O Estado de S. Paulo
Investidores estrangeiros não estão interessados no meio ambiente, só na Região Amazônica
A Amazônia não é uma questão regional, mas nela se joga a soberania do
País. Os olhos de outros Estados estão para lá voltados. Nada aí é
inocente. Engana-se quem pensa somente na questão ambiental. Os
europeus, em particular, acham que o destino de seus próprios países se
decide ali. Tudo o que acontece nesse bioma não tem significação
exclusivamente local, ganha dimensão internacional. Goste-se ou não,
queira-se ou não, a Amazônia é uma caixa de ressonância planetária. Eis a
realidade incontornável.
[EXATAMENTE, EXATO;
o Meio Ambiente não tem o menor valor, não gera nenhuma preocupação.
O que eles querem é a Amazônia e para tanto contam com o apoio dos indígenas, de maus brasileiros que, por ganância ou estupidez, estão a serviço das potências estrangeiras.
Aquele francês, o Macron, quando falou em internacionalizar a Amazônia jogou um balão de ensaio buscando saber a reação do Brasil sobre abrigar uma colônia mundial.
Buscou também defender os interesses dos agricultores franceses que não tem condições de concorrer, de forma limpa, com o agronegócio brasileiro.]
Uma queimada na Amazônia tem uma significação; na Austrália, outra. Esse
país literalmente arde em chamas em várias de suas regiões, porém não
se ouve nenhuma grande manifestação mundial ambiental acusando o governo
australiano de irresponsabilidade. [o mesmo raciocínio é válido para os incêndios na Califórnia - nem uma linha é escrita chamando o governo americano de irresponsável com o meio ambiente.] Uma queimada na Amazônia é
imediatamente vista como descaso governamental, ação do agronegócio, e
assim por diante. Tudo se torna, de uma maneira ou de outra,
irresponsabilidade ou “crime”. Não que queimadas não devam ser
rigorosamente monitoradas e combatidas, mas o problema consiste no modo
midiático de sua repercussão.
Talvez não haja nenhuma outra região do mundo que tenha tantas ONGS por
quilômetro quadrado. É uma verdadeira poluição midiática, sem organismo
ambiental que a combata! Umas fazem bem o seu trabalho de preservação
ambiental, outras estão a serviço de outros países, que veem o Brasil
como concorrente no agronegócio. Quantos mais entraves aqui, melhor para
eles. As interconexões são bem articuladas, tendo ganho um slogan bem
conhecido, “florestas lá (no Brasil), fazendas aqui (nos EUA)”, [“Forests there, farms here”] fórmula
há alguns anos utilizada pela Confederação Americana de Fazendeiros.
Sejam as ONGs do “bem”, sejam do “mal”, todas atuam nessa região
conforme seus próprios canais midiáticos e digitais nas redes sociais. O
barulho é ensurdecedor e o País não sabe agir nem reagir adequadamente.
Eis por que a política de enfrentamento não tem chance de ser
bem-sucedida. Valem aqui argumentos, negociações e políticas públicas de
assistência à região. De nada adianta acusar, pois o contragolpe será
forte e contará, ademais, com o apoio de grande parte da opinião pública
nacional e internacional. O País tem muito que mostrar, mas comunica-se
mal e sua imagem é socialmente ruim. Por exemplo, o Brasil tem o
instituto da reserva legal, que obriga, por exemplo, um produtor da
Amazônia a conservar ambientalmente 80% de sua propriedade. Acima desse
porcentual hoje está preservado com vegetação nativa nessa imensa área.
Outro exemplo: 13% do território é constituído de área indígena, para
500 mil indígenas em área rural e outro tanto aproximadamente em zona
urbana, segundo o IBGE.
Uma coisa é a realidade e outra, sua percepção e transmissão. Muito
também pode ser feito na regularização fundiária, na titulação dos
assentamentos, no desenvolvimento econômico e social da região, que,
muito bem apontado pelo ministro Paulo Guedes em Davos, enfrenta
problemas graves de pobreza, que devem ser contemplados. A assistência
técnica é central. Combinar sustentabilidade, agricultura e pecuária é
imperativo. O desmatamento ilegal deve ser rapidamente combatido, e
assim por diante.
Se o Brasil mantiver simplesmente o status quo, terá graves prejuízos,
dentre os quais o mais imediato poderá ser a exigência de um selo
ambiental dos produtos exportados da Amazônia ou de empresas que lá
atuam. Seria uma barreira não tarifária que traria grandes prejuízos
para o agronegócio. Exigências ambientais fazem cada vez mais parte do
comércio internacional, tendência que tende a crescer. Na verdade,
investidores internacionais não estão interessados no meio ambiente em
geral, mas particularmente na Amazônia. Eis o nó da questão. Não querem
saber da agricultura e da pecuária no Sul ou no Sudeste, tampouco das
cidades, que são as maiores poluiodoras, com esgotos a céu aberto e
dejetos lançados nos rios. Nem a poluição dos automóveis é levada em
consideração. O único ponto importante é a Amazônia. Eis por que a
iniciativa de criação do conselho é da maior importância, o governo
apresentando manifestamente um déficit nessa área.
O presidente Jair Bolsonaro em boa hora criou o Conselho da Amazônia,
sob a coordenação do vice-presidente Hamilton Mourão. Seu objetivo
consiste em enfrentar essa grave questão mediante o agrupamento e a
operacionalização de vários órgãos estatais e ministérios, como os da
Agricultura, do Meio Ambiente, da Defesa, Infraestrutura, Minas e
Energia. A importância da iniciativa já surge dessa própria organização,
uma vez que o trabalho foi confiado ao vice-presidente, a segunda maior
autoridade da República, aí com funções propriamente executivas.
Ademais, o vice-presidente é pessoa afeita ao diálogo, sabe se comunicar
e não funciona politicamente a partir da distinção amigo/inimigo. Cabe
esperar, agora, que essa coordenação se torne efetiva e não seja
boicotada por rivalidades ministeriais menores. O apoio presidencial
será decisivo.
Denis Lerrer Rosenfield, professor - O Estado de S.Paulo.