Vai ser difícil acusar o adversário de ladroagem se Lula foi o chefe do governo mais corrupto da história do Brasil
E Jair Bolsonaro, não existe mais? Não, não existe. Todos os citados
aí acima mais os cientistas políticos, as classes ilustradas e o New York Times
estão certos de que ele morreu e não sabe. Sua popularidade cai a cada
cinco minutos. Proibiu a compra de vacinas e, ao mesmo tempo, roubou
milhões de vacinas — que, aliás, não foram compradas — embora quase 120
milhões de brasileiros já tenham sido vacinados. Tocou fogo na Amazônia.
Matou mais de 500.000 pessoas, e vai matar mais. É genocida. Perseguiu
os índios, os quilombolas e as mulheres. Não pôs a máscara. Vai ser
expulso da Presidência por um impeachment que já está no papo; ou seja, não vai nem ser candidato. [meu DEUS como é que um cara desses, ladrão, genocida, assassino, ainda está solto? - claro só falta ele ser condenado = sendo condenado, ele será preso, na sequência anulam a condenação dele, conforme fizeram com a do Lula, aí ele será solto e poderá ser candidato. A dúvida: é melhor deixar soltou ou prender e depois soltar?]
Muito bem — mas, agora, é preciso que essas coisas todas aconteçam. Em primeiro lugar, Lula tem de vencer as eleições de 2022; não chegará lá, como tudo o que lhe acontece de bom na vida hoje em dia, por uma liminar do STF, mesmo com todo o empenho dos ministros Fachin ou Lewandowski, Toffoli ou Gilmar Mendes. Para isso terá, em primeiro lugar, de ser candidato — algo que ele quer muito, mas que pode não ser possível. Sua única vantagem competitiva de verdade, neste momento, é o desmanche de Bolsonaro. Durante os próximos quinze meses o presidente vai ter de continuar se desmanchando, e ele, Lula, vai ter de continuar crescendo — fora do mundo encantado das pesquisas. Não é uma questão de escolha: para Lula ser presidente de novo, tem de ser assim.
Lula e o PT contavam com o lema “vacina para todos”. Mas o que vai acontecer quando todos estiverem vacinados?
Quanto menos o nome do ex-presidente aparecer ligado a qualquer ministro do STF, melhor para a sua reputação. Ele vai ficar falando na sua “inocência”, é claro — mas roubalheira do adversário, que é bom numa campanha, não deve rolar.
Há também o problema da vacina, e não é pouca coisa. Os problemas da vacinação, reais ou imaginários, teriam de ser o carro-chefe de uma campanha eleitoral nos dias de hoje — o que poderia ser melhor, numa hora dessas, do que acusar o outro lado de não aplicar uma vacina que vai salvar “vidas”? Só mesmo a ajuda de Deus. Lula e o PT contavam, de coração, com o lema “vacina para todos”. Mas o que vai acontecer quando todos estiverem vacinados? Estamos em julho de 2021 e a vacina já está chegando aos jovens; até o fim do ano, a vacinação estará encerrada. Falar, em julho do ano que vem, que a vacina “demorou”, ou que Bolsonaro disse que não era culpa dele se alguém virasse jacaré, ou que o general Pazuello fez isso, ou não fez aquilo, não vai adiantar nada; ninguém vai nem mais lembrar quem foi o general Pazuello.
Falar da “recessão” também não está com boa cara. Em primeiro lugar, a maior criatura política da vida de Lula, a ex-presidente Dilma, criou e agravou a pior e mais longa recessão da economia brasileira, por sua pura inépcia e má gestão das autoridades econômicas. Como na ladroagem, é melhor não mexer com o assunto. Em segundo lugar, vai ser preciso haver mesmo uma recessão em 2022. Este ano, pelos cálculos feitos até agora, vai haver crescimento — de 5,2%, o maior desde 2010. Não se vê, hoje, nenhum fato indicando que em 2022 as coisas andem ao contrário. É o mesmo problema com o desemprego. É um caso de torcida: dá para aumentar os quase 15% de hoje, mas isso não é muito pior que o desemprego da recessão de Dilma. A foto de hoje também não é animadora para Lula: foi criado 1,2 milhão de empregos formais neste primeiro semestre. O enfraquecimento da covid e o avanço da vacinação, ao mesmo tempo, sugerem que essas taxas vão continuar subindo.
