Míriam Leitão
O retrato eleitoral e a economia
O país está a dez meses e 18 dias do primeiro turno das eleições, o centro da preocupação dos brasileiros deslocou-se da pandemia para a economia, e o presidente Bolsonaro perdeu apoio até entre os que votaram nele. A economia dificilmente virá em socorro de Bolsonaro, porque as projeções mostram que em 2022 haverá um declínio do ritmo de crescimento, chegando ao negativo no terceiro e quarto trimestres. O desconforto econômico não desaparecerá porque nada indica uma mudança para melhor na conjuntura.
O ex-presidente Lula cresceu mesmo em silêncio, mas ele terá que se expor mais. Nos últimos dias, o PT fez nota cumprimentando Daniel Ortega, ditador da Nicarágua, por “ganhar” uma eleição fraudada, em que ele prendeu sete concorrentes e na qual a abstenção foi de 80%. Depois o PT voltou atrás, desautorizou a nota, mas não renegou seu conteúdo. O PT insiste em defender ditadores latinos.
O ex-juiz Sergio Moro apareceu em terceira posição na pesquisa da Genial/Quaest com 8%. Ele irá adiante? [lembramos que antes de ser candidato a uma possível futura candidatura à presidente da República, o ex-juiz já se dispõe a ser um ex-candidato a ex-candidato àquela candidatura, visto que o ex-tudo, já se dispõe a ser candidato a candidato a senador da República.] A corrupção perdeu espaço na lista de preocupações de brasileiros. Agora só 9% apontam a corrupção como sendo o principal problema. A economia está em primeiro para 48% e a pandemia, que já foi 41%, caiu para 17%. [se o maior ladrão, o maior corrupto do Brasil teve suas condenações anuladas por decisão do STF, só resta ao povo brasileiros envidar esforços para a recuperação da economia.] Moro tentou fazer um discurso para além do tema que o tornou conhecido. Não foi muito convincente. O PSDB ainda discute suas prévias, mas nem João Dória nem Eduardo Leite têm pontuação importante. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, não é conhecido, mas também não demonstra força neste grid de largada.
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Bolsonaro promoveu aglomerações e combateu medidas de proteção para que houvesse uma rápida contaminação que, no cálculo dele, provocaria a imunidade de rebanho. E então a economia poderia voltar a crescer. Só a vacinação conseguiu reduzir a pandemia. Mas agora que está caindo o número de casos e de mortes, a economia não está melhorando. Outros fatores a derrubaram.
O terceiro trimestre que ficou para trás pode ter tido PIB negativo. Nos últimos dias saíram os dados da produção industrial, vendas de varejo e serviços de setembro. Tudo no vermelho. E olha que estamos no ano que terminará em uma alta estatística no PIB. A inflação disparou, chegou a dois dígitos, e encolheu a atividade. O desemprego caiu no segundo semestre, mas ele sempre cai no segundo semestre. É sazonal. Não chega a dar qualquer alívio ter 13 milhões, em vez de 14 milhões, de pessoas desempregadas.
A questão é: a economia virá em socorro de Bolsonaro? As projeções dos economistas dizem que não. O Itaú prevê que o primeiro trimestre terá 1,2% de alta em relação ao primeiro trimestre de 2021. No segundo, a mesma comparação contra igual trimestre do ano anterior será de 0,3% positivo. No terceiro, auge da campanha, será negativo, -1,1%. E no quarto, -2,5%. Vários bancos e consultorias marcam o mesmo movimento: o ano começa com algum crescimento e depois despenca e vai para o negativo. E dentro da economia a maior preocupação do eleitor é com o crescimento.
Não está fácil para ninguém. Moro terá que ir além da sua bolha, mas parece inconsistente quando fala de economia ou da questão social. Sua rejeição só não é maior do que a de Bolsonaro. O PSDB perdeu um pouco mais de identidade nessa semana em que tantos tucanos votaram a favor da PEC do calote e do fura-teto.
O aumento da fome é a maior preocupação social. O novo programa do governo vai cortar pelo menos 20 milhões de famílias que atualmente recebem o auxílio emergencial. Lula tem forte recall positivo quando o assunto é combate à pobreza. Nos próximos meses ele terá que sair de casa e se expor. A intenção de voto em Lula na espontânea saiu de 22% para 29% em um mês. E na estimulada ele tem 46%. Ainda é apenas um retrato, mas é bem favorável ao ex-presidente.
Míriam Leitão - Com Alvaro Gribel, de São Paulo, O Globo