China – revelou ao mundo que nunca houve “um momento histórico” como o da operação militar de Israel em Gaza. 

 O presidente Luiz Inácio Lula da Silva comparou ação militar de Israel na Palestina ao Holocausto de judeus na Alemanha nazista

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva comparou ação militar de Israel na Palestina ao Holocausto de judeus na Alemanha nazista Foto: EVARISTO SA / AFP

É uma estupidez em estado bruto, mas Lula aproveitou, como é seu hábito, para enfiar um propósito maligno na asneira que estava falando. “Só Hitler”, segundo ele, fez coisa parecida, “com os judeus”. Igualar os crimes incomparáveis do Holocausto nazista com a reação armada de Israel ao ataque terrorista que sofreu cinco meses atrás é dizer que o carrasco e as vítimas têm culpa igual – uma falsidade 100% desonesta, que atiça o antissemitismo e cobre de infâmia o nome do Brasil no mundo.

“Ao dizer que a guerra de Israel contra os terroristas do Hamas se assemelha ao Holocausto, Lula, a um só tempo, vandalizou a história, a memória das vítimas da indústria da morte nazista e os interesses do Brasil”, disse O Estado de S. Paulo em editorial que define com precisão as dimensões do desastre causado pelo presidente – o pior, sem dúvida, de todos os que vem acumulando no campo diplomático em seu primeiro ano de governo.

Lula, na verdade, não faz uma política externa destinada a defender os interesses do Brasil. Só pensa, desde que chegou ao cargo, em servir a seus propósitos pessoais – uma coleção deformada de recalques, rancores, ideias mortas e um ódio incurável à liberdade econômica, aos Estados Unidos e às democracias ocidentais. No conflito atual, desde o primeiro minuto, tomou de maneira quase-oficial o partido do terrorismo contra Israel. Não pediu licença, nem conselho, a ninguém para fazer o que está fazendo. Apenas impôs a sua posição pessoal como posição do Brasil, e não tem o direito de fazer isso. O presidente da República é o responsável pela execução da política externa, sem dúvida. Mas ele é mais responsável ainda perante o povo brasileiro.

Desde quando o Brasil acha, como Lula, que a Rússia tem direito de invadir a Ucrânia – ou que Venezuela, Cuba e Nicarágua são democracias? Quem o autorizou a colocar o Brasil a favor de um candidato na eleição da Argentina – que perdeu, aliás? 
Como fica chorando o tempo todo com a “falta de recursos” e doa bilhões de dinheiro público às ditaduras caloteiras que batem palmas para ele?

No caso do atual conflito entre Israel e o Hamas sua arrogância em confundir aquilo que quer com aquilo que o Brasil precisa é mais agressiva ainda. Ele quer que o povo brasileiro considere como vítimas de “genocídio” os que pregam abertamente o genocídio contra os judeus de Israel. Usa as mortes de civis em Gaza, resultado direto do assassinato de 1.200 israelenses inocentes por parte do Hamas, para promover a sua política pró terrorismo, disfarçada de “pró Palestina”. Diz que está “contra Israel, não contra os judeus” – o que diria, então, sobre quem viesse a declarar, por exemplo, que quer destruir “o Brasil”, mas não “os brasileiros”? É o pior momento na calamidade histórica da sua política externa.

J.R. Guzzo - Opinião - O Estado de S. Paulo

quinta-feira, 22 de junho de 2023

Início do fim - Luiz Philippe de Orleans e Bragança

Vozes - Gazeta do Povo

 
Ruínas da antiga civilização grega, em Atenas.| Foto: Martin Cigler/Wikimedia Commons

Há diversas maneiras de contar a história. Uns seguem o caminho da sequência de fatos, outros, das narrativas anacrônicas de conflito de classes, e um terceiro grupo prefere as teorias de ciclos
Este último grupo, menos conhecido, é dos mais antigos. 
Desde Platão, vários autores descrevem a história das civilizações analisando ciclos. O desafio é explicar como eles se repetem para que sejam considerados como tal, e não mera suposição.

A despeito do tempo de vida de cada observador, curto demais para o acompanhar o longo período de um ciclo, Oswald Spengler, em seu livro "O Declínio do Ocidente", de 1918, conseguiu prever, ao analisar ciclos históricos de longuíssimo prazo, situações políticas que acontecem nos tempos atuais. Igualmente, meu livro, “Por que o Brasil é um país atrasado?", no capítulo “Sucessão de Oligarquias”, menciona o Kyklos de Platão, que foi aprimorado por Políbio, e um ciclo menor, brasileiro, que se formou durante as tentativas de se estabelecer repúblicas ao longo do século 20, e que só resultaram na alternância de poder entre governos populistas e oligárquicos.

Há um padrão que se repete no início e no final das cinco grandes etapas históricas nos últimos 2.500 anos e pode servir de prelúdio para nosso futuro. Entendê-lo é relevante para compreender o momento atual e o caminho a tomar.  Em síntese, o início de cada ciclo é virtuoso e o fim, repleto de vícios:

Primeiro Ciclo: O início do primeiro ciclo é caracterizado pela formação da cultura grega no Peloponeso e da cultura etrusca na península itálica por volta do século 10 a.C. Foram criadas as primeiras cidades-estado e também surgiram os primeiros reis e tiranos. O final dessa etapa ocorre 400 anos depois, no século 6 a.C, tanto em Atenas quanto na península itálica.  
Os atenienses se revoltaram contra a tirania de Iságoras, um magistrado corrupto e imoral, que servia mais aos Espartanos que aos Atenienses, e instauraram a democracia. 
Em Roma, os fazendeiros se levantam contra os monarcas etruscos que, hedonistas e entorpecidos por sua superioridade cultural, abusavam de seu poder.  Os fazendeiros romanos revoltosos de então criam uma república.
 
Segundo Ciclo: A República Romana, formada inicialmente por fazendeiros que, contrários a qualquer concentração de poder, formaram um senado de patrícios com dois cônsules eleitos anualmente. O sistema era firmemente calcado em valores marciais, sendo que quase todos os senadores haviam lutado nas batalhas contra os reis etruscos. A República Romana cresceu e incorporou Atenas e demais cidades do Peloponeso, além de vastos territórios na península itálica e Europa. Entretanto, 400 anos depois, o senado já não era mais o mesmo. 
Os patrícios se tornaram a minoria e a maioria era de senadores corruptos e distantes dos valores que formaram a república. Os senadores negavam pagamento aos exércitos e não se importavam com o bem comum; usando seu status e poder em benefício próprio.  Levantes populares e tentativas de golpe se tornaram constantes e a república se tornou oclocracia (governo de facções).

