Documento do diretório nacional do partido
lamenta não ter intervido nas cúpulas da PM, do Ministério Público e
mudado os currículos das academias militares
O documento “Resolução sobre conjuntura", aprovado pelo diretório do PT
no início da semana, é prova cabal da validade do provérbio “o papel
aceita tudo”. Escrito numa linguagem de militância revolucionária das
décadas de 60 e 70, o texto trata de um país imaginário chamado Brasil,
em que houve um “golpe”, desfechado pelo imperialismo internacional com
apoio da burguesia doméstica, “as classes dominantes", e pelos
“monopólios da informação”, diante do qual é preciso resistir.
Assim como a literatura de cordel tem uma linguagem própria —
guardadas as diferenças, a favor do cordel —, com este tipo de texto de
panfleto de doutrina acontece o mesmo. Mas chama a atenção que, no
documento, o PT assuma de forma escancarada o aparelhamento do Estado,
para colocá-lo a serviço de um projeto de poder nada democrático e
republicano.
Ao fazer autocrítica, o PT se penitencia por haver priorizado o
“pacto pluriclassista” na eleição de Lula — ele deseja um governo
uniclassista, só dos trabalhadores; impossível, se for pelo voto. E
lamenta, por outras palavras, ter sido ineficiente na infiltração nos
organismos de Estado.
Considera-se descuidado com as estruturas de mando da Polícia
Federal e do Ministério Público Federal, assim como por não ter
modificado “os currículos das academias militares”, nem promovido
“oficiais com compromisso democrático e nacionalista”. Tampouco
fortalecido “a ala mais avançada do Itamaraty”, e por não ter
redimensionado ‘‘sensivelmente a distribuição de verbas publicitárias
para os monopólios da comunicação”. (Desconhecem que é ínfima a parcela
desta publicidade na receita que financia o jornalismo profissional).
Não que tenha caído a máscara do partido; afinal a verdadeira face do
projeto lulopetista nunca esteve completamente oculta. Mas chega a ser
um registro histórico um documento em que o diretório nacional do
partido assume sua faceta — esta sim — golpista. Várias iniciativas,
desde o primeiro governo Lula, expuseram o real sentido do projeto
lulopetista. Um exemplo é a Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual
(Ancinav), esculpida no MinC de Gilberto Gil e Juca Ferreira com a
intenção de controlar o conteúdo do setor.
Diante da previsível grita, houve recuo. O mesmo aconteceu no projeto
do Conselho Federal dos Jornalistas, também com intenções
intervencionistas: patrulhar profissionais nas redações e puni-los com
base em algum “código de ética”.
Houve mais casos. Importa é entender, de uma vez por todas, que este é
um projeto que pretende instalar no Brasil um regime bolivariano. Não
conseguiu, nem conseguirá, diante da demonstração de solidez das
instituições republicanas. [o documento expelido pelo PT deixa claro que aquela ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA, COMUNISTA, GOLPISTA, ainda oferece perigo e deve ser declarada ilegal e combatida com rigor até sua extirpação total da política no Brasil.]
O PT deveria aproveitar que escancarou o projeto em documento, para
passar a defendê-lo abertamente e colocá-lo sob o teste das urnas. Só
assim terá alguma chance de se defender da acusação de ser o verdadeiro
golpista.
Fonte: Editorial - O Globo