Em
novembro de 2011, o capitão do Bope (Batalhão de Operações Especiais) Adriano
Magalhães da Nóbrega comandava uma operação noturna com o objetivo de desmontar
um acampamento criado por traficantes em um trecho da Floresta da Tijuca
localizado entre as favelas da Rocinha e do Vidigal, na zona sul do Rio. Não
era fácil caminhar por aquelas matas. As trilhas foram criadas por ex-soldados
do Exército que possuem treinamento de sobrevivência em selva e acabaram
cooptados pelas facções criminosas.
"Passamos
horas caminhando em meio à mata quando vi o capitão Adriano surgir do nada. Ele
parecia um fantasma, todo de preto, com o rosto coberto por uma balaclava
[espécie de gorro que vai do topo da cabeça ao pescoço] e óculos de visão
noturna. Se quisesse teria nos tocaiado, sem dificuldade", afirmou ao UOL
um oficial da Polícia Militar do Rio de Janeiro que participou daquela
operação. Todos sabíamos de histórias do envolvimento dele com a contravenção.
No fundo, a gente tinha medo dele. O cara parecia um psicopata. Diziam que ele
gostava de matar com faca, mas nunca o vi matar ninguém.
Oficial
da Polícia Militar do Rio sobre Capitão Adriano
As declarações
revelam a mistura de admiração e temor que muitos policiais fluminenses
demonstram ainda hoje pelo "Capitão Adriano". Há três meses o
Ministério Público do Rio denunciou o ex-PM por comandar uma milícia na zona
oeste do Rio e o chamado "Escritório do Crime", grupo de matadores de
aluguel que tem como clientes preferenciais chefes do jogo do bicho carioca. Expulso
da PM Capitão Adriano entrou para a PM fluminense no ano de 1996. Quatro anos
depois, concluiu o curso de operações especiais do Bope. Na corporação, fez
amizade com Fabrício de Queiroz, que trabalhou como ex-assessor do senador
Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), quando este foi deputado estadual. Anos depois,
Queiroz indicou a mãe e a mulher de Capitão Adriano para trabalhar no gabinete
do filho mais velho do presidente da República, Jair Bolsonaro.
Adriano
chegou a ser homenageado por Flávio Bolsonaro com a Medalha Tiradentes, a mais
alta honraria da Assembleia Legislativa. Era o ano de 2005, e ele estava preso
sob acusação de cometer homicídio. Nessa mesma época, o ex-"caveira"
(membro do Bope) começou a atuar como segurança para familiares do falecido bicheiro
Valdomiro Paes Garcia, o Maninho. No serviço irregular, que resultou em sua
expulsão da PM decidfida pela Justiça do Rio no ano de 2014, ele se envolveu na
disputa fratricida pelo espólio do contraventor.
De acordo com testemunhos incluídos nos autos da investigação interna
conduzida pela PM do Rio, obtidos pelo UOL, Capitão Adriano participou de ao
menos oito homicídios entre os anos de 2006 e 2009, a mando do contraventor
José Luiz de Barros Lopes. Conhecido como Zé Personal, ele era casado com uma
filha de Maninho.
"Em geral, as vítimas desses assassinos têm alguma relação
com o crime e a Polícia faz vista grossa. Adriano não é o primeiro a prestar
esse tipo de serviço. Outros policiais já fizeram o mesmo e praticamente todos
tiveram o mesmo fim: a morte", afirmou um delegado da Polícia Civil do
Rio, que pediu para não ser identificado.
Um bom matador é sempre útil. E Adriano é um dos melhores, talvez o
melhor atualmente.
Delegado de Polícia Civil do Rio a respeito de Capitão Adriano
A ficha de serviços mostra que Capitão Adriano recebeu treinamento de
elite durante sua trajetória como PM. Entre os cursos em que se formou, estão
os de sniper (atirador de elite), operações táticas especiais e segurança
especial para autoridades.