    Em síntese, o início de cada ciclo é virtuoso e o fim, repleto de vícios

Terceiro Ciclo: Eis que em 27 a.C surge um líder para restabelecer os valores da República Romana: Otaviano. Ele se transforma no Primeiro Imperador Romano por aclamação das diversas facções. Por ironia, ele era um “imperador republicano”, que não se considerava imperador, mas sim o primeiro cidadão ou “princeps” – incutindo este título como valor primordial do Império Romano.  Ele inicia um ciclo virtuoso restabelecendo a estabilidade, a separação de poderes entre senado e imperador e a integridade das instituições. Adicionalmente, acabou com o patrimonialismo, moralizou o senado, extirpou os agentes corruptores, iniciou grandes obras e campanhas militares unificando o império e estabelecendo diretrizes de conduta dentro do sistema imperial que perduraram por vários séculos.
Ao final desse ciclo, houve a ascensão do Cristianismo e seu efeito subversivo do modelo imperial romano. O status quo era calcado firmemente nos deuses romanos e rituais que unificavam e amarravam o sistema de confiança, historicamente reforçado em torno do senado, dos cônsules e dos imperadores romanos, da Pax Romana e da lei e civilização romana como um todo.  
Uma vez que o cristianismo substituiu os valores de base dos romanos no século 4 d.C., toda a organização romana entrou em colapso; enfraqueceu-se, corrompeu-se e dividiu-se. Os poderes institucionais passaram a apelar por líderes tirânicos; antíteses dos valores institucionalizados por Otaviano. Foi no período do “Dominato”, conceito oposto ao de “Princeps”,  que se caracterizou a tirania do imperador Diocleciano, o último imperador que precedeu a divisão do império, a perseguição aos cristãos e a invasão dos bárbaros germânicos, causando o fim do Império Romano Ocidental.
 
Quarto Ciclo: Do declínio do terceiro ciclo emerge uma onda criadora, uma nova primavera civilizacional: a dos reinos cristãos. Era o século 5 d.C, início da Idade Média. Nessa era que durou mais de mil anos surgem os mitos e valores cristãos, os reis, seus títulos e territórios abençoados pela Igreja, a expansão da cristandade e das grandes conquistas de territórios além-mar e o nascimento dos Impérios. Em contrapartida, ao final desse ciclo, novos valores foram introduzidos por meio da burguesia e de levantes populares. 
A revolução Gloriosa, na Inglaterra, no século 17 e as revoluções norte-americana e francesa no século 18 vieram para materializar ideias nascidas nos séculos anteriores, antagônicas àquelas formadoras das monarquias tradicionais: a representação por voto popular, e não por unção divina ou por herança. Um governo estabelecido por leis escritas e aceitas, e não por costumes e tradições. A substituição da fé e das crenças por lógica e raciocínio.

É evidente que essas revoluções minaram os valores cristãos do antigo regime, entretanto, a decadência total do Reinos Cristãos foi protagonizada por Napoleão, um usurpador jacobino que tiranizou toda a Europa, invadiu reinados, aprisionou reis e coroou-se imperador usando os mesmos rituais cristãos reservados a famílias reais fundadoras. Napoleão falsificou sua legitimidade fazendo com que todas as instituições e sociedades europeias aceitassem seus títulos, e de seus familiares, como se sempre tivessem pertencidos a nobreza. Os reinados cristãos ocidentais que sobreviveram nunca mais foram os mesmos.

Quinto Ciclo: Nessa etapa, o modelo republicano surge legitimado por constituições, pela separação e limitação de poderes, pela proteção dos direitos dos cidadãos e pela representação democrática pelo voto. No cerne dos fundamentos da república surge a figura do cidadão; indivíduo livre, nato com direitos universais, que elege os melhores dentre seus pares para representá-lo. Nesse início virtuoso, observou-se a expansão da propriedade privada, das instituições públicas, do direito, do livre mercado e do comércio global.  Há a valorização da nação, do bem comum e da civilização com o despertar da cidadania.

Hoje estamos no final desse ciclo. 
Vemos a petrificação das sociedades pela burocracia, o surgimento de grandes metrópoles e sistemas tecnológicos de controle; baixa fertilidade, antagonismo entre a vida rural e a urbana, crises políticas e desconfiança da tecnologia e dos sistemas políticos. Cidadãos foram convertidos em massa consumidora. Representantes da sociedade se transformaram em tiranos. Mais uma vez, assim como Napoleão marcou o fim do antigo regime, o deboche está cada vez mais evidente marcando o final do 5º ciclo: a eleição de criminosos corruptos no comando absoluto de cidadãos.

O Brasil recentemente elegeu seu equivalente a Isagoras de Atenas, Diocleciano de Roma ou Napoleão da Europa. Isso marca o fim da nossa 7ª república.  Mas esse fato não é isolado, pois ocorre o mesmo em todo sistema político que compartilha da mesma história descrita acima: na América Latina, assim como na América do Norte e Europa, esse padrão se repete: um títere tirânico e corrupto é eleito para controlar os cidadãos e servir a interesses externos. Biden, Macron, Trudeau e vários líderes da atualidade validam esse padrão.

Estamos no final desse 5º ciclo e início de um outro, mas qual será a nova etapa? Já vemos brotando algumas opções: de um lado, uma tirania tecnocrática, anônima, liderada por fantoches visíveis que controlam todas as sociedades através da tecnologia. Essa possibilidade já está em curso com diferentes graus de avanço em vários países.

Entretanto, há outro movimento que também cresce: a revolta da cidadania contra a tecnologia, contra os sistemas políticos, contra a supressão da família, da fé, da nação e das liberdades.  Essa antítese cresce à medida que a tirania tecnológica avança.  Como um teórico da conspiração certa vez afirmou, “à medida que nos aproximarmos da singularidade, do comando central absoluto, atingiremos também o ponto de maior resistência e antagonismo ao regime totalitário, o que pode engatilhar uma grande diáspora, um novo ‘big bang’ anti-totalitário, pela liberdade”.


De volta ao nosso Brasil, acreditarei mais nessa última possibilidade quando voltar a ver a mobilização do povo nas ruas e nas redes sociais, agindo contra a criação dos pilares da nova ditadura.  
Só uma sociedade organizada consegue derrubar a tirania e encurtar o período de decadência total, como pode ser verificado ao longo da história. Mas para que isso aconteça precisamos de mais cidadãos com consciência do momento em que vivemos.  
Henry Kissinger, em entrevista sobre como evitar ou encurtar as etapas negativas dos ciclos, disse:  “para reverter uma tendência é necessário mais que uma proclamação; é importante compreender qual é a tendência para que se consiga revertê-la.”  Eu sei o que está por vir se a sociedade não se organizar e voltar se mobilizar, e você?

Veja Também:

    Perdido na política externa

    Armadilha: 15 razões para rejeitar a reforma tributária do governo

    O “calabouço” do mal

Conteúdo editado por: Jônatas Dias Lima

Luiz Philippe Orleans e Bragança, deputado federal - coluna na Gazeta do Povo - VOZES

 

terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

Bolsonaro na Rússia e caminhoneiros contra o totalitarismo - VOZES

 Alexandre Garcia

Viagem à Rússia
O presidente Jair Bolsonaro está a caminho de Moscou, na Rússia, e se encontra nesta quarta-feira (16), com o presidente russo, Vladimir Putin. A Rússia está muito preocupada com a Ucrânia se juntar à Otan. A Rússia tem uma história, que precisa de uma proteção. Depois da invasão de Napoleão, há cerca de 200 anos, e depois da invasão de Hitler, que foi um arraso, o país criou aqueles "estados satélites" para ter uma espécie de proteção.
 Manifestantes em Bruxelas se queixam das restrições impostas pelo governo por causa da pandemia.| Foto: Olivier Hoslet/EFE

E depois que se desfez a União Soviética o comunismo não deu certo –, a Ucrânia ficou um país independente, já teve problemas. Ali é um lugar de petróleo e de gás, principalmente. Eles abastecem e aquecem a Europa no inverno, mas Bolsonaro diz que não quer se envolver porque quer se dar bem com os dois lados.

