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sábado, 3 de fevereiro de 2018

Suprema decisão

O marco “legal” estabelecido pela presidente do Supremo, Cármen Lúcia, de que o STF não pode se apequenar e pautar suas decisões de acordo com as conveniências de um único indivíduo é digno de nota. Serviu para calar, mais do que isso, para dirimir quaisquer dúvidas sobre a postura absolutamente imparcial que a Corte pretende adotar em meio ao festival de aberrações politiqueiras e desvios de toda ordem que tomaram conta da Nação.


Seria o procedimento natural e esperado de uma Justiça que se diz cega e imparcial, mas episódios recentes suscitaram receios acerca desse comportamento. Daí a reafirmação da juíza ter um peso específico e fundamental neste momento. Cármen Lúcia foi além do mero comentário, numa escalada de tom que subia dia a dia ao longo da semana. Em entrevista após encontro com jornalistas, apontou que não iria colocar em agenda revisões de jurisprudência já votada três vezes e deliberada para a entrada em vigor desde 2016. Mais adiante, em cerimônia ao lado do presidente Temer, reagiu a críticas e alertou que discordar da Justiça é possível, mas desacatá-la era inadmissível.  [corroborando o afirmado no iniciado do parágrafo acima, destacamos que falar em imparcialidade da Suprema Corte é algo injustificável, tendo em conta decisões claramente políticas tomadas pela atual presidente, quando representando o STF e pela própria Corte Suprema:
- cassar, sem o menor amparo legal, buscando apenas marcar presença durante o recesso da Corte que preside, a decisão do ministro do STJ autorizando que a deputada Cristiane Brasil tomasse posse;
- suspender um indulto natalino sob a alegação que poderia favorecer eventuais criminosos da Lava-jato em mais uma decisão 'marcar presença';  
Citando uma decisão do próprio STF: buscando agradar a população que sempre gosta de ver um corrupto preso (quem não gosta???) fez a Lei da Ficha Limpa retroagir para punir um político envolvido com a prática de atos que se convencionou chamar CAIXA DOIS - que continua sem ser crime, visto inexistir tipificação penal;
tudo com um detalhe: tal político já havia sido punido pelos atos praticados na época do seu cometimento - prática do ato e punição em data bem anterior a da promulgação da lei em questão - com base na lei existente na época dos fatos.
Pode o STF, a vista desses exemplos  e de muitos outros, ser chamado de agir com postura imparcial?]

O recado tinha destino certo: a trupe de militantes petistas e o poderoso “chefão” do Partido, Lula da Silva, que em um desvario coletivo e antidemocrático passaram a incitar abertamente a desobediência civil, com ameaças claras às instituições constituídas. Lula, em reunião da Executiva Nacional do PT, chegou a afirmar que não respeitaria o veredicto da oitava turma do TRF-4 que o condenou. A própria nota oficial da agremiação falou em “farsa judicial” sobre a sentença. Serviu como senha para conclamar aliados e simpatizantes ao confronto. O senador Lindbergh vociferou em comício que a condenação era “golpe” e pediu da mirrada plateia que o ouvia, sem sucesso, uma resposta radical nas ruas. Ao lado de Gleisi, do “exército” brancaleone de João Stédile e de poucos agregados, o senador almejou mudar tudo na marra. Faltou senso de ridículo e de responsabilidade, dado o cargo que ocupa. Espernear vem resultando em nada. Evidentemente, o STF não se prestaria ao papel de rearrumar uma lei para atender ou beneficiar quem quer que fosse, muito menos alguém que se imagina acima da Carta Magna. 

A suposta disposição de beneficiar Lula, revendo entendimentos anteriores justamente nessas circunstâncias, violaria de maneira constrangedora a isonomia da Justiça, num casuísmo gritante. A questão em voga era a prisão em segunda instância, recolocada em discussão após os três desembargadores, de forma unânime, reiterarem a culpa do ex-presidente em um processo por corrupção – que, no seu caso, teve agravante de pena de 12 anos e um mês – e que pode trancafiá-lo atrás das grades a partir de março próximo. A parolagem petista fala em rever a sentença através de apelação naquele que consideram um tribunal mais maleável, digamos assim. No entender dessa turma o STF tem sido permissível a pressões políticas e, por isso, lá Lula joga suas melhores chances. 

Seria, para dizer o mínimo, um movimento desastroso e constrangedor se o Supremo confirmasse essas expectativas, botando para votar de novo a prisão em segunda instância, eventualmente reciclando a regra que vigora no momento para livrar Lula da prisão. Como um verdadeiro cordão de isolamento a favor da lei atual, diversas organizações de magistrados se manifestaram pedindo coerência e respeito ao que foi estabelecido e transita em julgado. Lançaram assim uma espécie de ofensiva contra o que consideram riscos de enfraquecimento do Poder Judiciário. A legião de advogados do PT, numa manobra derradeira, ainda buscou arrancar um habeas corpus no STJ com argumentos risíveis, misturando política nas alegações para uma soltura preventiva de Lula, que não foi concedida. Diz o requerimento que ele “é líder absoluto nas pesquisas” e, logo, não deveria ter “a privação de sua liberdade” dado o risco à democracia. Não condenar alguém em virtude de representatividade é de uma tolice sem tamanho. [quanto maior a representatividade mais pesada deve ser a pena, destacando assim o caráter exemplar da medida punitiva.] Votos não garantem licença para delinquir. 

O intento evidente da defesa é o de transformar tribunais em palanques, vendendo a tese de uma conspiração generalizada que envolveria Judiciário, Polícia Federal, mídia e adversários. O PT, decerto, perdeu o eixo. A paródia de uma perseguição política dessa magnitude é indefensável no plano da realidade. Tal patacoada dos advogados só não é maior que a pretensa ambição deles em estender o debate a fóruns internacionais, denunciando ao mundo aleivosias. De uma maneira ou de outra, a suprema decisão de Cármen Lúcia veio na hora certa. Resgatou o bom-senso. Desbaratou as articulações dos que anseiam por uma Justiça lenta e menos efetiva. E, acima de tudo, evitou uma mácula ultrajante na imagem da instituição.

Carlos José Marques, diretor editorial da Editora Três