Sergio
Moro declarou incontáveis vezes que não cogita inaugurar uma carreira política.
Também já afirmou que conquistar uma vaga no Supremo Tribunal Federal
"seria como ganhar na loteria". Entretanto, o ex-juiz da Lava Jato
vai ficando mais próximo das urnas de 2022 do que da poltrona de Celso de Mello,
primeiro assento a ser desocupado na Suprema Corte, em novembro de 2020, pelo
critério da aposentadoria compulsória aos 75 anos.
Pesquisa
Datafolha divulgada em abril revelou que Moro é o ministro mais bem avaliado da
Esplanada, com popularidade superior à de Jair Bolsonaro. Deve-se o fenômeno à
fusão de sua imagem com as cenas de prisão dos poderosos que a Lava Jato tornou
impotentes. Paradoxalmente, o prestígio político do ex-juiz tende a subir na
proporção direta da queda na avaliação técnica dos especialistas sobre sua
atuação como titular da 13ª Vara Federal de Curitiba.
[o acerto do ministro Moro se comprova pelo ódio que ele desperta nos corruptos, admiradores e parceiros; quanto mais ódio mais certo Moro está.
E o ódio está intenso. Tanto que alguns querem condenar Moro esquecendo que as 'conversas' foram obtidas mediante crime e que a autenticidade dos tais 'diálogos' ainda não foi provada.
Essa exigência de ser o acusado quem tem que apresentar provas é chata, atrapalha, mas é legal.]
Os métodos de Moro como magistrado foram à berlinda depois que as
mensagens que ele trocou com procuradores da Lava Jato saltaram da intimidade
do celular para a vitrine das manchetes. Ironicamente, o discurso de Moro vai
se tornando mais evasivo e, portanto, mais político à medida que se avolumam os
indícios de que, como magistrado, não hesitou em recorrer a meios heterodoxos
para alcançar o fim da impunidade. A retórica de Moro indica que o personagem começa
a aprender com o inimigo. Certas espertezas ele passa a enxergar como
sagacidade. Num primeiro momento, disse não ter identificado "qualquer
anormalidade" nas mensagens expostas. Na penúltima manifestação, preferiu
realçar a "necessidade de que o suposto material, obtido de maneira
criminosa, seja apresentado a autoridade independente para que sua integridade
seja certificada."
É como se Moro, às voltas com a síndrome do que ainda está por vir,
ensaiasse o discurso aguado que deve escoar dos seus lábios na próxima
quarta-feira, quando será inquirido na Comissão de Constituição e Justiça do
Senado. Nesse ambiente, meios e fins costumam se dissociar. Os objetivos
finais, antes dominantes, ficam subordinados à tática. De repente, a tática
prevalece sobre todas as coisas. Quando menos se espera, os fins são
dissolvidos num melado de conveniências. A banda do Congresso que reúne os
culpados e os cúmplices se equipa para arrastar Moro e os procuradores de
Curitiba para uma CPI. A turma do 'mata-e-esfola' ainda não se deu conta. Mas
pode apressar o início da carreira política do ex-juiz. Nenhuma roupagem seria
mais eficaz para um presidenciável novato do que o figurino de vítima das
raposas do pedaço bandalho do petismo e dos seus ex-sócios do centrão, hoje
clientes de caderneta da Lava Jato.
Ao final
de uma semana em que demorou quatro dias para pronunciar meia dúzia de palavras
em defesa do seu ministro da Justiça, Jair Bolsonaro voltou a puxar o freio de
mão. Instado neste sábado a comentar a situação de Moro, o capitão combinou
palavras de apreço com um aviso: não existe confiança 100%. A valentia do
presidente costuma crescer nas fases de sumiço de Fabrício Queiroz, o faz-tudo
da família Bolsonaro. Mas a coragem talvez se revele uma qualidade escassa no
instante em que atual inquilino do Planalto perceber que, chutado do governo,
Moro pode se tornar o candidato favorito a estragar o projeto reeleitoral de um
presidente ingrato.