Ucrânia e Rússia são bons parceiros comerciais do Brasil, que depende muito de fertilizantes que vêm de lá e da Bielorússia, que está ali pertinho. O Brasil, por outro lado, quer vender mais carne e soja para eles. Vai ser um encontro importante.

Garimpo, tudo legalizado
Foi publicado no Diário Oficial da União e entra em vigor, nesta terça-feira (15), um programa de estímulo ao garimpo. O Programa de Apoio ao Desenvolvimento da Mineração Artesanal e em Pequena Escala (Pró-Mape) diferencia a atividade artesanal das grandes mineradoras que atuam em escala industrial, operando inclusive na Amazônia, com tudo legalizado.

O garimpo foi considerado uma atividade legal. Foi graças ao garimpo – e ao pé do boi – que o Brasil se expandiu e se tornou um país de 8 milhões e meio de quilômetros quadrados, graças a esses aventureiros. Em geral, são nordestinos que estão lá em busca do sonho, em busca da fortuna, descobrindo a riqueza mineral. Só que se não é legalizado, sai no contrabando, não paga imposto.

Além de legalizar o garimpo, o decreto também controla o meio ambiente, dá licença para a área e, sobretudo, dá apoio em saúde e educação para as famílias dos garimpeiros.

As liberdades prevalecerão
Enquanto isso, no mundo inteiro, o exemplo dos caminhoneiros do Canadá está se expandindo. Chegou agora a Israel. Os caminhoneiros estão cercando Tel Aviv. Na Bélgica, estão cercando a sede da União Europeia. Nos Estados Unidos, pretendem chegar a Washington, assim como na Nova Zelândia, na Austrália, na França, na Itália também há movimentos contra o totalitarismo que está sendo aplicado.

O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, disse, outro dia, que de repente surgiram homofóbicos, misóginos, racistas. Esqueceu de dizer que surgiram mesmo foram os totalitários.

Felizmente, há reações. Um desembargador do Tribunal Regional Federal do Rio de Janeiro derrubou a decisão que proibia uma aluna não vacinada de assistir as aulas presenciais no Colégio Pedro II. Estavam querendo impor o passaporte de vacina. Ainda há esperança. Assim como a Câmara de Vereadores de Uberlândia, que aprovou uma multa de 10 salários mínimos para quem impedir a entrada de não vacinados em qualquer lugar. As liberdades prevalecerão.

Alexandre Garcia, colunista - Gazeta do Povo - VOZES


domingo, 5 de dezembro de 2021

E O RADICAL SOU EU? - Adriano Marreiros

Todo bandido deveria conhecer uma cadeia antes de cometer crimes.

Todo juiz deveria visitar os hospitais e cemitérios onde estão as vítimas dos bandidos.

Toda prisão deveria ter, na entrada, uma galeria com fotos dos criminosos presos e a descrição dos crimes que eles cometeram.

 Um sistema de justiça criminal decente deveria proteger e beneficiar a vítima, não o criminoso."

 Roberto Motta

Outro desenho que era muito legal e que não passa mais (sem propaganda infantil acabou tudo...) era “O Fantástico Mundo de Bob”.  Podemos dizer que era algo que bem mostrava como uma criança via o mundo.  Em certo episódio praticamente todos os adultos disseram alguma vez a ele:  “se fulano se jogar da ponte você também vai se jogar?”.  Sim, nossa mãe também já nos disse isso, nossa avó, nosso tio...  Bob, no entanto, com sua lógica infantil que ainda não discernia o real da fantasia, e que não tinha a menor ideia de prioridade, respondia perguntando, sem entender a mensagem e cada vez mais exasperado: “mas que ponte?!!!”

Tenho visto muita gente se jogar infantilmente da ponte só porque outros o fizeram e eles também não têm a menor idéia de que ponte era essa.  Sequer conseguem vê-la na sua frente, apesar de estarem nela há muito tempo, como se fora o Piu-piu mencionado na crônica passada.  Bob não entendia a linguagem figurada:  essa turma não entende linguagem nenhuma, apenas desprezam argumentos fortes, repetem frases prontas e não pensam nas consequências.  Ainda mais que o papel aceita qualquer coisa e uma pena equilibrada sobre um papel pode resultar em  algo de dar pena, algo muito feio, uma imagem lamentável.  Algo que ajude a destruir o passado e condenar o futuro sem que o burocrata sem perspicácia sequer entenda o que fez.

Se não conseguem pensar por si próprios, se não conseguem perceber questões de causa e consequência,  deveriam perceber o equívoco ao notarem a alegria daqueles que devíamos combater ou dos que os defendem.  Toda vez que essa alegria é clara, é claro que vacilamos.  E eles sabem, como Napoleão, que não devem interferir quando nós estamos errando.  Quando estamos pulando da ponte, para imitar outros que já pularam e, com isso, estamos arremessando quem devemos defender.  Eles ficam  só acompanhando, batendo palmas, para depois colherem os frutos...

Ah, Adriano, você está sendo muito radical!”.  Estou?  Não vou te responder com nada novo... Já falei isso, em crônica que está no livro 2020 d.C. Esquerdistas Culposos e outras assombrações e,  e em vez ficar criando novidades, vou apenas repetir um trecho do que dissera naquele texto, parafraseando o Pessoa:

Nunca conheci quem tivesse sido radical

Todos que me cercam são moderados em tudo, isentos... isentões... modinhas[1]... “progressistas”...

E eu? Tantas vezes radical, tantas vezes fascista, tantas vezes ideológico...

Eu, tantas vezes tendencioso, parcial, miliciano digital

Que tenho espalhado “fake news” pelas redes mesmo quando digo verdades

Que tenho feito discursos de ódio apenas porque discordo de quem “eu não devia”...

Que tenho sofrido censura e calado

E que quando não tenho calado, tenho sido mais censurado ainda.

Eu que tenho sido cômico aos “garantistas” de plantão

Que tenho sentido o olhar blasé de bandidólatras e laxistas[2]

Eu que tenho me defendido com base nas liberdades da Constituição

E que quando a hora da mordaça chegou: as tenho tido negadas

Para fora da possibilidade da Constituição...

Eu que tenho sofrido a angústia da perda das coisas boas e belas do mundo

Verifico que quase não tenho pares nisto neste país.

Todo “progressista” que conheço, doloso ou culposo[3]

Nunca teve um ato radical, nunca assassinou reputações,

nunca atacou opositores, nunca criticou a imprensa,

nunca atacou argumentos com slogans e mantras,

nunca pregou intolerância com os conservadores,

nunca negou espaço a quem pensa diferente...

Nunca foram senão democratas nesta vida, grandes democratas...

Quem me dera ouvir uma voz franca que me confessasse não uma “firme” opinião, mas um duplipensar.

Que me dissesse uma palavra existente e não da novilíngua

Que assumisse uma usurpação e não uma interpretação...

Mas são todos, todos eles (com plural no masculino como manda a língua mãe do Fernando) todos democratas sem nódoa. 

Quem, neste país, confessaria sua vocação totalitária, oh, democratas, meus irmãos! 

Então só eu que sou odiento e radical nesta terra?

Poderão quebrar tudo, ameaçar idosos, avançar com violência sobre manifestantes pacíficos, execrar quem cumpre a Constituição, ofender quem aplica efetivamente a lei penal. Poderão  censurar, cancelar e até cometer crimes e abusos às vistas de todos, mas são “antifascistas”[4], são democratas: radicais?! Nunca!!!

Podem ter sido militantes em ambiente virtual, mas milicianos digitais: nunca!

