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quinta-feira, 23 de junho de 2016

A infidelidade ao alcance de todos


Acho complicada essa história de site. Nunca se tem certeza de quem está do outro lado. E há os psicopatas

Aquilo que antes começava com uma troca de olhar, um encontro casual, hoje está ao alcance de um dedo. Ficou fácil um caso entre duas pessoas casadas que só desejam um relacionamento eventual. Sem culpa. Ao contrário da que caracterizou grandes personagens da literatura, como a Anna Karenina, de Tolstói, que termina se atirando embaixo de um trem. Ou a Madame Bovary, de Flaubert, que toma arsênico. Não, não. Os tempos atuais são mais leves para quem quer ter umas horas de infidelidade, se vestir e retornar serenamente para a vida conjugal. Há um site internacional com mais de 40 milhões de seguidores, criado para quem quer um caso sem compromisso! 

É o www.ashleymadison.com

A imagem de entrada é uma linda mulher com um dedo na boca, pedindo segredo. Precisa dizer mais?
As opções são para todos os gostos. Homens que procuram mulheres. Elas por eles. Homens que buscam homens. Mulheres interessadas em mulheres. Basta preencher os dados e partir para a luta. As opções surgem em fotos, inicia-se o relacionamento com trocas de mensagens. O primeiro mês, vejam só, é promocional. Depois, o internauta pode optar por pagar e continuar em busca de romances rápidos. Bem, não tão rápidos. Um amigo meu conheceu uma mulher casada. Também casado, alugou um flat no bairro de Moema, em São Paulo. Encontraram-se algumas vezes. Ela explicou: – Depois de mais de dez anos de casados, eu e meu marido nos tornamos amigos. Já não temos sexo. Mas os filhos, o companheirismo. Só que eu gosto de sexo.
O caso começou vibrante. Não havia compromisso. Futuro. Só a alegria do momento. O marido da moça desconfiou. Botou detetive. Vieram as fotos. O endereço do flat. A briga. Ameaçou separar. Ela optou por continuar casada. Dias depois, reapareceu em nova mensagem. – Agora que meu marido se acalmou, vamos nos encontrar novamente?
Voltaram a se ver. O marido contratou o detetive de novo. (Se o detetive tivesse programa de milhagem, ele ganharia passagens internacionais!) A briga continuou. Meu amigo não queria separar. Nem ela. Resolveram sumir um do outro. O marido se acalmou, mas agora tem ciúmes do celular dela. Fazer o quê? Ela, bem, não mudou. Só foi descoberta e deu um tempo.
É um site para ter casos sem compromisso. Isso atrai principalmente pessoas que já têm alguém, mas, que por um motivo ou por outro, precisam de outra pessoa. Parece uma ideia sofisticada? Coisa nenhuma. Fiz uma pesquisa. Entrei para saber como é. Entre as candidatas, há mulheres de todas as classes sociais. Às vezes, absolutamente diretas. Querem logo chegar ao ponto. Outras preferem dar uma namoradinha durante algumas mensagens, para se sentirem mais seguras. O primeiro encontro, com frequência, já é em um local discreto. Afinal, nenhum dos dois quer ser visto, não é?
Para os tradicionais, parece safadeza. Todos nós ficaríamos admirados se descobríssemos quantos parceiros bem casados só fazem sexo raramente. Homens gostam de comentar brincando que depois de 20 anos fica difícil. Acho que é bem antes. Sorte dos casais em que o interesse sexual se renova. Bem... sorte ou muita imaginação!
Acho complicada essa história de site. Nunca se pode ter certeza de quem está do outro lado. Os crimes impossíveis de resolver são aqueles em que o agressor não tem  laços conhecidos com a vítima. Sem falar na possibilidade de chantagens. Vídeos. Depois de alguma intimidade, é fácil descobrir onde a pessoa mora, o nome do marido, da mulher.

  Não serei dramático a ponto de avisar que entre os interessados há uma boa percentagem de psicopatas. (Só que há, segundo as estatísticas.) Mas o encontro casual pode atrair, sim, alguém a fim de um golpe. E, para proteger a vida conjugal, quem traiu se afunda. É um site que facilita a traição e que as pessoas usam alegremente. Tem seus prós e contras.
O que me perturba, porém, não são as possibilidades criminais. Meu amigo, que usa o site há um bom tempo, passa de um caso a outro. Se, depois de um encontro, não gostou, não responde mais às mensagens. Depois de dez, 20, está farto, quase sempre. E troca de parceira extraconjugal. Já não vive sem o site. Quando não tem o que fazer, fica teclando, à procura de novas oportunidades. Se a relação não é profunda, uma nova chance sexual sempre parece mais atraente que a anterior. E será menos que a próxima. É isso aí. Ele não tenta mais renovar o casamento. 

Mas vai de caso em caso. Traição virou vício.


Fonte: Walcyr Carrasco - Época