Coluna no Correio Braziliense
"Países diferentes, soluções diferentes. Na Itália, já se criticam os resultados e consequências do isolamento radical em casa, que tentamos copiar"
Parecemos um país masoquista, alimentando o sofrimento. Quando melhora,
damos um jeito de sabotar. Quando surgiu o Real, torcemos pela inflação,
mesmo a 5000% ao ano. Entre bandidos e heróis, temos uma leve tendência
pelos fora-da-lei. Agora, é o coronavírus o instrumento da
autoflagelação, para fechar as empresas e nos trancar em casa.
Mostraram-nos covas abertas, à nossa espera, pessoas entubadas e a
necessidade urgente de hospitais. A cloroquina brasileira, remédio óbvio
e barato, foi exorcizada como se fosse poção de curandeiro. Tudo isso
veio só depois do carnaval. Essa quaresma vai durar até que cheguemos à
ressurreição, a outro levanta-te e anda!
O argumento mais forte para nos imobilizar foi a chancela da
Organização Mundial de Saúde, órgão da ONU. Fiquem em casa. Mas agora o
chefão da OMS diz que isso é para país rico. Para país com muita
pobreza, a recomendação para ficar em casa pode não ser factível. “Como
pode alguém sobreviver quando depende de seu trabalho diário para comer?
As escolas fecharam para 1,4 bilhão de crianças. Paralisou a educação
delas e aumentou o risco de abusos. E privou crianças de sua fonte
principal de alimento. Distância física é apenas parte da equação.” O
diretor-geral da OMS, Tedros Adhanon, pediu aos países que estão com
isolamento horizontal: “O fique em casa não deve ser aplicado às custas
dos direitos humanos”. Recomendou que cada governo avalie a situação de
seus cidadãos, enquanto protege os mais vulneráveis. Há três semanas, o
presidente do Brasil fala nisso.
Se compararmos
as mortes nos Estados Unidos com as do Brasil, a diferença fica clara.
Lá, em 330 milhões de habitantes, são mais de 44 mil mortes. Se a
proporção fosse a mesma no Brasil de 210 milhões, teríamos 28 mil
mortes. As mortes no Brasil pela Covid-19 são um décimo disso.
A
medicina brasileira seria melhor que a americana, que tem 91 laureados
com o Nobel de Medicina?
Ou seriam as diferenças de faixa etária, de
genética, de dieta, de clima, de sistema de vida? Quer dizer, países
diferentes, soluções diferentes. Na Itália, já se criticam os resultados
e consequências do isolamento radical em casa, que tentamos copiar.
No
Ministério da Saúde, a orientação é de nem abrir a guarda para o vírus,
a ponto de lotar os hospitais, nem exagerar no isolamento, a ponto de
deixar os hospitais ociosos e os bolsos vazios. Enquanto isso, a Polícia
Federal criou o grupo Corona-jato, de olho nos superfaturamentos sem
licitação. Já chega de aceitar que o vírus faça estrago ainda maior.
Alexandre Garcia, jornalista - Coluna no Correio Braziliense