Quais
são as acusações contra o senador Aécio Neves (PSDB-MG)? Segundo o
Ministério Público, ele recebeu mais de R$ 60 milhões de propina. Um
primo de Aécio recolheu dinheiro vivo dos emissários do grupo J&F.
Haveria sinais de lavagem de dinheiro também. Dito isto, é possível prender Aécio Neves? Não.
As investigações ainda estão em curso. Nem réu ele é. E, pela
Constituição, só pode haver prisão de parlamentar em casos de flagrante
em crime inafiançável (tortura, tráfico de drogas).
Por três
votos a dois, a Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu
que, mesmo sem ser preso, Aécio poderia ser atingido por "medidas
cautelares": o afastamento do cargo, a proibição de que saia de casa à
noite, de que se ausente do país e que entre em contato com outros
investigados. A decisão entrou nesta quarta-feira para análise do plenário do STF. O
caso era complicado. Se considerarmos que Aécio sofreu punição
semelhante à pena de cadeia, o princípio da imunidade parlamentar
estaria sendo rompido. Para Edson Fachin, relator do caso, não se
trata disso. Importa zelar pela continuidade das investigações, sem que
se esteja com isso condenando Aécio. As medidas decretadas são ações a
que todo cidadão está exposto.
Exposto, sim, pelo Código de Processo Penal, concordou Alexandre de Moraes. Mas nada pode prevalecer sobre a Constituição. Seu voto recebeu apoio exaltado de Gilmar Mendes. Suspende-se um juiz, disse Gilmar, só quando há denúncia formalizada. Vamos suspender um senador sem nem mesmo haver denúncia? Muitos
parlamentares já são réus, e não foram afastados. Fazer isso contra
Aécio seria arbitrariedade. Direito constitucional da malandragem,
bufou.
Veio o contra-ataque de Luís Roberto Barroso. Temos de
romper com um "pacto oligárquico", disse ele, voltado a "saquear o
Estado". Ele resumiu as suspeitas contra Aécio; seus associados já
estavam presos. Como permitir que o senador leve a vida "como se nada
tivesse acontecido"? Frequentando "baladas, festas..."? Se era para não parecer arbitrário, Barroso ia seguindo um mau caminho. Mas
ele fortaleceu o argumento. Na eventualidade de um parlamentar agredir a
mulher, teremos de aplicar a Lei Maria da Penha, determinando que ele
se distancie da agredida... Vale imunidade num caso desses?
Rosa
Weber concordou com Barroso. A Carta protege o mandato, não a pessoa do
parlamentar. Disciplina, ademais, a perda do cargo -e não um mero
afastamento. Seria preciso, acrescentou Luiz Fux, que a Constituição
proibisse explicitamente a aplicação de medidas como as tomadas contra
Aécio. Se a Carta silencia, o STF está autorizado a impô-las. Para
outros ministros, o raciocínio é inverso. Se a Constituição só admite
prender o parlamentar numa hipótese precisa, nada se pode fazer fora
disso. Foi esta a linha seguida por Dias Toffoli, acompanhando
Alexandre de Moraes, e citando apesar disso os casos de "superlativa
excepcionalidade" em que o afastamento de parlamentares se impôs.
Com
uma fita do "outubro rosa" na lapela, Ricardo Lewandowski também votou a
favor de Aécio. O contexto, avançou Gilmar Mendes, é o das pressões
organizadas pelo ex-procurador geral, Rodrigo Janot. Sabe-se lá "quais
lambanças" em matéria de provas e indícios foram feitas. Haveria um
"transe" acusatório no país, com ajuda de uma "mídia opressiva". O 5 a 4 veio com Marco Aurélio Mello, recusando o que chamou de "punitivismo" contra o senador. Celso
de Mello empatou de novo: para ele, as medidas contra Aécio não são
punitivas, e não podem ser revogadas pelo Congresso. O STF, frisou,
fecha a questão. Responsabilidade que coube à presidente da Corte,
Cármen Lúcia. Depois de falar bastante a favor de Fachin, e contra a
"impunidade", ela terminou sem jeito.
Aceitou algumas "medidas
cautelares", mas não a que afasta Aécio do seu cargo desde já. Só com
autorização do Senado isso será possível. Ora, disseram outros
ministros, qualquer das outras medidas -como o recolhimento noturno-
também traz embaraço ao exercício do mandato. É "afastamento indireto",
atacou Alexandre de Moraes. Cármen Lúcia não queria chegar a
tanto. Seu desconforto, sua confusão e seus engasgos eram nítidos.
Queria evitar o afastamento, sem negar as outras medidas. Que, na
prática, atingem o mandato de Aécio também.
A falta de clareza de
Cármen Lúcia dificultava tudo. Fez-se uma redação genérica, de modo a
aplacar seus embaraços. Bem ou mal, Aécio continua senador. Esperem-se
os embargos de declaração.
Fonte: Marcelo Coelho - Folha de S. Paulo
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quinta-feira, 12 de outubro de 2017
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