Podem ter inventado um “novo” passado para alguém, mas divulgar “fake news” : nunca!

Podem ter escrachado e destruído reputações de opositores, mas discurso de ódio: nunca!

Podem ter apoiado isso tudo ou se omitido quando devia agir, mas partícipes: nunca!

Podem ter agido sem qualquer escrúpulo, mas radicais: nunca!

E eu, que tenho sido miliciano sem estar em nenhuma organização, eu que tenho dito fake News ao divulgar verdades e opiniões, eu que tenho feito discurso de ódio por dar opinião fundamentada e fazer crítica de fatos reais... Como poderei falar com esses meus iluminados superiores sem vacilar?

Eu que tenho sido radical, muito radical,

No sentido mais exagerado e infame do radicalismo!

Chega!  Estou farto de “progressistas” dolosos e culposos, de isentões e de modinhas!

Chamam conservadores de radicais e ideológicos quando o conservadorismo é justamente contra revoluções e contra ideologias[5].  Acusam-me do que eles fazem, xingam-me do que eles são.  E o radical sou eu?

Não conseguem enfrentar um bom argumento lógico, um argumento de realidade, um argumento de fatos, sem tentar distorcer, sem tentar desbordar, sem tentar ignorar e fingir que não foi dito, sem tentar tirar invenções ilógicas da cartola.  Precisam negar o debate para manter a hegemonia, precisam amedrontar todos os públicos por medo de serem desmascarados, precisam manter todos às cegas para implantar suas ideologias liberticidas. E o radical sou eu?

Precisam distorcer os diplomas legais, exercer poderes que não possuem e negar o poder àqueles de quem ele emana, mas o radical sou... EU?

Argh, estou farto de iluminados, estou farto do ódio “do bem”, estou farto do ativismo e do “garantismo” bandidólatra que despreza as vítimas e nos fez campeões de homicídios e outros crimes.

Argh, onde há democratas no Brasil?

 Continuemos procurando e buscando animá-los, porque já faz mais de um ano e nada melhorou...

O homem medíocre não acredita no que vê, mas no que aprende a dizer... (Olavo De Carvalho)

Na Tribuna Diária, publicado originalmente - Adriano Marreiros     

 

sexta-feira, 19 de março de 2021

Negacionistas são eles - Revista Oeste

Quem se nega a enxergar as bandalheiras de Lula tem sérias avarias na cabeça

Não existe a verdade de cada um. Há uma só: a verdade factual, que é o contrário da mentira. Não tenho compromisso com o erro: constatado o equívoco, trato de reconhecê-lo, peço desculpas ao leitor e sigo em frente, amparado na certeza de que nunca errei por má-fé. Depois de tantos anos lidando com notícias, aprendi a ver as coisas como as coisas são e a contar o caso como o caso foi. É falso que a história seja escrita pelos vencedores. A versão que difundem tem a duração da sua permanência no poder, porque os fatos não morrem. Frequentemente desmaiam. Às vezes, depois de submetidos a selvagens sessões de tortura, passam longos períodos em estado de coma. Mas acabam recuperando a saúde e acabam triunfando sobre falsidades inevitavelmente frágeis. Brigar com fatos é perda de tempo. É coisa para estrábicos por opção.

Suspendi o período de folga, fui para o hotel e, uma hora depois, enviei o comentário para a Jovem Pan. Num texto curto, incluí-me entre os brasileiros que votaram no risonho Dr. Jekill sem imaginar que havia o sombrio Mr. Hyde que acabara de aparecer. Surpreso com o linguajar de pátio de cadeia, afirmei que a forma era mais detestável que o conteúdo, embora o que Aécio e Joesley disseram recomendasse a retirada das crianças da sala. Encerrei o comentário com um lembrete sempre oportuno: para casos de polícia, o remédio é cadeia. Voltei às férias, comprei uma garrafa de vinho e, em silêncio, ergui um brinde aos seres humanos honestos. Parece mentira, mas são muitos.

Pouquíssimos — se é que existem — são os esquerdistas nativos dispostos a enxergar (e confessar que enxergaram) o que até um cadáver exumado pode ver nitidamente, e sem se dar ao trabalho de abrir os olhos. Como decifrar essa cegueira voluntária e irredutível? 
O que leva alguém a venerar um corrupto duas vezes condenado em duas instâncias? 
Como explicar o sumiço da autonomia intelectual em cérebros onde já houve vida inteligente? 
O fato é que os devotos da seita veem as coisas pelo avesso. Os reais negacionistas são os que negam que o chefão tenha cometido um único e escasso pecado venial. 
Negaram a existência do Mensalão, negam o Petrolão e negarão os escândalos ainda por devassar. 
Negam as bandalheiras do PT. 
Negam-se a contemplar o Himalaia de provas e evidências que instalou na cadeia o alto comando da quadrilha. 
Negam-se a reconhecer que, se Getúlio Vargas saiu da vida para entrar na História, Lula perdeu o rumo da História e caiu na vida. Numa vida bandida.

Eles qualificam de fascistas todos os que discordam do Evangelho segundo Lula

A cabeça avariada dos negacionistas produz imbecilidades que deixariam constrangido o cretino fundamental de Nelson Rodrigues. A tribo jura que há uma democracia em Cuba, recita que Nicolás Maduro transformaria a Venezuela numa potência mundial se os norte-americanos deixassem e ouve em silêncio de catedral Lula avisando que Napoleão invadiu a China. Os discípulos do mestre que não lê nem sabe escrever acreditam que Sergio Moro descobriu em 2015 que Jair Bolsonaro se elegeria presidente em 2018 e, para impedir que o maior presidente da História voltasse ao poder, juntou numa aliança de proporções siderais delegados da Polícia Federal, procuradores federais, desembargadores do Tribunal Regional Federal, ministros do Supremo, diretores da Petrobras nomeados por Lula e envenenados pela ingratidão, empreiteiros beneficiados por Lula também envenenados pela ingratidão, uma frente multipartidária de políticos dispostos a delatar inverdades, espiões treinados pela CIA e agentes do FBI fluentes em português, fora o resto.

Os pajés ensinam que Lula acabou com a pobreza em 2010 e Dilma erradicou a miséria em 2014, e que a multidão de andrajosos que seguem acampados nas ruas, praças e avenidas do país são brasileiros que subiram para a classe média durante os governos do PT e foram devolvidos às divisões inferiores por Michel Temer e Jair Bolsonaro. A esquerda negacionista também nega que seja orientada por uma cabeça baldia. Aprenderam com a filósofa Marilena Chauí que, “quando Lula fala, o mundo se ilumina”. E descobriram, graças ao professor Antonio Candido, que a fobia por bancos escolares não impediu que o gênio da raça aperfeiçoasse uma intuição mais aguda que a de Pelé invadindo a grande área inimiga. Está garantida a vaga na sala principal de um Museu dos Estadistas ainda à espera da fundação.

Eles acordam declarando amor à democracia e dormem declamando poemas que exaltam a liberdade. 
Mas negam o convívio dos contrários, não admitem opiniões divergentes e qualificam de fascistas todos os que discordam do Evangelho segundo Lula. 
Acham que o país é presidido por um genocida decidido a exterminar todos os brasileiros, inclusive os que o elegeram. 
Estão convencidos de que Bolsonaro não acredita na existência de pandemias.
 E que é por culpa dele que sobram mortos e faltam vacinas, que há mais doentes do que leitos de UTI, que o vírus chinês resolveu acampar no Brasil até morrer de velhice. Quem discorda dessas certezas é fascista, sonha com a ditadura e é negacionista.

