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terça-feira, 4 de setembro de 2018

Esticando a corda

Perder a eleição não seria o pior cenário para o PT, que poderia compensar a perda com forte bancada no Congresso


Não foi surpresa a decisão pessoal do ex-presidente Lula de esticar a corda até onde for possível para manter sua candidatura à Presidência da República no centro do debate político. Lula está convencido de que quanto mais tempo conseguir fazer a disputa jurídica nos tribunais superiores, mais protagonizará a cena eleitoral, tornando secundária a transferência de votos para seu vice, Fernando Haddad.

Há quem veja nessa estratégia, que parece arriscada a muitos, a visão de longo prazo de Lula sobre sua própria liderança na esquerda brasileira. Perder a eleição não seria o pior cenário para o PT, que poderia compensar essa perda com a eleição de fortes bancadas no Congresso e no plano estadual, para comandar a oposição a um possível governo Bolsonaro.  Lula não deve ficar preso o tempo de sua pena, beneficiando-se da complacência de nossa legislação, e, com um pouco de sorte dele, ano que vem o Supremo Tribunal Federal (STF) mudará o entendimento sobre a prisão depois da condenação em segunda instância, e ele poderá comandar seu grupo de fora do poder, esticando o mais possível os recursos ao STJ e ao STF. [só que ano que vem o Brasil estará com novo presidente e os recursos do Lula serão tão inúteis quanto aquele papelucho expelido pelo tal comitê de direitos humanos da desmoralizada ONU.
Em tese, após cumprir um sexto da pena, o presidiário petista poderá ser solto; mas, antes que isso ocorra novas condenação cairão sobre o criminoso petista e novos sextos de penas terão que ser cumpridos.
E Bolsonaro não vai perder tempo e permitir que uma jararaca com a cabeça cortada, o corpo picado, atrapalhe seu primeiro mandato .]

Mesmo que venha a ser condenado em outros processos, o que é provável, terá os recursos infindáveis previstos na legislação para prosseguir sua luta política até que uma eventual anistia o libere. Para isso, precisará de uma forte presença no Congresso.  A possibilidade de seu avatar, Fernando Haddad, vir a ser competitivo a ponto de disputar o segundo turno é grande, mas não tão certa quanto os petistas mais militantes imaginam. Se as pesquisas depois das primeiras semanas de campanha eleitoral confirmarem a posição estável de Bolsonaro, mesmo com as críticas ácidas que vem recebendo, uma possibilidade é termos um segundo turno entre Bolsonaro e PT, ou Filipinas contra Venezuela, o que não é uma perspectiva animadora para o futuro do país.

O presidente filipino, Rodrigo Duterte, foi eleito com uma proposta de resolver um dos maiores problemas do país na bala, e tem cumprido a promessa: manda fuzilar os traficantes. Há poucos dias, disse que, enquanto houver mulheres bonitas, haverá estupros, outro dos problemas das Filipinas.  [o que importa é que Rodrigo Duterte foi eleito, está realizando um excelente mandato, com chances de reeleição e é um exemplo a ser seguido pelo presidente Jair Bolsonaro.] Sua fala implicitamente concorda com a agressão que o candidato brasileiro Jair Bolsonaro fez à deputada Maria do Rosário, a quem disse que não valeria a pena estuprá-la. Por isso, responde a um processo no Supremo Tribunal Federal.

Fernando Haddad seria o representante do PT bolivariano com cara de socialdemocrata, o seu oposto, com toda a tragédia econômica provocada pelos erros, omissões e corrupção dos governos petistas e promessa de crise social que estamos vendo na Venezuela de Chávez e Maduro. [quem votar em Haddad estará plantando a semente para que o Brasil se transforme em uma Venezuela; alguém é imbecil o bastante para querer isto?
Declarar em uma pesquisa que vota no PT é uma coisa; queremos ver é ter coragem para na solidão da urna conferir o voto que transformará o Brasil em uma Venezuela piorada.]
O socialismo do século XXI, louvado em prosa e verso até hoje pelo pensamento predominante no PT, seria uma perspectiva real diante de uma possível vitória de Haddad, que vem se mostrando de uma lealdade canina a Lula que pode ajudá-lo a ser ungido, mas também transformá-lo em um presidente fragilizado por sua própria base parlamentar, com o predomínio do lulismo a guiá-lo para um radicalismo tão perverso quanto o de Bolsonaro.

