No governo, Moro prossegue na transgressão às normas judiciais
[Moro erra quando fica dando explicações a qualquer um; erra quando vai ao Congresso, voluntariamente, fornecer explicações - deveria comparecer só quando convocado e por autoridades com a devida competência.
Tem a seu favor um FATO inafastável: a Constituição Federal, a Carta Magna, a Lei Maior é clara quando decreta a inadmissibilidade de provas ilícitas no processo.
As provas são ilícitas, visto que são produto de furto, de crime. Essa procedência nem o intercePTação contesta.
Acabou. Nada mais tem Sergio Moro a explicar.
Não está no processo, não existe no mundo.
Explicar o que não existe? Só mesmo no Brasil.
Como dado secundário, mas, também importante, não houve cadeia de custódia o que impede a garantia de autenticidade.]
Em menos de um mês, Sergio Moro já recorre à terceira linha defensiva,
na confrontação com as revelações do The Intercept Brasil por seu site e
pela imprensa. A alegação de desimportância e normalidade das mensagens
expostas mais confirmou sua conduta desregrada do que o defendeu. Logo depois, “Não reconheço toda a autenticidade das frases” foi uma
dubiedade necessária, mas invalidou a intenção de desacreditar as
conversas. Agora, em audiência na Câmara, Sergio Moro apelou para a
cansada evasão político-sentimental: é “vítima de revanchismo”. De quem?
Dos que difundem as mensagens, claro. Da Folha, do jornal O Globo e da
TV Globo, do Estado de S. Paulo, da Veja, dos que por quase cinco anos o
trataram como o herói perfeito, intocável e eleitoral? Não há motivo para revanche nessa relação de gratidões mútuas, sem
ressentimentos. A Lava Jato, seus métodos e suas consequências não
seriam como foram, e são, sem as contribuições da imprensa e parte das
TVs, em projeção e em tolerância. Ainda agora, as revelações do Intercept Brasil associadas à imprensa são
publicadas, na maioria das vezes, de maneira que nega revanchismo. É
comum terem jeito de mera obrigação. O que, mesmo sem tal motivo,
protege Moro das proporções de fato merecidas pelo escândalo de sua
ação.
As conversas não surpreendem quem teve liberdade crítica na observação a
Moro, aos procuradores e delegados da Lava Jato. Mas é espantoso, isso
é, que Moro prossiga na transgressão às normas judiciais, a que dizia
estar dedicado. Espantoso e provado. Bolsonaro deu ordem a Moro de investigar todos os partidos. Os traços de
Estado policial nessa ordem —percepção do repórter exemplar que é
Rubens Valente, na Folha de 5/6— começam, porém, em outra irregularidade
grave: a ordem de Bolsonaro seguiu-se ao recebimento de cópia, entregue
por Moro, da investigação sobre os “laranjas” do PSL.
Moro transgrediu o segredo de Justiça aplicado ao inquérito. Com a mesma
conduta de infidelidade judicial, o mesmo método de ação subterrânea, o
mesmo ânimo transgressor que as mensagens comprovam. Várias vezes indagado na Câmara a respeito de investigações contra o
jornalista Glenn Greenwald, do Intercept Brasil, Moro teve duas reações:
ou não respondeu, ou disse que sua relação com a Polícia Federal é
apenas a de lhe proporcionar condições de trabalho. Não tinha a
resposta, pois.
Não é verdade. Além do notório acompanhamento que faz da atividade da
PF, o que Moro entregou a Bolsonaro foi um relato sigiloso de que tinha
conhecimento, assim como das investigações da PF para a Justiça
Eleitoral. Sergio Moro pode seguir na escalada de escapismos. Mas não detêm
impulsos transgressores nem restauram sua imagem fantasiosa. Resta-lhe
satisfazer-se com os serviços que prestou e tentar, com eles, a
retribuição de uma vaga no Supremo.
O autor
Os 25 anos do Plano Real motivaram numerosas reportagens e
considerações. Não faltaram autores para entrevistas e fotografias. Quem
menos foi realçado —e mesmo citado— e não se ofereceu para colher
gloríolas foi o autor verdadeiro do Plano Real. Uma praxe brasileira. Itamar Franco demitiu três ministros da Fazenda que não conseguiram
atender, no prazo desejado, à sua exigência obsessiva de um plano
anti-inflação. Fernando Henrique assumiu levando o compromisso de André
Lara Resende, um tanto a contragosto: entregaria um plano em dois meses e
cairia fora.
Pérsio Arida, hoje direitista mal disfarçado, foi o principal
coadjuvante de André, antes companheiros na idealização do Plano Cruzado
no governo Sarney. As reuniões para o Real, na casa do professor Hélio
Jaguaribe, então sogro de André, contaram com poucos mais, presenças
irregulares para elaboração de dados setoriais e outros pormenores. O Plano foi entregue no prazo. Fernando Henrique o reteve quatro meses,
enganando Itamar Franco, com o pretexto de atraso, por conveniência de
sua ansiada candidatura à Presidência. A criatividade e o talento amplo
de André Lara Resende não poderiam estar dispensados neste país de
tantos oportunistas e tão menos cabeças relevantemente originais.