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segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020

A reforma administrativa e os seus vários obstáculos – Editorial - Valor Econômico

Um Estado que atenda às aspirações dos brasileiros prescinde do fim da estabilidade do funcionalismo no emprego

[o último parágrafo da matéria, faz referência ao fim da estabilidade do servidor público - fica claro que é favorável a demissão de servidores;

quem for cuidar dessa medida, deve ter presente a CRISE, o CAOS, que tomou de conta do INSS, não devido ao fim da estabilidade e sim devido a não reposição de funcionários que se afastaram por razões diversas, especialmente aposentadoria. 

Portanto, demitir servidor por atacado, pode ser um tiro pela culatra. Lmbram do João Santana do govero Collor?]

Uma das reformas mais difíceis de se aprovar em Brasília é a administrativa. E é fácil entender por quê: desde a promulgação da Constituição, em 1988, foram criados tantos benefícios para os funcionários públicos que qualquer proposta de mudança esbarra numa resistência organizada, poderosa e eficiente. O lobby dos servidores é, sem dúvida, o mais forte da República.

No fim deste mês, o governo enviará ao Congresso Nacional Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para tratar da reforma administrativa, conhecida também como reforma do Estado. O interesse da equipe econômica, liderada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, na aprovação dessa reforma é urgente, mas não se vê a mesma disposição no Palácio do Planalto. Durante os 28 anos em que exerceu mandato de deputado federal, o presidente Jair Bolsonaro só teve uma bandeira: defender os interesses da corporação militar, à qual pertenceu antes de entrar na política. Não há nada de errado nisso, mas, como se viu na tramitação da reforma da Previdência, Bolsonaro retirou os militares da PEC original, justamente para que a corporação não passasse a ter as mesmas regras de aposentadoria dos demais brasileiros. [atualizando - com o devido e indispensável pedido de vênia : a categoria militares não é tratada na Carta Magna na mesma Seção que cuida dos militares, por tal condição é que os militares não tinham um sistema de previdência;
assim, uma reforma objetivando cuidar da previdência dos servidores civis e dos empregados na iniciativa privada, não poderia incluir  aquela categoria.
 
A categoria militares é tratada de forma específica na Constituição Federal, por isso foi objeto de legislação que tramitou em paralelo com a Reforma da Previdência.] Ademais, defender corte de benefícios de funcionário público em ano eleitoral é algo que a classe política costuma evitar.

A reforma administrativa se justifica por várias razões, mas duas são inapeláveis: o custo elevado do funcionalismo para a sociedade e a ineficiência atávica do Estado. A máquina pública brasileira, considerando apenas a União (os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário), é cara em termos absolutos, isto é, para um país de renda média como o Brasil, e também quando comparada ao desembolso feito por economias em desenvolvimento e ricas. Em 2018, último dado disponível, o gasto com pessoal nos três poderes atingiu o equivalente a 13,8% do Produto Interno Bruto (PIB). Se nada for feito, alcançará 14,8% do PIB ao fim desta década. [As economias desenvolvidas, ricas, por óbvio possuem um PIB bem mais elevado que o do Brasil - especialmente os Estados Unidos, de modo que um percentual menor aplicado sobre um PIB maior apresenta um resultado MAIOR.
Em valores absolutos os números são superiores aos do Brasil.]

Nações ricas, principalmente as europeias, onde o Estado do bem-estar social mais se desenvolveu, costumam ter uma máquina governamental custosa. Ocorre que, atualmente, segundo estudo do Ministério da Economia, em proporção do PIB, os países da União Europeia gastam com pessoal, em média, bem menos que o Brasil - 9,9% do PIB. Os Estados Unidos, que por motivos óbvios têm despesa na área de Defesa muito superior à de qualquer outro país, também dispendem com o funcionalismo menos que o Brasil - o equivalente a 9,5%. Economias do porte da brasileira destinam, em geral, menos de 10% do PIB ao gasto com pessoal.

Nos últimos anos, a despesa com pessoal ativo e inativo (um dos motivadores da reforma da Previdência) cresceu acima de qualquer parâmetro da economia, o que revela o caráter autóctone da burocracia brasileira. Os governos Lula e Dilma, dado o vínculo histórico dos sindicatos dos servidores com o PT, aumentaram a força de trabalho em 34% - de 532 mil funcionários para 712 mil entre 2003 e 2018. Num período mais curto, de 2008 a 2018, chama a atenção o fato de a despesa com pessoal ativo ter crescido 242%. Outro dado que mostra o quanto os funcionários públicos vivem num mundo diferente do restante dos brasileiros: nos últimos 15 anos, os funcionários tiveram, em média, aumento real de salário (acima da variação da inflação) de 53%.

Outra razão para a urgência da reforma é mudar o modelo que consagrou o Estado brasileiro, apesar de seu elevado custo, como ineficiente, extremamente burocrático e prestador de servicos de baixa qualidade. Portanto, trata-se de um Estado inadequado para sua função precípua, que é diminuir a distância entre ricos e pobres, igualando oportunidades numa das nações de maior concentração de renda do planeta. Não se tenha dúvida: a criação de um Estado que atenda às aspirações dos brasileiros prescinde do fim da estabilidade do funcionalismo no emprego. Instituída pelos constituintes de 1988 para todas as carreiras, a estabilidade é o incentivo errado quando se pensa em eficiência no serviço público. A PEC do governo vai propor o fim da estabilidade generalizada, preservando-a apenas para as carreiras típicas do serviço público, como auditor fiscal e diplomata. Ainda assim, a ideia, bastante razoável, é que a estabilidade nesses casos seja conquistada num prazo mínimo de dez anos.

Editorial  - Valor Econômico