O agravamento da crise política praticamente selou o
destino da reforma da Previdência. No melhor cenário, o que se espera é a
aprovação de um projeto fatiado, com apenas a idade mínima, com uma
diferença ainda maior para a mulher e entrada em vigor muito gradativa.
Em outros países do mundo são feitas reformas sequenciais porque a idade
da população está mudando todas as equações.
Não é realista supor que se possa aprovar um projeto dessa
envergadura em um governo tão fraco. Por isso o tema ficou para mais
adiante. Quanto mais demorarmos, mais difícil será fazer o ajuste. E
esse problema não é só nosso, mas apenas nós estamos paralisados diante
da questão. Segundo estudo da seguradora Mongeral Aegon, a expectativa de vida no
mundo tem tido um crescimento médio de 1 a 5 meses por ano — ou 1,5 a 2
anos por década — dependendo da faixa etária e da região geográfica. Ao
mesmo tempo, as taxas de natalidade estão caindo. O que acontece no
Brasil é observado globalmente: há cada vez menos jovens para financiar
as aposentadorias de uma população mais velha e que tende a viver cada
vez mais. O desafio não é só do setor público, mas também das empresas
privadas, patrocinadores de fundos de pensão e das famílias que fazem
planos de previdência. Pelas contas da Mongeral, cada ano a mais de vida
requer um aumento de 4% nos aportes dos participantes dos fundos. — Em termos gerais, estamos todos vivendo mais. Este é um desafio
global, não apenas do governo brasileiro. Países que já têm idade mínima
estão tendo que aumentar a idade para lidar com o problema — disse
Chris Madsen, CEO da Blue Square RE, resseguradora da Aegon, que esteve
no Brasil para falar sobre o tema.
O governo francês, em 2010, enfrentou protestos nas ruas para
aumentar a idade mínima. Segundo a Mongeral, mais de 80% das
aposentadorias no país são financiadas pelo setor público. Na Alemanha, a
taxa chega a 75%. No Japão, a idade mínima é de 63 anos, mas os
japoneses têm trabalhado, em média, seis anos a mais do que isso antes
de se aposentar. No México, a idade média de aposentadorias para homens é
de 72 anos, no Chile, 69 anos, e nos EUA, 65 anos. No Brasil, é de 59
anos, segundo o Ministério da Previdência.
O Brasil está atrasado. O país não só tem um déficit gigantesco como
não consegue olhar os desafios à frente. A expectativa de vida subiu
mais de 20 anos desde a década de 1960 e nas próximas décadas continuará
subindo. Além disso, a geração mais populosa está chegando aos 60 anos e
vai crescer a um ritmo quatro vezes maior do que o do resto da
população.
Segundo a OCDE, a população acima de 65 anos no Brasil aumentará
cinco vezes nas próximas décadas, saindo de 7,6% para 38% em 2050. O
nosso gasto já é muito elevado, para uma população relativamente jovem.
Segundo estudo do economista e coordenador de Previdência do Ipea,
Rogério Nagamine, com dados de 2010, o problema é crônico e vem de antes
do agravamento da crise. Nesse ano, em um levantamento com 86 países, o
Brasil ficou em 13º lugar com a maior despesa de Previdência em relação
ao PIB, mas ocupou o 57º no percentual da população acima de 65 anos. “O Brasil possui uma despesa com Previdência alta e acima do esperado
para sua estrutura demográfica e tende a aumentar com o rápido processo
de envelhecimento pelo qual o país está passando”, disse Nagamine.
O pior é que a ausência de idade mínima, que o governo Temer tenta
aprovar na reforma, tem beneficiado principalmente os mais ricos. De
acordo com o estudo “Os mitos Previdenciários do Brasil”, de Rogério
Nagamine, Graziela Ansiliero e Luiz Henrique Paiva, a média de idade de
aposentadoria dos trabalhadores de maior renda é de 54 anos, porque eles
conseguem se aposentar por tempo de contribuição. Já entre os que
ganham menos, a idade sobe para 63 anos, porque eles passam um grande
período da vida trabalhando sem carteira assinada. Estabelecer a idade
mínima afetará principalmente os mais ricos, não os mais pobres.
O mundo já olha para as tendências populacionais que vão agravar os
desafios da Previdência. O Brasil não consegue ainda entrar em um acordo
sobre os números. Os adversários da reforma negam a necessidade de
mudança e a existência do déficit. A crise Temer adiará inevitavelmente a
reforma, que se fosse aprovada como inicialmente pensada começaria a
ter efeitos no ano que vem.
Fonte: Coluna da Miriam Leitão, com Alvaro Gribel, de São Paulo
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