Negacionista é marmanjo que se nega a pensar com independência, é ovelha que acompanha o sinuelo na trilha que conduz ao despenhadeiro. Para uma figura assim, aliás, negacionista talvez seja pouco. Eis aí uma perfeita besta quadrada.

Augusto Nunes, colunista - Revista Oeste

 

terça-feira, 8 de dezembro de 2020

Regresso em marcha forçada - Nas Entrelinhas

Luiz Carlos Azedo - Correio Braziliense

O desmonte das políticas públicas voltadas para os direitos humanos está em pleno curso, mas é uma contradição com as necessidades imediatas dos brasileiros

Na sua primeira e única visita ao Jardim Botânico, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles — o homem que conduz as boiadas do desmatamento, das queimadas e das demais agressões ao meio ambiente — anunciou a intenção de transformar o Museu do Meio Ambiente, no Jardim Botânico do Rio de Janeiro, num hotel-boutique, espécie de pousada de alto luxo, acessível apenas aos mais privilegiados. O cara tem uma mentalidade mais atrasada do que a do D. João VI, o rei português que fugiu de Napoleão Bonaparte para o Brasil e mandou criar a instituição, nos idos de 1808, ou seja, mais de 212 anos atrás, com objetivo de aclimatar e cultivar especiarias e árvores exóticas, entre as quais, palmeiras imperiais, nogueiras, mangueiras, jaqueiras e cravos-da-Índia, que vieram do Oriente, das Ilhas Maurício a Macau.

Mal sabe o ministro: os cariocas têm apego àquele espaço privilegiado nas bordas da Lagoa Rodrigo de Freitas e ao pé da Serra do Mar, polo irradiador da cultura ecológica de suas crianças e adolescentes, parte integrante da memória afetiva da cidade; e da importância científica de suas pesquisas e do seu acervo, que preserva 7,5 mil espécies em pé, um herbário com 600 mil amostras e a maior biblioteca de botânica do país, com 32 mil volumes. Como a arrogância de Ricardo Salles não tem limites, ficamos imaginando: até onde vai essa sanha regressista em marcha forçada? O governo Bolsonaro se comporta como se estivesse no antigo regime militar (1964-1985) e não tivesse que dar satisfações a ninguém.

A propósito, a postura de Salles não difere muito da adotada pelo ministro da Saúde, o general da ativa Eduardo Pazuello, que não presta contas à comunidade científica nem à sociedade, e cumpre as ordens do presidente da República sem pestanejar. Vamos ver o que vai acontecer em 25 de janeiro, quando o governo de São Paulo, segundo anunciou o governador João Doria (PSDB), pretende iniciar a vacinação em massa da população residente e de quem mais estiver por lá. A vacina ainda depende da aprovação da Anvisa, que hoje está sob absoluto controle de militares negacionistas como Bolsonaro, mas há controvérsias, porque a legislação é ambígua. Diz que as autoridades, no âmbito de sua competência, podem importar e distribuir medicamentos e outros materiais, equipamentos e insumos sem registro na Anvisa, desde que autorizados pela FDA, EMA ou entidade similar — a legislação nomeia – do Japão e da China. [curiosidade: quando é para atrapalhar o governo Bolsonaro,  a Anvisa pode tudo na área de fiscalização e registro de medicamentos - conduta normal e que tem como parâmetro o FDA.

Quando se trata de facilitar o caixeiro viajante da China (aliás sua atividade de adido comercial, oficioso, da República Popular da China, tem sido considerado normal;

fosse o presidente Bolsonaro o 'office-boy'  a serviço da China, já estariam pedindo seu impeachment. ) os poderes da Anvisa são cassados, sendo criada uma interpretação que permite que  agências japonesas e americanas interfiram em assuntos internos do Brasil = no caso, competência da Anvisa.]

Direitos humanos
Se ligarmos uma coisa com a outra, veremos que o regresso está em marcha forçada em toda linha, como na educação, por exemplo. Ontem mesmo, um manifesto de pediatras pedia que as crianças voltassem às aulas. A mesma coisa na área da segurança pública, onde a política do tipo compre uma arma e se defenda sozinho é narrativa dos violentos, e deixa a população à mercê de traficantes, milicianos e policiais despreparados. Temos um governo que não está nem aí para os direitos humanos, que remontam à Revolução Francesa, um mix de direito liberal, moral cristã e política humanista. Bolsonaro despreza esses valores, embora faça apologia da liberdade individual.
[outro assunto que surge sempre que uma interpretação feita via maldito politicamente correto, pode atrapalhar o governo Bolsonaro, é o clamor por direitos humanos.
Tudo que seja para criticar o governo é apresentado como violação dos direitos humanos.
Até os direitos dos manos tem prioridade sobre os direitos humanos dos humanos  direitos.
Exemplos:
- As escolas não voltam as aulas devido a excessiva pressão dos professores. Como bem diz o Augusto Nunes, enquanto não for descoberta uma vacina contra a vadiagem, as aulas não retornam.
- a Segurança Pública  não tem sido afetada pelo leve afrouxamento na posse e porte de armas.  As mortes continuam ocorrendo por ação dos bandidos. Tem áreas no Rio em que a polícia não pode entrar  - determinação do STF.
Os direitos humanos são invocados até para apoiar o aborto - esquecem que o mais fundamental dos direitos humanos é o 'direito à vida' e quanto mais indefeso for o ser humano cuja vida pretendem tirar via aborto (pela crueldade de uma mulher que chamam de mãe) mais tal vida deve ser defendida.
 
O Brasil tem direitos dos manos em demasia, direitos humanos dos humanos direitos sufocados e mal invocados e milhões de famintos - não lembram que a fome viola, mata, o segundo direito humano mais importante,  e essencial para manter o primeiro (A VIDA).
 
- Esqueçamos o museu que no Jardim Botânico, seja no Pão de Açúcar , em nada influirá no meio ambiente. 
- Esqueçamos a prioridade que querem dar às investigações sobre mortes de políticos - deixando a apuração do assassinato dos seres humanos não políticos em segundo, ou terceiro, ou mesmo no último plano. 
Vamos cuidar de combater a fome, a miséria, priorizando a educação, os empregos = um BRASIL melhor e om os direitos humanos mais básicos - vida, alimentação - atendidos.]

É falsa a ideia de que os direitos humanos perderam seu significado e limites com a globalização e a revolução digital. Direitos como atributos individuais, apenas, não podem combater a desigualdade, nem são sinônimos de justiça. Direitos humanos são prescrições: as pessoas não são livres e iguais, mas deveriam ser. O “direito à vida”, por exemplo, por si só, não responde as perguntas sobre o aborto. Nem às necessidades da sobrevivência, como alimento, abrigo ou cuidados de saúde. Na maioria dos casos, uma reivindicação de direitos humanos é o começo de um processo de desenvolvimento social e não o fim.

