Cármen
Lúcia aplicou um drible nos colegas que tentavam emparedá-la. Ontem a ministra
seria cobrada a pautar um novo julgamento sobre a prisão de condenados em
segunda instância. Ela atirou primeiro. De surpresa, antecipou para hoje a
decisão sobre o futuro do ex-presidente Lula.
A finta
de Cármen deixou o petista na marca do pênalti. A defesa esperava que o Supremo
julgasse uma ação genérica, que poderia beneficiá-lo de forma indireta. Ao
pautar o pedido de habeas corpus, a ministra devolveu a pressão aos colegas que
preferiam salvar o ex-presidente sem citar o seu nome. Para o
PT, a manobra reduziu as chances de Lula escapar da cadeia. Se o Supremo negar
o habeas corpus, ele ficará nas mãos do Tribunal Regional Federal da 4ª Região,
que já aumentou sua pena de nove para 12 anos. Tudo indica que a Corte negará o
último recurso da defesa na próxima segunda. Isso significa que o ex-presidente
poderá ser preso em menos de uma semana.
A decisão
de Cármen foi 100% política. [Cármen Lucia teve a competência que faltou ao presidente Temer em vários embates nos quais sempre recuou e todos solaparam as frágeis base de sua autoridade.
Inclusive Temer recuou em um dos embates que seria com a própria presidente do STF - não insistiu junto à Suprema Corte para que decidisse sobre a cassação por um juiz de primeira instância da atribuição constitucional privativa do presidente da República de nomear ministros.] Ela estava prestes a ser derrotada, depois de
declarar que não reabriria o debate sobre as prisões. Um recuo forçado
esvaziaria sua autoridade como presidente do Supremo. Ela ficaria esvaziada até
setembro, quando terá que passar a cadeira ao ministro Dias Toffoli.
Ao
antecipar o Dia D de Lula, Cármen buscou apoio externo para marcar posição no
tribunal. É uma tática que ela tem adotado desde que tomou posse. Nas últimas
semanas, resultou em declarações de apoio de artistas e militantes, que
chegaram a lançar o bordão “Resista, Cármen Lúcia” nas redes sociais. A
ministra voltou a colher aplausos antes da sessão de ontem, quando abriu o
gabinete para ativistas que apoiaram a derrubada do governo Dilma e agora
defendem a prisão de Lula. O encontro foi marcado pelo movimento Vem Pra Rua,
que ajudou a organizar as manifestações a favor do impeachment.
Entre os
quatro visitantes recebidos por Cármen, estava Jaílton Almeida, dublê de
ativista e assessor da Presidência da República. Ele deve o cargo ao
ex-ministro Geddel Vieira Lima, o homem de R$ 51 milhões, hoje preso na Papuda.
Na saída, o funcionário do Planalto foi só elogios à “resistência” da ministra.
Bernardo
Mello Franco, jornalista - O Globo