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segunda-feira, 28 de maio de 2018

Operação aeroporto

O coronel Lima, amigo do presidente, recebeu 1 milhão de reais. Há um documento justificando o pagamento. VEJA teve acesso ao papel

O primeiro ato é conhecido. Em sua fracassada tentativa de fechar um acordo de delação, o empresário José Antunes Sobrinho, dono da Engevix, disse ter repassado 1 milhão de reais a Michel Temer, em 2014, em troca do apoio do então vice-presidente à aprovação de um aditivo contratual na obra da Usina de Angra 3. Aos procuradores, Antunes informou que pediu à Alúmi, empresa que andava interessada em parcerias comerciais com a Engevix, que contratasse uma empresa do coronel João Baptista Lima Filho, suspeito de ser laranja de Temer, como forma de lavar o dinheiro dado ao peemedebista.

O segundo ato também é público: a Alúmi, atendendo ao pedido de Antunes, contratou a PDA Projeto, de propriedade do coronel Lima, a fim de realizar um estudo técnico para a implantação de painéis publicitários. O tal estudo, de 196 páginas, foi devidamente entregue. A Alúmi pagou pelo trabalho e, por isso mesmo, alega que não houve propina, mas efetiva prestação de serviço.
 ENTREPOSTO - Lima: suspeito de simular serviço para ocultar propina (Jefferson Coppola/VEJA)

Aqui começa o terceiro ato até então inédito. A peça de 196 páginas produzida pela empresa do coronel Lima, à qual VEJA teve acesso, é um estudo de fancaria, destinado apenas a dar ares de legalidade ao que não passa de uma tramóia: o pagamento de propina em troca de vantagem indevida. VEJA submeteu o estudo à análise de especialistas de diferentes áreas. Eles foram unânimes em dizer que o valor pago à empresa do coronel Lima — 1 milhão de reais — está inteiramente fora da realidade de mercado.

Segundo o engenheiro civil Pedro Wellington Gonçalves do Nascimento Teixeira, professor da Universidade de São Paulo (USP), o estudo valeria no máximo 180 000 reais — isso superavaliando variáveis de custo, como transporte de profissionais de um estado a outro e pagamento de honorários diferenciados. “Trata-se de um trabalho de engenharia estrutural, de complexidade mediana, que tem metodologia usual”, diz ele. Para Teixeira, o projeto, além de superfaturado, é incompleto: “Não foi feita a sondagem do terreno, a única forma de definir com precisão a fundação”.

O arquiteto Sergio Leal Ferreira, também professor da USP, garante que o estudo nem tem relação com a área da arquitetura. “É um trabalho de engenharia, um projeto relativamente padronizado. Não tenho nenhuma dúvida de que seria descartável a contratação de uma empresa de arquitetura”, diz. Tudo faz crer, por isso mesmo, que a contratação do estudo era apenas uma forma de ocultar o rastreamento de um pagamento de propina.

VEJA também procurou empresários do ramo de painéis publicitários. De acordo com eles, o estudo da PDA é pouco usual no mercado e contém informações conceituais que poderiam ser descartadas. “Esse trabalho tem perfil de memorial descritivo. No mercado privado, isso não existe. Ninguém faz projeto de 200 páginas. Pode parecer bacana, bonito, mas não é prático. Uma vez, contratei um estudo complexo, que tinha, no máximo, oitenta páginas e custou 15 000 reais”, diz Tiago Brito, presidente da LedWave, uma das principais fornecedoras de painéis de LED do país. A LedWave chegou a disputar o contrato no aeroporto de Brasília, mas acabou perdendo o negócio para a Alúmi, que topou pagar 1 milhão de reais à PDA.

A pedido de VEJA, o arquiteto e engenheiro Jacson Paulo Tessaro, diretor do Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícia de Engenharia (Ibape), analisou o estudo produzido pela PDA e fez três constatações: não se trata de um estudo complexo; não há a assinatura do responsável técnico; e o custo de mercado de um trabalho similar varia entre 10 000 e 15 000 reais. A presidente do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea) do Distrito Federal, Fátima Có, que também examinou o estudo, mostrou-se surpresa com a informação de que o material custou 1 milhão de reais. “Verdade? Me chama a atenção. Não consigo nem imaginar como fizeram a composição desse custo. Não vejo complexidade nesse estudo”, diz ela, rindo.

O caso é revelador de como a corrupção, onipresente em contratos públicos, permeia também as relações privadas. Na época da negociata, a Alúmi tentava conquistar um contrato com a Inframerica, administradora do aeroporto de Brasília, da qual a Engevix era sócia. O objetivo da Alúmi era arrendar um espaço para instalar painéis publicitários. Antunes, da Engevix, envolvido em tratativas financeiras com o MDB, exigiu da Alúmi que contratasse a PDA Projeto, em regime de urgência, por 1 milhão de reais, exatamente o valor destinado a Temer. O presidente nega ter recebido propina.

