Teatrinho do Pró-Brasil revela apenas um governo desorientado
Ministro poderá ser descartado com a mesma argumentação usada contra o ex-juiz
Fica combinado que “o homem que decide a economia” no Brasil é Paulo
Guedes. Afinal, Sergio Moro tinha carta branca e a política do toma lá
dá cá com o centrão era coisa do passado. Cartas brancas não existem, e
as tais bancadas temáticas que substituiriam as negociações com os
partidos eram um delírio. Assustado com a ruína de seu governo,
Bolsonaro bateu à porta do centrão. Repete Dilma Rousseff e Fernando
Collor. A fé de Bolsonaro em fantasias é inesgotável. Pena que a capacidade de
Paulo Guedes de criar debates inconsequentes seja incontrolável. Diante
de uma epidemia, de uma recessão e do teatrinho do lançamento do
Pró-Brasil, Paulo Guedes resolveu encrencar com os servidores: “Precisamos também que o funcionalismo público mostre que está com o
Brasil, que vai fazer um sacrifício pelo Brasil, não vai ficar em casa
trancado com geladeira cheia e assistindo à crise enquanto milhões de
brasileiros estão perdendo emprego.”
Boa ideia. Que tal um programa de sacrifícios gradativos, começando
pelos magistrado e procuradores que embolsam acima de R$ 30 mil por mês?
O general da reserva Augusto Heleno já disse que tinha vergonha do seu
salário de R$ 19 mil líquidos.
Guedes tomou uma bolada nas costas e partiu do oficialismo a pecha de
que ele é um “inimigo dos pobres”. Teria surgido até uma banda
“desenvolvimentista” no Planalto. Isso é falso por três razões.
Primeiro, porque o Pró-Brasil é apenas teatralista, como o foram seu pai
— o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) — e seu avô, o 2º Plano
Nacional de Desenvolvimento (PND).
Também porque esse desenvolvimentismo seria encarnado pelo ministro
Rogério Marinho. Como secretário para Previdência e Trabalho de Guedes, o
doutor teve a ideia de taxar os desempregados que recebem um seguro do
governo. Justificando a tunga, disse que com isso o desempregado
continuaria na Previdência Social. Só não explicou por que a medida
seria compulsória. Se fosse voluntária, tudo bem.
Finalmente, porque o teatrinho do Pró-Brasil nunca foi coisa nenhuma.
Revela apenas um governo desorientado. Quando Bolsonaro diz que Paulo
Guedes é “o homem que decide a economia”, isso significa que, quando for
o caso, poderá ser descartado, com a mesma argumentação usada para
defenestrar Sergio Moro.
Até o mês passado Paulo Guedes queria reformar a economia brasileira com
40 milhões de invisíveis e 11 milhões de desempregados. Na
segunda-feira ele reafirmou a vitalidade de seu projeto e encrencou com a
geladeira dos servidores.
Na recessão americana de 1929 o secretário do Tesouro, Andrew Mellon,
também viu um renascimento a partir da ruína e propôs ao presidente
Herbert Hoover: “Liquide os sindicatos, liquide o papelório, liquide os
fazendeiros, liquide o mercado imobiliário. Isso purificará a podridão
do sistema. (...) As pessoas trabalharão mais e levarão uma vida com
mais moral”. Felizmente, Hoover não o ouviu. Em 1933, Franklin Roosevelt assumiu a Presidência, olhou para o andar de baixo e mudou a cara dos Estados Unidos.
Em tempo, o andar de cima americano nada tem a ver com o de Pindorama:
Andrew Mellon doou ao povo o prédio da National Gallery de Washington e
mais de mil peças de sua coleção. Coisa de dezenas de bilhões de dólares
em dinheiro de hoje.