A Constituição brasileira de 1988 consagrou como direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados. Três emendas constitucionais, em 2000, 2010 e 2015, incluíram no artigo 6º da Carta Magna, os direitos à moradia, à alimentação e ao transporte. Sempre houve muitas críticas ao texto constitucional, mas essa é uma agenda que corresponde às necessidades do nosso desenvolvimento social. O desmonte das políticas públicas voltadas para esses objetivos está em pleno curso, mas é uma contradição com as necessidades mais prementes da grande maioria da população. De certa forma, a pandemia do novo coronavírus tornou isso mais evidente e desnudou o caráter regressivo da atuação do governo federal nessas áreas. Isso ficará mais evidente com o fim do auxílio emergencial, que mitigou os efeitos mais perversos desse desmonte.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo, jornalista - Correio Braziliense 


domingo, 14 de junho de 2020

A desastrada canetada militar do capitão - Elio Gaspari

Folha de S. Paulo - O Globo 

Pandemia ensina que sociedade não funciona direito com milhões de excluídos

Como colocou um general no Ministério da Saúde, presidente deveria escolher um médico para aconselhá-lo em assuntos militares

Tendo colocado um general no Ministério da Saúde, Jair Bolsonaro deveria escolher um médico para aconselhá-lo em assuntos militares. Fazendo isso, evitaria lambanças como a que produziu assinando um decreto que permitia ao Exército operar com aeronaves de asa fixa. Assinou o decreto no dia 2 e revogou-o uma semana depois. No escurinho de Brasília e na confusão da pandemia, passava-se uma boiada que criaria a aviação do Exército.

A incorporação de aeronaves às forças de terra e de mar é uma velha encrenca doutrinária. Caxias usou balões fixos na Guerra do Paraguai, antes do voo do primeiro avião. O Exército teve uma aviação, e seu patrono é o tenente Ricardo Kirk , que em 1915 morreu ao cair em Caçador (SC), combatendo os revoltosos do Contestado.

A Força Aérea não gosta da ideia de aviões com a Marinha ou com o Exército. Em 1964  o marechal Castelo Branco teve que descascar o abacaxi da aviação embarcada que tripularia o navio aeródromo Minas Gerais. Nessa crise, um capitão da FAB metralhou o rotor de um helicóptero da Marinha que pousou na base gaúcha de Tramandaí. Esse foi o único incidente em que os desentendimentos militares ocorridos durante a ditadura tiveram tiros. Em todos os outros as questões foram resolvidas por telefone. O presidente Castelo Branco viu no episódio “um deplorável estado de espírito” de “vários elementos da Marinha e da FAB”. Em poucos meses caíram dois ministros da Aeronáutica e um ministro da Marinha.

Finada a ditadura, durante o comando do general Leônidas Pires Gonçalves, sem quaisquer atritos, o Exército organizou uma força de helicópteros que vai muito bem, obrigado. Iam assim as coisas até que alguém teve a ideia do decreto que daria aviões à tropa terrestre. Como era previsível, a FAB incomodou-se e certamente a Marinha também não gostou. Se uma iniciativa desse tamanho tivesse sido tomada com algum debate público, cada lado teria bons argumentos. Depois da canetada, o melhor caminho foi pegar a Bic para revogá-la.

Bolsonaro fala em “minhas Forças Armadas”. Elas não são suas, mas o capitão precisa saber o que fazer com elas. Vá lá que batalhe pela cloroquina, que ouvisse seu ministro da Educassão e tentasse passar a boiada das nomeações de reitores. A ideia de equipar a aviação do Exército é velha. Tratar essa questão com uma canetada foi um despropósito, tanto assim que nunca havia sido tentado. Se Bolsonaro tivesse consultado um médico antes de assinar o decreto, certamente teria sido dissuadido.

Estupidez e sabedoria
Está em curso um momento de cretinismo das massas inebriadas pela paixão política. Nos Estados Unidos. decapitaram uma estátua de Cristóvão Colombo. Na Inglaterra, jogaram num rio o bronze de um comerciante de escravos do século XIX. Estupidez nada tem a ver com manifestação política, é apenas estupidez.  Racistas vandalizaram estátuas de Martin Luther King e, em 1871, a Comuna de Paris derrubou a coluna da Praça Vendôme que celebrava a vitória de Napoleão na batalha de Austerlitz. (Felizmente ela foi reconstruída).

Dói ver a polícia protegendo a magnífica estátua de Winston Churchill em Londres e em Praga, em cujos pedestais picharam que ele era racista. Era, mas ajudou salvar a civilização ocidental quando parecia que o nazifascismo dominaria o mundo. O traficante de escravos não deveria ser homenageado e sua estátua não deveria ter sido jogada no rio. Não era preciso. Os russos ensinaram ao mundo como lidar com esse problema. Depois do colapso da União Soviética, as estátuas dos dirigentes comunistas foram retiradas de seus pedestais e colocadas num parque. (Um dos bons negócios do início do século foi comprar a preço de banana quadros de alguns pintores do realismo socialista soviético.)

Na Cidade do México, há uma estátua do rei espanhol Carlos IV e, no seu pedestal, uma placa informa que ela está ali pelo seu valor artístico. Fizeram melhor os brasileiros. Dona Maria I, rainha de Portugal, mandou enforcar o alferes Joaquim José da Silva Xavier. Seu neto homenageou o pai (D. Pedro I) com uma linda estátua equestre na praça da Constituição. Veio a República e a Casa dos Bragança foi desterrada, mas a estátua de D. Pedro ficou lá, na praça à qual foi dado um novo nome, o de Tiradentes.

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Os Invisíveis

A última reunião do Ministério podia ser transmitida para casas de família. Nela, o ministro Paulo Guedes revelou que a pandemia ensinou muitas coisas ao governo e disse o seguinte: “Aprendemos durante toda essa crise que havia 38 milhões de brasileiros invisíveis e que também merecem ser incluídos no mercado de trabalho.”

Ninguém aprendeu que existiam milhões de brasileiros sem proteção. Todo mundo sabia disso, inclusive Paulo Guedes. O que a epidemia poderá ensinar é que esse tipo de sociedade não funciona direito. A nova moda é fingir que esse problema foi revelado pela pandemia. Passada a crise sanitária, vai-se fingir que ele também se foi. Quando isso acontecer, o capitão poderá repetir: “E daí?”

PT assustado
O PT começa a acordar para um pesadelo: terminada a eleição municipal, estará fora do segundo turno no Rio e em São Paulo.

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MATÉRIA COMPLETA Folha de S. Paulo  - O Globo - Coluna Elio Gaspari


quinta-feira, 7 de maio de 2020

Onde mora o perigo - Nas entrelinhas


“Ramagem voltou à direção da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) com superpoderes, depois de indicar seu braço direito para o comando da PF

A movimentação do Palácio do Planalto tem dois objetivos: a curto prazo, impedir qualquer possibilidade de instalação de um processo de impeachment e afastamento do presidente Jair Bolsonaro por crime de responsabilidade; a médio, eleger ao comando da Câmara um aliado que possa ser pautado por Bolsonaro, o que não acontece hoje. A longo prazo, ninguém sabe. Entretanto, olhando ao redor, uma maioria fisiológica no Congresso é a via mais segura para a ampliação dos poderes de um presidente da República. Essa receita foi adotada com êxito em países como o Peru de Fujimori e a Venezuela de Chávez, a Rússia de Putin e a Hungria de Viktor Orban.


Uma parte da oposição considera o governo Bolsonaro protofascista. Discordo do conceito por dois motivos: primeiro, porque vivemos numa ordem democrática; segundo, porque a fascistização do governo não é inexorável. Toda vez que o presidente da República faz um gesto autoritário, tipo mandar um jornalista calar a boca, ou prestigia uma manifestação a favor de uma intervenção militar, porém, a narrativa do protofascista ganha novos argumentos: “E agora, você ainda acha que não estamos caminhando para o fascismo?”, questiona um velho amigo jornalista. Diante das circunstâncias, no entanto, vejo que é melhor explicar minha avaliação.

