É
natural que criminosos sejam representados por advogados para seu
direito de defesa ser plenamente exercido.
A lei e a razão o determinam.
Por isso, o Estado fornece advocacia gratuita a quem não pode pagar e
por isso, também, profissionais e escritórios, querendo, atendem
necessitados de modo gratuito (pro bono) em contribuição à Justiça como valor social.
O que eu não consigo entender é a conduta dos padrinhos da bandidagem em tese e pro bono,
através de literatura jurídica e dos meios de comunicação social. Aí é
brabo!
Não abraçam um bandido específico, mas protegem o coletivo, seja
justificando a conduta criminosa, seja atacando os aparelhos policial e
judiciário, vale dizer, aqueles que reprimem, investigam, acusam e
julgam. Ensopam lenços retóricos ante um bandido morto e têm os
distantes do policial cuja vida se esvaiu no cumprimento do dever.
Nunca vi o
sujeito indefinido de quem falam com tanto afeto.
A cada crime cometido
por celerados que jamais poderiam andar soltos, eles mencionam esse
raríssimo personagem padrão.
Discorrem sobre ele com a intimidade de
quem certamente sabe o nome da sofrida mulher e dos infelizes, mas
diletos filhos. Descrevem sua situação social, os empregos que perdeu
por motivos fúteis, os maus tratos que a vida lhe impôs por culpa de
todos que estejam uma polegada acima de seus padrões de existência.
Apesar do abismo que separa esse sujeito dos bandidos que enchem as
páginas policiais, os tais rábulas pro bono o oferecem ao imaginário nacional como sendo o criminoso de referência. Lula pensa assim.
“Filho
doente, sem emprego e sem dinheiro para os remédios, como buscar aquilo
de que necessita?”, indagam como quem fala à dureza de corações
empedernidos.
Pois é, pode até ser que alguém tenha tido notícias, mas
eu jamais soube de assalto cujo produto seja contado em vidros de
antibiótico ou gramas de mortadela.
O crime que enche os noticiários,
que nos atormenta, é bem outro.
Seus autores não vão em busca de uma
necessidade premente.
Querem dinheiro, sexo, automóveis, a conta
bancária dos sequestrados, meios para comprar drogas. E, à menor
contrariedade, atiram para matar.
Os dois
sujeitos armados que me assaltaram tempos atrás não tinham jeito de quem
iria correndo ao supermercado adquirir gêneros para seus ninhos de amor
familiar.
Pergunto: as feras que volta e meia declaram guerra à
polícia, disparam contra as delegacias, queimam ônibus, atiram em
mulheres grávidas, cometem chacinas seriam imagem viva desses chefes de
família torturados ao limite de sua resistência moral pelas carências
dos entes queridos? Qual dos bandidos cujas ações enchem as páginas
policiais tem o perfil que os tais doutores, sem o refinamento de Mark
Twain, descrevem como se fossem inspirados na vida de Huckleberry Finn?
Sei que o
mais empedernido promotor e o mais insensível magistrado não
encarcerariam um miserável cuja situação e delito correspondam a essa
quase romanesca descrição.
Os bandidos que a sociedade quer ver jogando o
jogo da velha nos quadrinhos do xadrez são receptadores, quadrilheiros,
sequestradores, traficantes, pedófilos, estupradores, estelionatários,
assassinos, corruptores e seus fregueses instalados nos escritórios do
poder.
Processar com
rapidez, prender e manter presos os poucos que caem nas malhas da
polícia e da justiça – digo eu antes que os tais rábulas retornem com
seu mantra: não resolve o problema da criminalidade. Leram-me bem,
senhores? Não resolve!
Mas resolve o problema da criminalidade praticada
por esses específicos bandidos.
Já será um bom começo pagarem atrás dos
muros o mal que fizeram. Enquanto isso, cuide-se, também, das outras
muitas causas. Entre elas, aliás, a ideologização que, dando origem a
essa ladainha sentimental, se constitui em bom estímulo à tolerância
perante o crime e ao avanço da violência.
Ah, se os
verdadeiros criminosos fossem vistos como no Brasil os olhos da justiça
viram quem cantou hinos e rezou diante de quartel!
Percival Puggina (78) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org,
colunista de dezenas de jornais e sites no país.. Autor de Crônicas
contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A
Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia
Rio-Grandense de Letras.