Aficionado
por armas e horas na "deep web" Os relatos ouvidos pela reportagem e
documentos de seu processo de expulsão da PM classificam Capitão Adriano como
"caçador de gente". Ele pode passar dias isolado em meio à Floresta
da Tijuca ou, em busca de aprimoramento, horas em chats na chamada "deep
web" (sites que não estejam indexado em mecanismos de buscas). É descrito
como um aficionado por armas, equipamentos tecnológicos, treinamentos militares
e jogos com simulações de combates.
"Os equipamentos dele eram pessoais, ele sempre aparecia com alguma
novidade tecnológica. Foi com ele que vi pela primeira vez um bloqueador de
sinal, hoje chamado de misturador, que impede o funcionamento de celulares ou
GPS. Ele tinha comprado num site na internet", diz o oficial da PM. Mesmo
um assassino altamente capacitado pode errar, como revelou às autoridades o
pecuarista Rogério Mesquita, homem de confiança de Maninho e também envolvido
na disputa pelo espólio do bicheiro. No começo de 2007, Zé Personal havia
decidido matar Guaracy Paes Falcão, o Guará. Vice-presidente da escola de samba
Salgueiro e primo de Maninho, Guará era visto como um rival pelo controle de pontos
jogos da organização criminosa. Ele incumbiu o Capitão Adriano de executar a
tarefa. Na primeira tentativa de matá-lo, o ex-caveira e seus comparsas
seguiram um carro semelhante ao de Guará, um Peugeot preto. Em certo trecho da
estrada Grajaú-Jacarepaguá, interceptaram e dispararam contra o veiculo. Só
então os assassinos perceberam que se equivocaram e um casal foi morto por
engano. O capitão havia "feito merda", como afirmou Zé Personal.
O segundo
atentado atingiu o "alvo certo". Na madrugada de 14 de fevereiro de
2007, Guará deixou a quadra da Salgueiro, na zona norte do Rio, em direção à
sua casa em Jacarepaguá, zona oeste do Rio. No banco de carona estava a sua
mulher, Simone Moujarkian, 35, destaque da escola de samba. A viagem foi
interrompida em frente à unidade do supermercado Guanabara, no bairro de
Andaraí, quando os assassinos interceptaram o carro. Os atiradores acertaram 15
tiros de fuzil no Peugeot. Três disparos acertaram Guará; outros dois, Simone.
Eles morreram no local.
Rogério Mesquita chegou a acusar Capitão Adriano de tentar assassiná-lo.
O ex-PM foi absolvido pela Justiça por falta de provas. Em 24 de janeiro de
2009, o pecuarista foi morto a tiros a cerca de cem metros da Praia de Ipanema.
Zé Personal teve o mesmo fim: em 17 de setembro de 2011, morreu quando
frequentava um centro espírita na Praça Seca, na zona oeste do Rio. Na cadeia,
homenageado: "dedicação e brilhantismo" O primeiro caso de homicídio
cometido pelo Capitão Adriano que veio a público foi registrado no ano de 2004.
Um flanelinha que havia denunciado um esquema de extorsão praticado por PMs foi
morto a tiros dentro de uma favela do Rio. Adriano chegou a ser condenado na primeira
instância, mas o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro anulou a sentença. Foi
durante esta época na cadeia que ele foi homenageado por Flávio Bolsonaro. De
acordo com o então deputado estadual, o PM merecia ter a honraria por, entre
outras razões, ter êxito ao prender 12 "marginais" no morro da Coroa,
no centro, além de apreender diversos armamentos e 90 trouxinhas de maconha.
Para Flavio, Adriano desenvolvia sua função com "dedicação, brilhantismo e
galhardia".
Sniper, caçador e
silencioso: o ex-Bope que comanda o Escritório do Crime ... - Veja mais
em
https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2019/04/29/capitao-adriano-milicia-ex-bope-escritorio-do-crime-rio-de-janeiro-rj.htm?cmpid=copiaecola
Sniper, caçador e
silencioso: o ex-Bope que comanda o Escritório do Crime ... - Veja mais
em
https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2019/04/29/capitao-adriano-milicia-ex-bope-escritorio-do-crime-rio-de-janeiro-rj.htm?cmpid=copiaecola