O PT já está demonstrando o desprezo pelas instituições democráticas, aproveitando-se das brechas legais para denunciar uma perseguição política que não existe. Depois da decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de flexibilizar a interpretação da legislação eleitoral, permitindo que o candidato a vice faça propaganda como se fosse o candidato efetivo, o PT foi além, mantendo no ar a propaganda com Lula como candidato a presidente, e decidiu esgotar o tempo legal para contestar na ONU a Justiça brasileira, reforçando a imagem de que Lula é um preso político.

Os ministros substitutos do TSE, que cuidam da propaganda oficial, têm a fama de serem duros ao fazerem cumprir a lei, e ontem mesmo um deles já obrigou o partido a retirar uma propaganda do ar que ainda mostrava Lula como o candidato à Presidência da República.  É possível que nos próximos dias as brechas na legislação sejam tampadas por outras decisões desse tipo, obrigando o partido a oficializar a substituição da candidatura de Lula. Ou, quem sabe, a assumir a atitude suicida de prejudicar a campanha presidencial, para tentar aumentar sua bancada no Congresso, armando-se para o confronto com o futuro presidente, seja ele quem for.

Merval Pereira - O Globo

 

segunda-feira, 23 de março de 2015

Crise institucional


O PT se vê cada vez mais distante da sociedade e políticos não quererão como aliada uma presidente que aparece como fraca

O país pode estar rumando para uma crise institucional. A velocidade dos acontecimentos políticos tem sido surpreendente. O governo dá mostras visíveis de perda de controle, sem que se saiba ao certo quem manda no país. Em linguagem hobbesiana: quem decide em última instância? 

Até um ministro, o da Educação, chega a ser demitido por um anúncio do presidente da Câmara dos Deputados, como se não coubesse à presidente da República essa decisão. O próprio ministro, em um tipo de jogada ensaiada, opta, com estardalhaço público, sair do governo como se esse fosse um barco naufragando. 

Estamos diante de uma situação completamente nova. O panelaço nem uma tradição nacional é. Importamos da Argentina. Tem, contudo, um profundo significado: as pessoas não mais querem escutar a presidente ou os seus mensageiros, no caso ministros. Não importa o que tenham a dizer. Não mais gozam de confiança e, neste sentido, nem mais merecem ser escutados. Medidas paliativas como a reforma política ou o projeto contra a corrupção nem dignos de atenção são. O mesmo já foi dito em 2013. 

As manifestações do dia 15 de março foram um marco nacional. Reuniram em torno de dois milhões de pessoas! A população nacional disse nitidamente “Fora Dilma” e “Fora PT”. O partido e os seus movimentos sociais perderam completamente a rua. Já tinham sido enxotados em 2013.  Mesmo assim, jogaram uma carta temerária, a de organizarem uma manifestação própria dois dias antes, na sexta-feira. Ainda vivem na ilusão de acreditarem em sua capacidade de mobilização. Ledo engano. Reuniram no máximo 150 mil pessoas e, ainda assim, com várias dentre elas pagas. O fracasso foi total. O contraste é gritante!

As manifestações de 2013 foram a expressão genérica e abstrata de uma revolta contra tudo o que está aí, concentrando-se, enquanto estopim, na questão da mobilidade urbana e no preço das passagens de ônibus. Agora, pelo contrário, há uma proposta positiva que aglutina: é exigida a saída de Dilma do governo, assim como do PT.  O isolamento da presidente é manifesto. Mais do que isto, ele revela que ela está perdendo progressivamente as condições de exercício do poder. O PT se vê, por sua vez, cada vez mais distante da sociedade, e os políticos não quererão como aliada uma presidente que aparece como fraca. 

