A barbárie
ocorrida na França deixa o mundo diante de um impasse. O extermínio de
células terroristas pode passar perigosamente pelo sacrifício de vítimas
inocentes aumentando ainda mais, de lado a lado, a intolerância social.
Mirar as regiões conflagradas pelo terrorismo como alvo de ataques
indiscriminados, tal qual vem acontecendo, coloca todos ali como
culpados das atrocidades em série, não importando o papel de cada um
nesses crimes.
No momento, hordas de imigrantes sírios cruzam fronteiras
e avançam sobre a Europa fugindo do caos. Em nada compactuam com os
atentados covardes e cruéis dos “jihadistas”. Ao contrário. Sofreram com
os atos cometidos por esses grupos, perderam tudo e almejam refúgio.
Milhares de famílias, na luta incessante pela vida e contra o crescente
avanço do Estado Islâmico, aventuram-se em travessias desumanas.
Atiram-se ao mar. Em romaria desesperada sonham com a ajuda do Primeiro
Mundo. Na maioria das vezes batem com a cara nas armas de polícias
fronteiriças. São discriminados. Já eram vistos com crescente
desconfiança.
Temem agora o pior. Acreditam que do mero sentimento de
resistência muitos daqui por diante alimentem uma xenofobia exacerbada,
com perseguições e retaliações de toda ordem. O medo e a revolta movem
as pessoas em qualquer canto por esses dias e o fantasma da
radicalização ronda a humanidade. Inúmeros são os muçulmanos que relatam
episódios comprovando a proliferação da “Islamofobia”. Para atenuar
seus efeitos, já debatem o abandono de hábitos tradicionais como o uso
de véu e barba, renunciando a seus costumes em nome da tranquilidade.
Naturalmente, à luz dos inconcebíveis atos de extermínio praticados
pelos extremistas do EI, não é de se esperar menos que um combate
implacável, uma luta sem trégua das forças aliadas, para restabelecer a
normalidade e a sensação de segurança que regem a boa convivência entre
os povos. Mas é preciso também saber separar o joio do trigo. O
fundamentalismo doentio de alguns visa barrar na marra a marcha
civilizatória e o direito universal à liberdade, impondo o temor
generalizado como arma de intimidação.
Não lograrão êxito. Do mesmo modo
que não pode ser concebido o abandono à própria sorte de exilados
famintos e sem rumo. O trauma causado pelo banho de sangue derramado em
Paris ficará na memória por anos a fio. Porém com serenidade e justiça
os líderes globais devem pensar acima de tudo na proteção dos oprimidos e
na preservação do respeito às diferenças de credo, raça e orientação
política - sem que isso signifique concessões a abusos e crimes de
qualquer natureza, por quem quer que seja.
Fonte: Carlos José Marques, diretor editorial - Revista IstoÉ