Propor o quê? Novas estatais? Transposição do Rio Amazonas?
Outra dificuldade é o próximo Bolsa Bolsonaro — o “auxílio de emergência”, ou “renda cidadã”, ou outro programa qualquer de entrega de dinheiro à população. É certo que o governo, que já experimentou essa substância e gostou, não vai ficar parado, olhando a paisagem. Vem mais dinheiro por aí — e, obviamente, vai ficar ruim cair de pau em cima de um governo que está dando uma mesada para os pobres, mesmo porque já caíram de pau quando o auxílio atual foi temporariamente suspenso. Vão falar que é demagogia, claro, mas e daí? Lula não pode propor que Bolsonaro pare de pagar, ou pague menos; o Congresso não vai vetar, em nome da austeridade nas contas públicas, e o STF vai ficar quietinho. É uma sinuca.
Seria preciso, também, arrumar mais 500.000 mortes para engrossar a conta do genocídio, ou de preferência 1 milhão. Lula pode contar com o Conselho Nacional de Secretários de Saúde, que é dirigido por um cidadão que se chama “Carlos Lula” e diz quantas pessoas morrem a cada dia de covid, em sociedade com um “consórcio” de veículos de imprensa. Mas não é fácil um negócio desses dar certo — há os relatos dos hospitais que informam sobre a ocupação de leitos nas UTIs, e outras complicações. Há, é claro, os intratáveis problemas de Bolsonaro no Congresso e a pressão, cada vez mais agressiva, para o seu impeachment — algo que começou no dia da sua posse e continua até hoje. Mas aí é preciso esperar que o presidente não faça nada para se defender, e deixe dois terços dos deputados e dos senadores votarem contra ele — isso se o pedido de impeachment chegar ao plenário.
Não se sabe até agora, enfim, qual programa de governo Lula terá para apresentar durante a campanha — coisa que sempre pode ser inventada em meia hora, mas que ainda assim precisa se sustentar em alguma coisa. Em outras palavras: é preciso dizer ao eleitor por que raios, afinal, ele deveria votar em você e não no outro. A grande esperança da esquerda, do Brasil “que pensa” e da mídia é que a rejeição a Bolsonaro resolva tudo. Lula nem precisa fazer algum esforço especial. Basta que seja candidato, fique parado e não crie nenhum grande problema; Bolsonaro vai se destruir sozinho, pelo simples fato de ser Bolsonaro. O problema com esses desejos é que a maioria do eleitorado tem de pensar do mesmo jeito.
Propor alguma coisa vai ser difícil. Propor o quê? Novas estatais? Distribuição ao povo das reservas internacionais? Perdão das dívidas pessoais? Isenção geral de aluguéis? Transposição do Rio Amazonas? Volta dos médicos cubanos? A agenda pró homossexuais-negros-índios-mulheres e contra as queimadas-agrotóxicos-militares, por outro lado, é difícil de pegar. Não funcionou na eleição de 2018. Funcionaria na eleição de 2022? Por quê? A imprensa, os intelectuais e o centro civilizado, por fim, acreditam muito em derrotar Bolsonaro falando mal da “ditadura”. Não parece ser uma grande ideia. Uma parte não acredita em golpe de Estado, regime militar e ditadura. Outra parte é a favor. Melhor deixar quieto.
Bolsonaro, pela dificuldade de olhar além do seu próprio eleitorado, governar o país com mais harmonia e menos tensão e admitir que política vai além das redes sociais e do celular, ajuda qualquer adversário. Mas é preciso, para quem quer ficar no seu lugar, ajudar a si próprio. O presidente é dado como liquidado; pode até ser que esteja mesmo. Bolsonaro, por esse modo de ver as coisas, foi eleito em 2018 porque era o anti-Lula. Lula vai ser eleito em 2022 porque é o anti-Bolsonaro. Mas o ex-presidente, o maior nome lançado contra ele até o momento, tem pela frente uma corrida de fundo, com barreiras.
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J. R. Guzzo, colunista - Revista Oeste