MATÉRIA COMPLETA em  Veja

Leia também: A defesa do presidente Temer e do coronel Lima

domingo, 18 de junho de 2017

O mais grave contra Temer - que os contra o Brasil pensam que salvará Lula

Assim como o sítio e o triplex complicam Lula, a casa da filha complica Temer

[ São situações bem distintas e qualquer um que compare, com isenção, poderá constatar a diferença. 

Ocorre que, a meta de agora dos contra o Brasil é equiparar Temer a Lula, com isso colocar a novidade em destaque e levar Lula a ser esquecido - só que antes do dia 30 o juiz Moro vai lembrar dele e condená-lo a alguns anos em um dos muitos processos.

Afinal, processos contra Lula e provas dos seus crimes não faltam.] 


Como parecia claro desde o início, o que vai se configurando como mais grave e concreto contra o presidente Michel Temer é a relação dele com o coronel PM João Baptista Lima, o “coronel Lima” das delações da JBS. Por enquanto, e até surgirem fatos novos, bem mais grave e concreto do que a mala de R$ 500 mil do ex-assessor Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) e a fita gravada clandestinamente por Joesley Batista.

Tudo parece indicar que foi a JBS quem pagou a reforma da casa de uma das filhas de Temer, em São Paulo. O dinheiro sairia da empresa sob pretexto de doação de campanha, iria parar na empresa do coronel Lima e dali sairia para o pagamento de arquitetos e fornecedores de material para a obra.  A isso junte-se o depoimento do delator Ricardo Saud, da J&F, ao Ministério Público Federal. Segundo ele, dos R$ 300 milhões da “conta propina” do PT, R$ 15 milhões foram para a campanha à Vice-Presidência em 2014, mas Temer teria feito “uma coisa até deselegante”: surrupiado uma parte para uso pessoal.
“Eu já vi o cara pegar o dinheiro da campanha e gastar na campanha. Agora, ganhar dinheiro do PT e guardar para ele no bolso dele, eu acho muito difícil. Aí, ele (Temer) e o Kassab (Gilberto Kassab, ministro de Ciência, Tecnologia e Inovação) guardaram o dinheiro para eles usarem de outra forma”, diz Saud no vídeo de 23 minutos. Dinheiro de empresa privada em campanha era legal. No bolso dos candidatos, não.

Adiante, ele ratificou: “Nessa eleição, só vi dois caras roubar deles mesmos. Um foi o Kassab, o outro foi o Temer. O Temer me deu um papelzinho e falou: ‘Ricardo, tem um milhão que eu quero que você entregue em dinheiro nesse endereço aqui’”. Era o endereço da empresa do coronel Lima, que, conforme recibos e mensagens colhidas pela PF, foi quem financiou as obras na casa da filha do então vice.

Temer tem se enrolado diante de perguntas que não são só da PF e da mídia, mas da sociedade. Negou que viajara no jatinho da JBS para Comandatuba, na Bahia, depois confirmou, mas dizendo que não sabia de quem era o avião. Agora, tudo o que tem a dizer é que a filha tinha recursos, na época, para bancar as obras. É pouco, senhor presidente.

Assim como as obras no sítio e no triplex criam um link direto entre Odebrecht e OAS e o ex-presidente Lula, a da casa da filha é considerada o link entre a JBS e Temer. Daí porque é temerário ele prever, como fez ontem com ministros e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que o provável pedido de processo da PGR contra ele será “fraquíssimo”.

Com o coronel Lima entrando em cena como protagonista, as reações são contundentes. Temer quer pressa na votação do pedido da PGR na Câmara, Maia acena até com o cancelamento do recesso de julho e o ex-presidente Fernando Henrique dá uma guinada importante, que pode mudar a disposição do PSDB e do Congresso.

Assim como pediu a renúncia como “gesto de grandeza” de Dilma Rousseff em 2015, FHC enviou nota ontem ao jornal O Globo e à agência Lupa sugerindo a Temer antecipar as eleições gerais como “gesto de grandeza”. Ele admitiu que sua percepção sobre a crise tem sofrido “abalos fortes”. Tem mesmo, já que FHC sempre foi contra eleições diretas agora e havia liderado, três dias antes, a decisão do PSDB de continuar no governo.

Entre a reunião do “fico” e a defesa de eleições antecipadas, o que houve? Certamente, o avanço das investigações sobre os vínculos entre Temer, o coronel Lima e papéis rasgados na casa deste. [a causa para a mudança de opinião de FHC tem mais a ver com a inalação de substância estragada.]  Quem tem provas a destruir é porque tem culpa no cartório. A culpa de um coronel aposentado é uma coisa, a de um presidente da República é outra. Ainda mais com crise, tensão e futuro incerto.

Fonte: Eliane Cantanhêde - O Estado de S. Paulo