O grande risco com o Lula não é o radicalismo. Ele nunca foi radical,
tanto que, como disse em entrevista na última semana: “Esse mercado
injusto que nunca me agradeceu com o tanto que ganhou.” Deveria também
ter cobrado gratidão das empresas em geral, porque nos 13 anos do
governo petista os benefícios para o capital foram de 3% do PIB para
4,5% ao ano, um aumento, ao PIB de 2015, de R$ 90 bilhões.
Na entrevista, em que convidou um grupo de jornalistas para um café
da manhã, o ex-presidente disse: “Eu não tenho cara de radical, nem o
radicalismo fica bem em mim.” De fato. Não é esse o problema. O risco
Lula é institucional. Já condenado em primeira instância, réu em mais 5
processos, denunciado em outros, sua estratégia é a fuga para o
Planalto, único local onde poderá escapar de todas as ações, todas as
investigações, onde terá autoridade sobre a Polícia Federal, e poderá
minar o poder do Ministério Público. O Brasil se transformará num país
em que a impunidade será coroada se o réu chegar à Presidência da
República.
Ele tem usado a candidatura como defesa nas ações a que responde na
Justiça. Provavelmente calcula que quanto maiores forem suas intenções
de voto mais inatingível ficará, mais poderá usar a versão de que é um
perseguido político. Contudo, a Justiça terá que decidir diante das provas e dos autos e
agora a palavra está com o TRF-4. Mesmo na hipótese de ser absolvido, há
outros processos contra ele. Lula se define como uma pessoa “mais
conhecida que uma nota de R$ 10”, e tenta usar essa notoriedade para se
blindar. Vai se aproveitar do tempo jurídico e das muitas possibilidades
recursais em seu favor. “Se eles cometerem a barbaridade jurídica de me
condenar tenho ‘n’ recursos para fazer, e vou continuar viajando.”
A Justiça Eleitoral tem aceitado, inexplicavelmente inerte, à
campanha presidencial antes da hora. Também nada faz contra a descarada
campanha de Jair Bolsonaro. Isso cria a distorção de punir quem cumpre a
lei, e favorecer quem a ofende. “O mundo é dos espertos”, disse
recentemente o técnico Renato Gaúcho, do Grêmio, ao ser apanhado
espionando adversários com drones. A tese do técnico tem se confirmado
porque as intenções de voto colocam Lula e Bolsonaro nos primeiros
lugares. Pelo visto, bobo é quem cumpre a lei eleitoral.
Ao dar os primeiros toques do que seria seu programa, ele, de novo,
recorre à demagogia. “Por que o povo pobre tem que pagar mais imposto de
renda do que o povo rico. Por que o rentismo não paga imposto de renda
sobre o que ele ganha? Por que a gente não pode começar a pensar em uma
política tributária em que as pessoas mais humildes paguem menos e os
mais aquinhoados paguem mais? Por que não se coloca em prática a questão
do imposto sobre as grandes fortunas? Parece radicalidade, mas não é.”
Faltou uma pergunta: por que em 13 anos, quatro meses e 11 dias de
governo, o PT não teve tempo de fazer o que ele propõe? Fez o oposto. As
deduções de imposto para os grandes grupos e setores empresariais, as
transferências através de empréstimo subsidiado, a elevação da dívida
pública para aumentar em meio trilhão a capacidade de o BNDES dar
crédito barato para grandes empresas, como JBS, grupo X, Odebrecht e
outros, foram as grandes marcas dos governos petistas na economia. O
programa econômico executado por ele e sua sucessora foi regressivo.
Gastou-se mais dinheiro público com os muito ricos.
Lula prepara os truques com os quais vai responder às suas
incoerências. Culpou o PT pela foto que tirou com Maluf. “Quando Haddad
foi candidato a prefeito em 2012 eu estava com câncer, inchado e foram
me tirar de casa para uma fotografia com Maluf.”
Ele se comporta como se o país tivesse amnésia coletiva. Propôs mudar
tudo através de uma Constituinte, acusando a “elite” de ter feito uma
nova Constituição desde 1988. O PT governou em quase metade desse tempo.
Critica a atual gestão da Petrobras como se não tivesse acontecido nas
gestões petistas o maior escândalo de corrupção da história do país. Há todos os disfarces e truques de sempre, a demagogia costumeira,
mas estes não são os maiores riscos, e sim um fato de que ele tem contas
a acertar com a Justiça e tenta, como defesa, a fuga para a Presidência
da República.
Coluna da Míriam Leitão - O Globo
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terça-feira, 26 de dezembro de 2017
Fuga para o Planalto
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