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quinta-feira, 6 de julho de 2017

Desafio da aposentadoria

O agravamento da crise política praticamente selou o destino da reforma da Previdência. No melhor cenário, o que se espera é a aprovação de um projeto fatiado, com apenas a idade mínima, com uma diferença ainda maior para a mulher e entrada em vigor muito gradativa. Em outros países do mundo são feitas reformas sequenciais porque a idade da população está mudando todas as equações.

Não é realista supor que se possa aprovar um projeto dessa envergadura em um governo tão fraco. Por isso o tema ficou para mais adiante. Quanto mais demorarmos, mais difícil será fazer o ajuste. E esse problema não é só nosso, mas apenas nós estamos paralisados diante da questão.  Segundo estudo da seguradora Mongeral Aegon, a expectativa de vida no mundo tem tido um crescimento médio de 1 a 5 meses por ano ou 1,5 a 2 anos por década dependendo da faixa etária e da região geográfica. Ao mesmo tempo, as taxas de natalidade estão caindo. O que acontece no Brasil é observado globalmente: há cada vez menos jovens para financiar as aposentadorias de uma população mais velha e que tende a viver cada vez mais. O desafio não é só do setor público, mas também das empresas privadas, patrocinadores de fundos de pensão e das famílias que fazem planos de previdência. Pelas contas da Mongeral, cada ano a mais de vida requer um aumento de 4% nos aportes dos participantes dos fundos.  — Em termos gerais, estamos todos vivendo mais. Este é um desafio global, não apenas do governo brasileiro. Países que já têm idade mínima estão tendo que aumentar a idade para lidar com o problema — disse Chris Madsen, CEO da Blue Square RE, resseguradora da Aegon, que esteve no Brasil para falar sobre o tema.

O governo francês, em 2010, enfrentou protestos nas ruas para aumentar a idade mínima. Segundo a Mongeral, mais de 80% das aposentadorias no país são financiadas pelo setor público. Na Alemanha, a taxa chega a 75%. No Japão, a idade mínima é de 63 anos, mas os japoneses têm trabalhado, em média, seis anos a mais do que isso antes de se aposentar. No México, a idade média de aposentadorias para homens é de 72 anos, no Chile, 69 anos, e nos EUA, 65 anos. No Brasil, é de 59 anos, segundo o Ministério da Previdência.

O Brasil está atrasado. O país não só tem um déficit gigantesco como não consegue olhar os desafios à frente. A expectativa de vida subiu mais de 20 anos desde a década de 1960 e nas próximas décadas continuará subindo. Além disso, a geração mais populosa está chegando aos 60 anos e vai crescer a um ritmo quatro vezes maior do que o do resto da população.

Segundo a OCDE, a população acima de 65 anos no Brasil aumentará cinco vezes nas próximas décadas, saindo de 7,6% para 38% em 2050. O nosso gasto já é muito elevado, para uma população relativamente jovem. Segundo estudo do economista e coordenador de Previdência do Ipea, Rogério Nagamine, com dados de 2010, o problema é crônico e vem de antes do agravamento da crise. Nesse ano, em um levantamento com 86 países, o Brasil ficou em 13º lugar com a maior despesa de Previdência em relação ao PIB, mas ocupou o 57º no percentual da população acima de 65 anos. “O Brasil possui uma despesa com Previdência alta e acima do esperado para sua estrutura demográfica e tende a aumentar com o rápido processo de envelhecimento pelo qual o país está passando”, disse Nagamine.

O pior é que a ausência de idade mínima, que o governo Temer tenta aprovar na reforma, tem beneficiado principalmente os mais ricos. De acordo com o estudo “Os mitos Previdenciários do Brasil”, de Rogério Nagamine, Graziela Ansiliero e Luiz Henrique Paiva, a média de idade de aposentadoria dos trabalhadores de maior renda é de 54 anos, porque eles conseguem se aposentar por tempo de contribuição. Já entre os que ganham menos, a idade sobe para 63 anos, porque eles passam um grande período da vida trabalhando sem carteira assinada. Estabelecer a idade mínima afetará principalmente os mais ricos, não os mais pobres.

O mundo já olha para as tendências populacionais que vão agravar os desafios da Previdência. O Brasil não consegue ainda entrar em um acordo sobre os números. Os adversários da reforma negam a necessidade de mudança e a existência do déficit. A crise Temer adiará inevitavelmente a reforma, que se fosse aprovada como inicialmente pensada começaria a ter efeitos no ano que vem.


Fonte: Coluna da Miriam Leitão, com Alvaro Gribel, de São Paulo