Estado de S.Paulo
Quem se lembra de 20 governadores reagindo unidos a ataques de um presidente?
Quem planta chuva colhe tempestade, como diz um velho ditado que, hoje,
cabe perfeitamente no presidente Jair Bolsonaro. Pode ter havido, mas é
difícil lembrar se algum dia, em algum momento da história, 20
governadores se reuniram para reagir à chuva de ataques de um presidente
como uma tempestade em forma de carta aberta. Não é trivial, nem foram
poucos. [Vamos usar as razões do Ibaneis para estar fazendo oposição ao governo Bolsonaro - nada contra o Ibaneis, apenas foi escolhido como exemplo por ser um governador recordista, já que 'governa' o DF, cujo atendimento público de saúde obriga um cidadão com uma faca enfiada nas costas, a esperar mais de 40 horas, por atendimento para efetuar cirurgia de retirada da faca.
Por estar próxima à coluna, o atendimento exigia a participação de um neuro cirurgião - tem 28 na saúde pública do DF, mas não conseguiram, em mais de quarenta horas, localizar um.
Diante da necessidade de desviar o foco do desastre que sua gestão está realizando no DF - em todas as áreas, mas, as mais afetadas são pelar ordem: Saúde, Segurança e Educação - o governador aderiu ao despista de falar mal do presidente.]
Os líderes dessa reação foram eleitos na onda bolsonarista, como João
Doria (SP), Ibaneis (DF) e Wilson Witzel (RJ), mas agora exigem do
presidente da República algo que não faz parte da personalidade, da
cultura e dos costumes políticos dele: “Equilíbrio, sensatez e diálogo”. [convenhamos que um governador que ao saber da execução de um fugitivo - sem nenhuma condenação defintiva e absolvido de uma acusação de homícidio - diz: 'aconteceu o esperado', tem algo a explicar. Certo?]
Qual a última do Bolsonaro? Essa perguntinha ácida que não quer calar
virou uma constante no dia a dia de Brasília – e não só de Brasília.
Pois a última foi, simplesmente, jogar no colo da PM da Bahia, frisando
que é “do PT”, a queima de arquivo do capitão Adriano, aquela figura
sinistra que tanto fez que acabou sendo preso, expulso da PM no Rio e
finalmente morto numa emboscada policial na Bahia.
[o ex-capitão do Bope foi abatido por 70 policiais militares do estado da Bahia, governado pelo PT.
Aliás, abatido não é o termo certo e sim executado - a força executora era composta por 70 policiais militares do Bope baiano, supõe-se especializados e treinados, em uma área deserta, em que a PM poderia apenas cercar o fugitivo e aguardar que ele se rendesse.
Só que optou por uma ação terminativa, agindo de forma que seria adequada se o fugitivo estivesse em uma área que oferecesse condições de fuga e/ou com réfens.]
Para Bolsonaro, antes de dar uma nova “banana” para os jornalistas, um
cara com tal currículo em algum dia foi “herói”. E foi nessa condição
que ele foi homenageado três vezes pelo então deputado Jair Bolsonaro e
pelo então deputado estadual Flávio Bolsonaro, primogênito do atual
presidente.
Flávio homenageou o capitão Adriano duas vezes, uma delas com a medalha
Tiradentes, principal honraria da Assembleia do Rio. Em que ano foi
isso? Em 2005. E onde estava o “herói” Adriano naquele momento? Preso!
Era suspeito de ter matado um pobre e jovem guardador de carros que
tinha tido a coragem de denunciar achaques da turma de Adriano na PM do
Rio. Responda rapidamente: quem é mais herói, o pobre coitado que denunciou
abusos da polícia, ou o policial acusado de matá-lo torpemente? [o pobre coitado tem a seu favor o argumento de proceder da forma habitual que a quase totalidade dos guardadores de carros atuam = de forma educada, gentil, sem ameaças, sem nada que pareça extorsão, solicitam que os proprietários de veículos que estacionam em áreas públicas contribuam 'espontanemanete' com eles;
já o capitão, ACUSADO, SUSPEITO, foi absolvido em 2007 da acusação.
Quanto ao ex-capitaão ser condecorado, acusam o filho de Bolsonaro por ter indicado - indicação que é homologada pelo Conselho da comenda. Esquecem, ou fingem esquecer, que Zé Genoíno - ex-terrorista, ex-guerrilheiro, foi agraciado com a Medalha do Pacificador, a mais alta comenda concedida pelo Exército Brasileiro em tempos de paz.. Ninguém lembra desse absurdo, dessa imposição que fizeram ao EB.]
O atual presidente da República já deu sua resposta. Na época, em
sintonia com o filho, ele fez um discurso no Congresso Nacional
defendendo o crápula. Hoje, insiste em que, naquele momento, tratava-se
de um “herói”. Cá entre nós, o Brasil já teve heróis melhores, menos
sanguinários. Bem, essa história já é horrorosa por si só, inclusive porque o gabinete
de Flávio quebrou o galho de Adriano, quando ele caiu em desgraça,
contratando sua mãe e sua ex-mulher. Não satisfeito, o presidente
Bolsonaro resolveu tirar o corpo fora, passar a mão na cabeça do filho e
empurrar a culpa por uma eventual queima de arquivo para o colo de um
governador, que, não por acaso, é de oposição e do PT.
Responda rapidamente de novo: onde o capitão Adriano liderava a milícia
conhecida como “Escritório do Crime” e onde passou a vida inteira, no
Rio ou na Bahia? Onde ele virou PM, “herói” e foi preso e expulso da
corporação, no Rio ou na Bahia? Afinal, era um arquivo vivo no Rio ou na
Bahia? E quem tinha interesse em sumir com ele, a polícia e os
poderosos do Rio ou o PT da Bahia?
Assim, Bolsonaro transformou a questão numa chuva que virou tempestade
política. Até porque ele é reincidente. Já foi grosseiro e
preconceituoso ao dizer que “daqueles governadores de Paraíba (sic), o
pior é aquele do Maranhão (Flávio Dino, do PCdoB)". Depois chamou todos
os governadores para a briga quando lançou um desafio impossível, de
zerarem os impostos sobre combustíveis, e assim jogou os governadores
contra a opinião pública. E, por fim, excluiu os nove governadores da
Amazônia do Conselho da... Amazônia. [o presidente Bolsonaro fez o desafio, faltou aos governadores disposição, interesse, em aceitar e abrir mão da arrecadação.
O presidente não pode ser cobrado, malhado, por ter feito um desafio, que os desafiados optaram por não aceitar.
Cabia a eles provar, aceitando o desafio, eventual falsidade do repto.]
Na carta, os 20 governadores destacam que essas declarações e o
confronto constante “não contribuem para a evolução da democracia no
Brasil”. Muito difícil, por essas e outras, não concordar com eles.
Eliane Cantanhêde, colunista - O Estado de S. Paulo