A sociedade, por meio do Congresso, precisa se debruçar seriamente sobre diversas distorções do atual sistema. O momento de arejar a política é agora
A falta da chamada “vontade
política” de muitos membros do Congresso Nacional tem servido há
décadas como pretexto para o abandono de discussões que levem à
aprovação de uma ampla reforma do sistema político e eleitoral, uma das
mais prementes e necessárias para o País. O discurso prevalente diz, não
sem alguma dose de razão, que os parlamentares jamais aprovariam
mudanças profundas no sistema por meio do qual têm sido eleitos
sucessivamente. Ou seja, não mudariam aquilo que os beneficia.
Recentemente,
houve significativos, porém pontuais, avanços no combate ao anacronismo
desse sistema, como a proibição das doações para campanhas eleitorais
feitas por pessoas jurídicas, determinada pelo Supremo Tribunal Federal
(STF) em setembro de 2015, a imposição da cláusula de desempenho,
conhecida como “cláusula de barreira”, e o fim das coligações
partidárias nas eleições proporcionais a partir de 2020, estas últimas
introduzidas pela Emenda Constitucional (EC) 97, promulgada em outubro
de 2017.
Sem dúvida, trata-se de medidas importantes para o aprimoramento do sistema político e eleitoral e, consequentemente, para o fortalecimento da democracia representativa que a Constituição consagra. No entanto, ainda há muito trabalho a ser feito e a nova legislatura não poderia ser mais talhada para lidar com esse desafio. As eleições de outubro de 2018 foram marcadas pelo repúdio ao que se convencionou chamar de “velha política”. Em boa medida, a ojeriza ao que esta expressão representa extrapolou para o repúdio à própria política como o meio mais apto à mediação dos múltiplos interesses sociais numa sociedade civilizada.
O repúdio à ordem política foi concentrado na procura pelos eleitores do “elemento novo”, seja este a personificação de lideranças tidas como dissociadas dessa ordem, seja a formulação de novos métodos de exercer os mandatos eletivos. Com a devida prudência, pode-se dizer que a nova composição do Congresso Nacional encarna o espírito de mudança que animou grande parte dos 147 milhões de brasileiros que foram às urnas no ano passado. Levantamento feito pelo Estado mostrou que a taxa de renovação das bancadas no Congresso chegou até a 90%, como foi o caso da bancada de Mato Grosso na Câmara e no Senado. Dos dez parlamentares do Estado, apenas o deputado Carlos Bezerra (MDB) foi reeleito. Na Região Sudeste, que concentra os maiores colégios eleitorais do País, a taxa de renovação variou entre 51% e 89%.
A maior parte desses novos congressistas não foi eleita de acordo com pressupostos do sistema, ao contrário. Se a manifestação da sociedade foi acertada ou não, o tempo e a atuação dos novos deputados e senadores dirão. Fato é que os novos membros do Congresso foram eleitos a partir de um contato mais estreito com seus eleitores, por diversos meios. Eles não têm compromisso com as velhas práticas, haja vista que se elegeram fora do sistema vigente, marcado pela mixórdia ideológica e por acordos nem sempre pautados por valores republicanos. Não seria este, então, o momento ideal para fazer a tão sonhada reforma política? Afinal, a maioria do Congresso já não tem compromissos com as fórmulas viciadas que condenavam o Legislativo à mesmice.
A sociedade, por meio de seus representantes, precisa se debruçar seriamente sobre questões como voto distrital, fim do Fundo Partidário e do famigerado Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), problemas de representação e outras distorções do sistema político atual. Não menos importante é a discussão sobre o calendário eleitoral. A separação das eleições para o Executivo e para o Legislativo pode ajudar a pôr fim, ou ao menos reduzir, a fragmentação política que ou trava o governo ou o submete a barganhas que nem sempre têm o interesse público como norte. A eleição simultânea do presidente da República e do Congresso, afinal, só faz sentido no regime parlamentar, no qual todo o governo sai do corpo legislativo. No presidencialismo, só se obtém alguma estabilidade com a eleição do Congresso após a escolha do presidente da República.
O momento de o Congresso discutir a fundo estas e outras medidas que poderão arejar a política é agora.
Opinião -- O Estado de S. Paulo
Sem dúvida, trata-se de medidas importantes para o aprimoramento do sistema político e eleitoral e, consequentemente, para o fortalecimento da democracia representativa que a Constituição consagra. No entanto, ainda há muito trabalho a ser feito e a nova legislatura não poderia ser mais talhada para lidar com esse desafio. As eleições de outubro de 2018 foram marcadas pelo repúdio ao que se convencionou chamar de “velha política”. Em boa medida, a ojeriza ao que esta expressão representa extrapolou para o repúdio à própria política como o meio mais apto à mediação dos múltiplos interesses sociais numa sociedade civilizada.
O repúdio à ordem política foi concentrado na procura pelos eleitores do “elemento novo”, seja este a personificação de lideranças tidas como dissociadas dessa ordem, seja a formulação de novos métodos de exercer os mandatos eletivos. Com a devida prudência, pode-se dizer que a nova composição do Congresso Nacional encarna o espírito de mudança que animou grande parte dos 147 milhões de brasileiros que foram às urnas no ano passado. Levantamento feito pelo Estado mostrou que a taxa de renovação das bancadas no Congresso chegou até a 90%, como foi o caso da bancada de Mato Grosso na Câmara e no Senado. Dos dez parlamentares do Estado, apenas o deputado Carlos Bezerra (MDB) foi reeleito. Na Região Sudeste, que concentra os maiores colégios eleitorais do País, a taxa de renovação variou entre 51% e 89%.
A maior parte desses novos congressistas não foi eleita de acordo com pressupostos do sistema, ao contrário. Se a manifestação da sociedade foi acertada ou não, o tempo e a atuação dos novos deputados e senadores dirão. Fato é que os novos membros do Congresso foram eleitos a partir de um contato mais estreito com seus eleitores, por diversos meios. Eles não têm compromisso com as velhas práticas, haja vista que se elegeram fora do sistema vigente, marcado pela mixórdia ideológica e por acordos nem sempre pautados por valores republicanos. Não seria este, então, o momento ideal para fazer a tão sonhada reforma política? Afinal, a maioria do Congresso já não tem compromissos com as fórmulas viciadas que condenavam o Legislativo à mesmice.
A sociedade, por meio de seus representantes, precisa se debruçar seriamente sobre questões como voto distrital, fim do Fundo Partidário e do famigerado Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), problemas de representação e outras distorções do sistema político atual. Não menos importante é a discussão sobre o calendário eleitoral. A separação das eleições para o Executivo e para o Legislativo pode ajudar a pôr fim, ou ao menos reduzir, a fragmentação política que ou trava o governo ou o submete a barganhas que nem sempre têm o interesse público como norte. A eleição simultânea do presidente da República e do Congresso, afinal, só faz sentido no regime parlamentar, no qual todo o governo sai do corpo legislativo. No presidencialismo, só se obtém alguma estabilidade com a eleição do Congresso após a escolha do presidente da República.
O momento de o Congresso discutir a fundo estas e outras medidas que poderão arejar a política é agora.
Opinião -- O Estado de S. Paulo