Estou entre os que veem no governo Bolsonaro um viés bonapartista, porque se coloca acima da sociedade e busca se apoiar nas Forças Armadas, com respaldo político-ideológico de pequenos proprietários, empreendedores e corporações ligadas aos setores de transportes e segurança pública, além dos truculentos e embrutecidos de um modo geral. Mais ou menos como Luís Bonaparte, o sobrinho de Napoleão I. A diferença é que, no bonapartismo, o parlamento foi completamente subjugado pelo estamento burocrático-militar, o que não é o nosso caso, embora tenhamos um governo no qual generais da reserva e da ativa estão dando as cartas. A lógica desse processo é o aparelho burocrático-militar avançar em relação aos demais poderes, em aparente neutralidade arbitral. Na França de 1851, o golpe de estado de 2 de dezembro pôs fim ao regime parlamentar.

Aqui no Brasil, diante da maior crise sanitária que o país enfrenta, desde a epidemia de febre amarela de 1918, e de uma recessão que cavalga a pandemia, nossas instituições estão funcionando. O Congresso realiza sessões por videoconferências, em marcha batida para aprovar o chamado “Orçamento de Guerra”, que busca socorrer estados e municípios. O vai e vem da emenda constitucional sobre o assunto, entre a Câmara e o Senado, decorre da divisão do próprio governo, como ficou demonstrado ontem. Assessores do ministro da Economia, Paulo Guedes, atuavam nos bastidores para garantir a aprovação da proposta do Senado sem emendas; já o líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO), atuou para que houvesse modificações. Questionado, disse que agiu de mando, ou seja, recebeu orientação do Palácio do Planalto.

Ontem, Rodrigo Maia (DEM-RJ) recebeu a visita dos ministros Braga Netto (Casa Civil) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) na Presidência da Câmara. Os dois generais são os mandachuvas na Esplanada e comandam as articulações para formação de uma base parlamentar com os partidos do Centrão, na base do velho toma lá dá cá, ou seja, em troca de ocupação de cargos no governo. A operação atraiu o PTB, do ex-deputado Roberto Jefferson; o Partido Progressista, do senador Ciro Nogueira; o PL, do ex-deputado Valdemar Costa Neto, e o PSD, do ex-prefeito Gilberto Kassab, figuras carimbadas da chamada “velha política”. As conversas têm uma explicação: os presidentes do DEM, prefeito ACM Neto, de Salvador (BA); do MDB, deputado Baleia Rossi (SP); e do Solidariedade, Paulinho da Força (SP), não embarcaram nas articulações para transformar Maia num pato manco. O jeito foi retomar as conversas com o presidente da Câmara.

Arapongas
Neste momento, onde mora o perigo? Nas manobras de Bolsonaro para ter à sua disposição pessoal os órgãos de coerção do Estado. Por ora, a tentativa de utilizar a Polícia Federal como instrumento de poder fracassou. Essa intenção foi denunciada pelo ex-ministro da Justiça Sergio Moro. Isso resultou na suspensão da posse do delegado Alexandre Ramagem no cargo de diretor-geral da PF, por decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, e no inquérito aberto para investigar o caso, pelo ministro do STF Celso de Mello, a pedido do procurador-geral da República, Augusto Aras.

Entretanto, o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, general Augusto Heleno, delegou boa parte de suas atribuições a Alexandre Ramagem, que voltou à diretoria-geral da Agência Brasileira de Inteligência com superpoderes, depois de indicar seu braço direito, delegado Rolando de Souza, para o comando da PF. A agência tem por missão obter informações para o presidente da República, mas agora ganhou autonomia para contratar serviços sem licitação e financiar missões de servidores, militares, empregados públicos ou colaboradores eventuais da agência, obviamente, em segredo. Ou seja, Bolsonaro está organizando um exército de “arapongas”. É um péssimo sinal.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo, jornalista - Correio Braziliense





terça-feira, 22 de outubro de 2019

Como perder a guerra - Nas entrelinhas

“O PSL é belicoso e midiático, na primeira crise interna, o que se vê são gravações feitas sem autorização, ameaças de denúncias  e muito bate-boca entre seus deputados nas redes sociais”

 Usada à farta no Brasil para caracterizar uma atitude fadada ao fracasso, não existe uma explicação para a existência da expressão “Foi assim que Napoleão perdeu a guerra”, sobre a qual não há referências em alemão, francês, russo ou inglês. Alguns atribuem a expressão aos portugueses, uma espécie de vingança sarcástica devido à invasão de Portugal pelo exército francês e a consequente fuga de D. João VI e sua corte para o Brasil, em 1808.

As especulações vão da desastrosa retirada de Napoleão da Rússia, em 1812, depois da ocupação de Moscou, pois a cidade fora evacuada e, depois, incendiada (o exército russo evitou o confronto aberto e perseguiu as tropas francesas em pleno inverno, até Paris) a uma suposta crise de hemorroidas que o impedira de montar durante a Batalha de Waterloo, em 1815, quando foi definitivamente derrotado pelos ingleses.  O chiste lusitano é sob medida para a crise do PSL, cujo último lance foi a renúncia do líder da bancada na Câmara, deputado Delegado Waldir (GO), e sua substituição pelo deputado Eduardo Bolsonaro (SP), filho do presidente da República. Jair Bolsonaro se encontra no Japão, primeira etapa de sua viagem à Ásia, mas de lá monitora a operação que levou seu filho à liderança do PSL.

Apesar de ter a maior bancada governista da Câmara, com 53 deputados, o PSL nunca foi o partido hegemônico na Casa, embora seja muito estridente na tribuna e nos apartes, além de agitar as redes sociais. Agora, com essa divisão, corre o risco de ser tornar irrelevante, a não ser que haja um acordo interno que apazígue a disputa. Falta à bancada do PSL cultura parlamentar para o entendimento e a composição, num ambiente com ritos de convivência consolidados.

O modus operandi do partido é belicoso e midiático. Na primeira crise interna, o que se vê são a divulgação de gravações feitas sem autorização, ameaças de denúncias sobre os podres partidários e muito bate-boca pelas redes sociais, às vezes em linguagem completamente estranha à vida parlamentar, como a guerra de emojis entre a ex-líder do governo no Congresso Joice Hasselmann (PSL-SP) e o vereador carioca Carlos Bolsonaro (PSL), filho do presidente da República, que nem da bancada é.

Decantação
A reviravolta de ontem, quando Eduardo Bolsonaro conseguiu finalmente o número de indicações para se tornar o líder, não encerra a crise, apenas restabelece a lei da gravidade, pois seria um aborto da natureza o presidente da República ser derrotado na sua própria bancada, como aconteceu na sexta-feira. Entretanto, é um jogo de perde-perde: se 29 deputados apoiam o novo líder e 24 são contra ele, em certas circunstâncias, isso reduz o peso da bancada a cinco deputados, principalmente em questões interpares. Vamos supor, por exemplo, que a eleição para a presidência da Câmara fosse hoje.

A confusão na bancada do PSL faz parte de um processo de decantação, após o tsunami eleitoral que renovou a Câmara. Começa a separar os parlamentares eleitos para brilhar e que se destacam entre as principais lideranças daqueles que vão permanecer no baixo clero. Alguns serão deputados de um só mandato.A aposta do clã Bolsonaro é que os adversários internos não sobreviverão sem o apoio do presidente da República, porque chegaram ao Congresso na aba do seu chapéu. Além disso, ficarão a pão e água, conforme a narrativa usada para pressionar os rebeldes a apoiarem o novo líder. Tem lógica, mas muita água ainda vai rolar sob a ponte.