O Congresso, ele também, tenderá ainda mais a não seguir as orientações governamentais, devolvendo medidas provisórias, “negociando” projetos de lei e tornando a vida da presidente ainda mais difícil. O ajuste fiscal pode ser, nesta perspectiva, prejudicado. A lógica política primaria sobre todo o resto.  Aqui, no entanto, pode surgir um elemento que sinalize republicanamente para o país impedir sua queda na anomia, podendo se tornar um pária das finanças internacionais. O PMDB está acenando com apoio às medidas de ajuste fiscal, no que deveria ser seguido por outros partidos, seja os de oposição, seja o próprio PT. O que está em jogo é o país, enquanto bem coletivo, situado acima dos bens partidários particulares. 

O PSDB hesita em seguir nesta direção, embora reconheça a importância de uma completa reformulação das condições econômicas. Coloca-se em uma posição de recolher os dividendos políticos do que considera, com razão, como um estelionato eleitoral. A presidente e o PT disseram uma coisa antes da eleição, acusando o seu adversário de pretender fazer tudo aquilo que estão, agora, efetivamente fazendo. A mentira foi o instrumento político da vitória, a descoberta da verdade a expressão de profunda crise governamental. 

A presidente da República não sabe o que fazer. Medidas políticas são requentadas como se as ruas pudessem ser assim atendidas. Inimigos imaginários são culpados pela crise atual, como se fossem o mercado externo e a seca os responsáveis dos erros governamentais. A realidade cobra o seu preço. Os erros nem são reconhecidos, de modo que toda interlocução com a sociedade fica obstaculizada. Um país cristão poderia se reconhecer em quem erra, se arrepende e pede perdão. Certamente não se reconhecerá na arrogância. 

O PT é uma nave sem rumo. Não defende as medidas de ajuste econômico por as considerarem como “neoliberal”, como se fosse “neoliberal” o bom senso na administração das contas públicas. Imaginem se um(a) chefe de família pudesse gastar indiscriminadamente sem atentar para o orçamento doméstico! Teria de cortar gastos se quisesse sobreviver. Seria, por isto, “neoliberal”

O partido, porém, está radicalizando. O campo e a cidade já se encontram em tensão. A ofensiva do MST e de seu braço urbano, os sem-teto, está claramente delineada. Diga-se, a seu favor, que acreditaram no discurso eleitoral. São eles, porém, os bolivarianos do Brasil, pretendendo implantar o “socialismo do século XXI”. Embora não contem com o apoio da população, não deixam de fazer um jogo extremamente perigoso.  Invasões e depredações no campo, ocupações de rodovias e ruas das principais cidades já estão se tornando “normais”, em uma “anormalidade” que pode vir a ameaçar as instituições. Os que os estão apoiando e insuflando jogam gasolina no fogo. Não reclamem depois das consequências. 

Não havendo uma recuperação da economia, uma recomposição governamental de sua base parlamentar, um afastamento da imagem da presidente do esquema do petrolão e um arrefecimento de ânimos dos movimentos sociais, [todas as condições destacadas podem ser alcançadas pela ocorrência de um único evento: a saída da presidente.]  poderemos viver uma crise institucional. Uma crise institucional significa a falência da capacidade de a presidente da República governar o país, havendo paralisia decisória e comprometimento do funcionamento de nossas instituições democráticas. 

Sem condições, a presidente Dilma, nesse cenário, poderá cair. A sua continuidade no cargo, em determinado momento, poderá vir a ser interpretada por congressistas e população em geral como uma “ameaça existencial” à vida republicana. Trata-se de um cenário extremo, porém não descartável, devido à rapidez com que o cenário está se deteriorando no país.

Por: Denis Lerrer Rosenfield é professor de Filosofia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul - O Globo