A PGR, defensora fanática da mudança de foro para deputados e senadores, passa a ser, no STJ, defensora do que chamava de “privilégio”
Vocês acompanharam o debate sobre a
restrição de foro especial para deputados e senadores. É bem provável
que eu esteja a falar, neste momento, com uma maioria de leitores deste
blog que discordou do blogueiro. De tal maneira ficou parecendo que se
tratava de escolher entre a justiça e a injustiça, entre a punibilidade e
a impunidade que as pessoas nem quiseram ler ou ouvir os argumentos.
Qual posição triunfou? Permanecem com
foro no Supremo os deputados e senadores que tenham cometido crimes
durante o mandato e em razão deste. Todo o resto vai para a primeira
instância. Parece coisa boa? Parece. Na prática, os senhores
parlamentares serão processados e julgados por juízes estaduais (na
maioria dos casos) ou federais de seus respectivos estados, onde são
influentes, ganhando o direito a mais instâncias e a mais recursos. A
ideia de que a primeira instância pune mais do que o Supremo é falsa
como nota de R$ 3. Proporcionalmente, pune menos. Mais ainda: haverá, a
depender do caso, dificuldades incontornáveis. Imaginem um juiz da
primeira instância estadual ou um Tribunal de Justiça determinando a
prisão (preventiva no primeiro caso) de um deputado ou senador por crime
anterior ao mandato ou sem conexão com este. Ocorre que o Artigo 53 da
Constituição garante que o parlamentar federal só pode ser preso por
flagrante de crime inafiançável. E aí? Como é que fica? Delega-se,
então, um caso a juízes que não podem sê-lo plenamente?
Sim, é preciso disciplinar o foro
especial, que atinge quase 60 mil pessoas. Mas essa não era e não é
tarefa para ministro do Supremo. A decisão foi tomada. Magistratus
dixit, causa finita est. Reinaldo Azevedão perdeu mais uma, certo? Viva o
grito das ruas, certo ou errado.
Pois é…
O ministro Luis Felipe Salomão, do
Superior Tribunal de Justiça, fez a coisa certa. Ele próprio declinou de
processos, envolvendo governadores, que estavam em suas mãos. E o fez
para compatibilizar a prática desse tribunal superior com a decisão
tomada pelo STF. Se deputado e senador acusado de crimes que teriam sido
cometidos antes do mandato ou sem conexão com este devem ir para a
primeira instância, por que não fazer o mesmo com os governadores? E
propõe que o Órgão Especial do STJ, que fala pelo tribunal, passe a
adotar tal posição.
Eis que surge, então, a hipocrisia. A
Procuradoria-Geral da República, que se mostrou uma fanática da mudança
do foro para deputados e senadores decidiu, desta feita, fazer
diferente. Deu um parecer contrário à proposta de Salomão. Quem falou
pelo órgão foi Luciano Mariz Maia, vice-procurador. E o argumento ou é
igualmente hipócrita ou é cediço:
– o hipócrita: a Constituição prevê o foro especial para governadores; bem, mas ela também prevê para deputados e senadores, ora… Por que mudar no caso destes e não daqueles?;
– o cediço: a questão de ordem proposta por Barroso se limitava a parlamentares federais. Sim, é verdade. O ministro Salomão está propondo uma unificação de procedimentos.
– o hipócrita: a Constituição prevê o foro especial para governadores; bem, mas ela também prevê para deputados e senadores, ora… Por que mudar no caso destes e não daqueles?;
– o cediço: a questão de ordem proposta por Barroso se limitava a parlamentares federais. Sim, é verdade. O ministro Salomão está propondo uma unificação de procedimentos.
A verdade, com a devida vênia, é que o vice-procurador está se lixando para os governadores. O ponto é outro. Acontece que a “Alínea a” do Inciso I do
Artigo 105 da Constituição diz que compete ao STJ processar e julgar
originariamente “nos crimes comuns, os Governadores dos Estados e do
Distrito Federal, e, nestes e nos de responsabilidade, os
desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito
Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito
Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais
Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de
Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem
perante tribunais”.
Entenderam o ponto? Quando cair o foro
especial dos governadores no STJ, cairá também o dos desembargadores dos
Tribunais de Justiça, dos membros dos Tribunais Regionais Federais e
dos integrantes do Ministério Público da União, incluindo os
procuradores da República, como o próprio Maia. Toda essa gente seria
julgada por juiz de primeira instância. Nos bastidores, Roberto Barroso e Luiz
Fux, dois entusiastas da mudança do foro para deputados e senadores,
passaram a falar contra a mudança. E o muxoxo é o seguinte: “Imaginem um
juiz de primeira instância processando e julgando um desembargador…”
Ora, doutores, se o projeto já aprovado no Senado passar também na
Câmara, teremos magistrado de primeiro grau convocando para depor
ministro do Supremo.
Vocês não queriam brincar de Deus? Não quiseram legislar? O colunismo que se conforma em ser
porta-voz e assessor de imprensa do Ministério Público Federal agora se
mostra contrário à mudança do STJ.
Eu, agora, sou a favor. E não se trata
de uma questão de mérito, mas de unificação de procedimentos. Trata-se
apenas de uma questão de coerência e vergonha na cara, não é mesmo,
senhores e senhoras da PGR?
Blog do Reinaldo Azevedo