FERNANDO HENRIQUE lembra que já derrotou Lula da Silva duas
vezes em eleições presidenciais e diz que derrotaria de novo se a idade
avalizasse a empreitada. Acrescenta, como fez na convenção do PSDB no
sábado 9, que preferiria “derrotá-lo a vê-lo preso”. Disse isso quatro dias depois de o juiz Sergio Moro cometer a
imprudência de pedir ao presidente Michel Temer que usasse de sua
influência sobre o Supremo Tribunal Federal para ajudar na manutenção da
regra que institui a prisão de réus condenados em segunda instância da
Justiça.
Nenhum dos dois pode ser apontado como defensor do
ex-presidente petista; ambos se notabilizam por observar com bom-senso
os limites de suas funções. No caso de FH, como presidente e, depois, na
condição de ex. Moro abandonou a habitual moderação para escorregar na
sugestão de interferência do Poder Executivo em decisões do Judiciário.
Inteligentes e bem providos de discernimento, o juiz e o
sociólogo ex-presidente ainda assim saíram do centro. Ou melhor, do
sério. Caíram os dois na armadilha de Lula, cujo descaramento realmente
dá nos nervos. A arapuca consiste em atrair os incautos a adotar sua
lógica segundo a qual regras legais podem e devem ser adaptadas a
circunstâncias político-ambientais a fim de favorecê-lo.
Os personagens aqui escolhidos para representar posições
recorrentes na sociedade adaptaram-se ao ambiente do vale-qualquer-coisa
diante da opinião do público captada por pesquisas. Sergio Moro
embalado no apoio popular à Lava-Jato e Fernando Henrique referido em
dois pilares: a posição de Lula em primeiro lugar nas preferências
eleitorais é um; o outro, a impossibilidade de “brigar” com a Justiça
antes da coisa julgada, no intuito de preservar as aparências de
isenção.
Um gesto aparentemente esperto. No entanto, quando examinado
de perto, é legal e eticamente questionável, para não dizer, e já
dizendo, equivocado. A despeito da livre manifestação de preferências, a
nenhum cidadão é dada a prerrogativa de “preferir” isso ou aquilo no
tocante a sentenças judiciais. A questão central a ser levada em conta é o cumprimento da
lei, que, no caso de Lula, remete a uma condenação já determinada e seis
ações em que figura como réu pelo exercício de corrupção e várias
outras cositas más, como lavagem de dinheiro e organização criminosa.
Há um crucial encontro com a Justiça marcado para 24 de
janeiro, quando o tribunal de segunda instância confirmará ou não a
sentença de Moro sobre o caso do apartamento no Guarujá. Se condenado,
Lula ficará fora da eleição e poderá ser preso. Nenhum ineditismo em
relação a políticos; vários cumprem penas e prisão preventiva. Não seria a ele dado o privilégio, como parecem sugerir
correligionários e adversários, de submeter a legalidade dos fatos à
versão antecipada das pesquisas de opinião sobre as próximas eleições.
Dora Kramer - Publicado em VEJA de 20 de dezembro de 2017, edição nº 2561
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sexta-feira, 22 de dezembro de 2017
Armadilha inconstitucional
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