O problema da oposição é a impossibilidade política de protestar contra o aumento do socorro estatal aos pobres, que estão mais empobrecidos
O PT de Lula amanhece ainda sem saber como reagir ao novo movimento de Jair Bolsonaro e de seus aliados do Centrão: aumentar de R$ 400 para R$ 600 por mês o socorro financeiro estatal a 17 milhões de eleitores. Em tese, esse aumento do Auxílio Brasil, versão bolsonarista do Bolsa Família, é questionável nos tribunais se considerados os limites impostos pela legislação ao assistencialismo governamental em plena temporada eleitoral. [aos milhões de famintos não interessa se pode ser questionado ou não, o que eles querem e precisam é receber e logo - vão lembrar dos que de alguma forma retardarem.]
O problema de Lula e dos demais adversários de Bolsonaro é a impossibilidade política de protestar contra o aumento do auxílio estatal a um segmento expressivo do eleitorado. São quase duas dezenas de milhões de pessoas inscritas no cadastro assistencial do governo. Já eram pobres e ficaram ainda mais empobrecidos com a corrosão inflacionária, persistente e disseminada na economia nos últimos dois anos. A Fundação Getulio Vargas estima que sete milhões de novos pobres surgiram no ano passado.
Na origem das dificuldades do PT de Lula, líder da oposição no Congresso, está o fato de que não apresentou ou promoveu projeto alternativo e consistente para mitigar o impacto da crise econômica no estrato mais pobre do eleitorado. Sem iniciativa parlamentar robusta, produto de reflexão organizada, restou ao partido e ao seu candidato a aposta na definição do voto a partir do olhar no retrovisor, com eleitores contrapondo a crise atual à memória do ciclo de bonança que permitiu ao PT vencer três eleições na sequência do primeiro mandato de Lula (2002-2006).
Deu certo, por enquanto. É o que informam pesquisas como a da FSB para o banco BTG, divulgada ontem.
Lula se mantém estável na liderança entre eleitores cuja renda familiar vai até um salário mínimo (R$ 1.212,00 mensais). Nesse segmento ostenta uma extraordinária vantagem de 48 pontos percentuais em relação a Bolsonaro.
A distância continua larga, embora menor (32 pontos) entre os que ganham de um até dois salários mínimos.
A partir daí, inverte-se o quadro: Bolsonaro lidera (seis pontos) na faixa de dois a cinco salários mínimos e acima desse nível, dispara (27 pontos de vantagem). [nos menores valores qualquer acréscimo é mais sentido positivamente, e mais acréscimos surgirão nos menores salários, já que reduzir a fome é o ponto primeiro do programa de governo do presidente Bolsonaro.
Já o descondenado Luladrão quer facilitar o aborto, aumentar impostos, acabar com a classe média e por aí vai.]
Pobres são maioria. Os que têm renda domiciliar de até dois salários mínimos mensais compõem 43% do eleitorado e detêm 63 milhões votos.
Esse é o público-alvo do novo socorro financeiro governamental — um acréscimo de R$ 200 no auxílio que hoje é de R$ 400 mensais. A maioria não será beneficiária, porque o acesso está restrito à clientela já cadastrada pelo governo. Mas Bolsonaro e aliados apostam na repercussão eleitoral entre famílias.
É manobra cara, pode ser classificada como eleitoreira porque tem prazo até dezembro, está na zona cinzenta da legislação eleitoral, mas dificilmente será contestada pelos adversários. Não se conhece político que, em época de eleição, vá às ruas protestar contra a distribuição de dinheiro aos eleitores pobres, acossados pela virulência da escassez de comida.
Quanto ao futuro, nada está claro. Não se sabe quais as propostas de Bolsonaro para resgatar o país da crise. E o adversário Lula, líder nas pesquisas, também nada esclarece. Por onde passa, repete aos pobres: “Peguem o dinheiro do Bolsonaro e votem no Lula”. E acena com reminiscências de uma temporada de bonança cujo epílogo ocorreu há mais de uma década.
José Casado, Colunista - VEJA