O primeiro ato de Eduardo Bolsonaro foi destituir os 12 vice-líderes da legenda, cargos importantes no funcionamento da Câmara, porque seus ocupantes substituem o líder nas comissões e no plenário, além de terem direito à partilha dos cargos da liderança. O líder é poderoso quanto ao funcionamento da Casa, pois indica os integrantes das comissões e relatores, comanda as negociações e intermedeia a ocupação de espaços e liberação de recursos nos ministérios.

Para o presidente Bolsonaro, controlar a liderança é uma forma de confrontar o poder da cúpula do partido, principalmente do presidente do PSL, deputado Luciano Bivar (PE), com quem entrou em rota de colisão por causa dos recursos dos fundos partidário e eleitoral, que somam mais de R$ 200 milhões. O papel de líder, principalmente nos grandes partidos, exige capacidade de diálogo e negociação. Esse não é o forte de Eduardo Bolsonaro, cujo perfil é mais agressivo. Pode ser que a estratégia de Bolsonaro pai seja mesmo essa, porque a agenda econômica do governo vai bem sem o PSL. O grande negociador das reformas é o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). O papel do filho seria fazer um contraponto e demarcar território.

Nas Entrelinhas - Luiz  Carlos Azedo  - Correio Braziliense


segunda-feira, 23 de setembro de 2019

A morte de Ágatha - O espírito do tempo doente de que governantes como Witzel são produto - Carlos Andreazza


O Globo 
Falo muito de espírito do tempo. Espírito do tempo é também a atmosfera cultivada a partir do discurso daqueles mais influentes entre nós. Um governante popular, por exemplo. Um presidente. Um governador. A palavra insistente de um líder popular contribui para dar materialidade ao espírito do tempo; para fixá-lo, para inscrevê-lo, naturalmente, em nós, em nossas falas e em nossos atos. Essa atmosfera tem impacto – concreto – entre nós. Sobre nós. Esse impacto pode resultar em sangue.  Quando um governante fala em licença para atirar, o que, na prática, equivale a licença para matar, não nos enganemos: esse governante faz um gesto de condescendência para o tiro sem consequências.


Quando um governante insiste em falar de excludente de ilicitude para policiais: esse governante afrouxa a pressão, a responsabilidade própria ao ato de puxar o gatilho. [é sempre efetuada uma, digamos, confusão - talvez proposital, talvez involuntária entre EXCLUDENTE DE ILICITUDE e licença para matar
EXCLUDENTE DE ILICITUDE é quando o policial atendendo uma série de requisitos legais, previamente estabelecidos, mata alguém em defesa própria ou de terceiros e após o competente e indispensável inquérito policial ser concluído e enviado ao Ministério Público e o MP entende que o policial atendeu todos os requisitos para ser alcançado pelo dispositivo em comento e assim não é condenado - se o juiz tiver o mesmo entendimento do MP, o policial sequer vai a julgamento - ou se condenado for, recebe pena inferior ao mínimo cabível.

NÃO OCORRE NENHUM FAVORECIMENTO ao policial -   lembramos que o dispositivo pode ser aplicado a qualquer cidadão e não apenas a um militar ou agente policial.]

Já a LICENÇA PARA MATAR não merece sequer comentários, já que o governador apenas usou linguagem de palanque,mas, não ordenou a prática - se o fizesse seria uma ordem manifestamente ilegal e seria bloqueada ainda nos escalões superiores da Polícia Militar ou Civil, Guarda Municipal.]

Ao assim proceder, o governante esvazia o papel do Estado, o papel de mediador, de zelador do convívio social, o conjunto de valores que define o Estado – proteger, antes e acima de tudo, os inocentes –, para colocar esse mesmo Estado no lugar imoral do criminoso, aquele que não está nem aí. O espírito do tempo corrente dissolve fronteiras, normaliza a barbárie.

Lamento, imensamente, sempre que um agente público de segurança é baleado, morre; mas isso, infelizmente, compõe a natureza do trabalho do policial. A menina Ágatha, porém, nada tinha com isso. Ela não integrava esse contrato. Foi vítima, mais uma, de um procedimento estúpido, obra de governantes como Wilson Witzel, que também – avançando sem inteligência, investindo no confronto para jogar pra galera – expõe a Polícia Militar ao descrédito e à desconfiança. Entrar numa favela, disparar a esmo, não raro matar inocentes, ter policiais mortos, sem tirar a favela do controle do crime: isso – esse enxugar de gelo – só multiplica a revolta, o ressentimento. Talvez sacie o desejo de alguns tarados, mas nada resolve para a sociedade. [curioso é que até o presente momento o que se tem é depoimentos de parentes da criança, que sequer tem uma visão do conjunto de acontecimentos e de terceiros e que sempre acusam a polícia - quem garante que algum traficante atirou na criança? se valendo do fato dos policiais estarem atirando contra bandidos que haviam iniciado uma agressão aos militares.

Ao atirarem em inocentes, especialmente crianças, os bandidos conseguem o efeito  de deixar a população contra a PM e assim desestimular, ou pelo menos reduzir, as operações policiais.
Quem garante a segurança de qualquer um dos moradores que acusam a polícia, se eles fizessem ainda que um simples comentário insinuando que os tiros haviam partido dos bandidos?

Absurdo é que ocorreu o tiroteio e o tribunal supremo dos que nem lá estavam já começam a condenar o policial e o governador, que em um momento não muito feliz sobre o ângulo do maldito 'politicamente correto' aprovou de forma efusiva a ação policial que matou um sequestrador - salvando a vida de vários réfens - e que em outra ocasião,usando linguagem de palanque 'deu permissão' aos policiais para matar bandidos.]

Vamos lembrar... Porque o espírito do tempo é feito de acúmulos, da repetição e da assimilação de mensagens. Na sexta-feira passada, antes dessa nova tragédia, a que matou Ágatha, comentando aquela desastrosa operação na Maré, em que a polícia atirou contra traficantes nas cercanias de escolas, o governador do Rio de Janeiro disse o seguinte:

“Quando a gente vê imagens das crianças deitadas nas escolas, a gente esquece que, durante a Segunda Guerra Mundial, se não fosse o inglês ir para baixo da terra, no bombardeio dos nazistas, e Winston Churchill ter enfrentado, com sangue suor e lágrimas, o nazismo, o que seria da humanidade hoje? O que seria do mundo, se Napoleão, Victor, tivessem vencido as batalhas? Porque hoje, guardadas as proporções, é o mesmo que acontece com o crime organizado. E nós vamos nos abater? Não. Nós vamos, hoje, fazer com que nossas crianças, elas se recuperem de todo esse trauma. Vamos ajudar as famílias. Porque amanhã essas crianças vão estar de pé em suas comunidades.”

Ágatha – a morte da menina Ágatha – é produto de uma mentalidade que compara a circunstância de um povo em guerra, em guerra contra um inimigo externo, à de crianças que se protegiam contra a ameaça de efeitos colaterais decorrentes da ação de seu próprio Estado. gatha, contudo, não teve a chance de se proteger nem terá, pois, a oportunidade de um trauma do qual se recuperar.

Carlos Andreazza - O Globo