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sexta-feira, 26 de junho de 2020

Ida do general Ramos para a reserva e Desigualdade piora na pandemia - Míriam Leitão

O Globo

Ida do general Ramos para a reserva retira um ponto de tensão do cenário 

A passagem do ministro Luiz Eduardo Ramos para a reserva do Exército retira um ponto de tensão do cenário. Ele está na Secretaria de Governo, mas ainda é da ativa. Do ponto de vista formal, o general Ramos poderia participar do Alto Comando do Exército. Esse duplo papel é perigoso. Nessa situação, ele é o vínculo mais forte entre as tropas e a ação política do governo. A confusão criada pelo presidente Jair Bolsonaro começa a se desfazer. Ramos vai para a reserva no dia 1º de julho.

É uma atitude importante dentro do quadro atual. A tensão havia atingido níveis elevados nas semanas anteriores, principalmente pelos sinais enviados pelo presidente Jair Bolsonaro, de que as Forças Armadas (FFAA) estavam alinhadas a ele pessoalmente. Mas elas são instituições de estado. É bem diferente de apoiar um governo nas convicções e seus intentos. Bolsonaro vinha defendendo que o artigo 142 da Constituição dariam às FFAA o poder de intervir “democraticamente” se houvesse conflito entre os poderes. Esta semana, em painel promovido pelo GLOBO, o ministro Luiz Fux explicou que o Supremo é o único poder que tem o direito de revisar os atos de outros poderes. [uma interpretação de um dispositivo constitucional vigente há mais de 30 anos e complementado por uma Lei Complementar aprovada há mais de 20 anos - elaborada cumprimento mandamento constante do parágrafo primeiro, artigo 142,  da Constituição Federal - merece ser interpretado ou 'explicado' em decisão colegiada do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenário com a presença de no mínimo 2/3 dos seus ministros e aprovada por no mínimo seis votos.
Uma explicação em um painel não parece ser a via adequada.] 

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Na carta, Ramos escreve que “minha permanência no serviço ativo perdeu o sentido e torna-se prejudicial à instituição que me fez quem eu sou e que tanto amo.” Ele tinha mais um ano e meio até a aposentadoria compulsória. Antes de assumir a Secretaria de Governo em meados de 2019, o general comandava o 2º Exército, em São Paulo. Ramos tinha experiência na relação com políticos, representava o Exército nas articulações com o Congresso. Ele acreditava que isso poderia ajudar o governo. O ministro explica que, quando tomou posse no cargo, esperava passar pouco tempo no governo. Seria uma missão transitória. “Considerando ter cumprido essa missão, me preparava para o retorno quando, de forma absolutamente imensurável, fomos atingidos pela crise do COVID” escreveu o general. O curioso é que a avaliação dele sobre a pandemia é diferente da que o presidente tem apresentado.


A desigualdade piora na pandemia

O ministro Marco Aurélio Mello disse que a despesa com os servidores pode ser reduzida, ainda que o Supremo tenha decidido que são irredutíveis os salários dos funcionários públicos da União, Distrito Federal, estados e municípios. No mesmo dia dessa decisão, que protege um grupo profissional, o IBGE divulgou que a renda do brasileiro caiu 18% em maio, e que, dos afastados do trabalho, quase dez milhões passaram a não ter renda alguma. Desses, 33% são empregadas domésticas sem carteira. São os retratos do país.
[perguntas que não querem calar
- O ministro Marco Aurélio a exemplo dos demais ministros do STF e membros da magistratura, em qualquer grau, são considerados membros do Poder Judiciário - critério que se aplica aos parlamentares - membros do Poder Legislativo - e a promotores e procuradores - membros do MP, portanto, não estão incluídos, constitucionalmente,  na categoria de Servidor Público.
Tal condição nos leva a perguntar:
a) o ministro Marco Aurélio está se manifestando como MEMBRO do PODER JUDICIÁRIO? 
b) Ou aceita ser incluído no trecho constitucional que cuida dos servidores públicos?]

O ministro Marco Aurélio explicou que a Constituição estabelece a irredutibilidade dos salários dos servidores, mas não o de trabalhadores do setor privado.
— É bom pensar nisso para uma futura emenda — disse.

O tratamento é desigual, afinal, o Brasil vive uma pandemia, um colapso da arrecadação que devasta as finanças de estados e de municípios, e o gestor público pode cortar tudo, menos o salário do servidor. Imagine uma cidade sem recursos que tenha que, em vez de comprar remédio para um hospital, manter o mesmo rendimento para o servidor num país que empobreceu?
O que o ministro argumenta é que a própria Constituição aponta um caminho:
O rol de medidas, para reduzir as despesas com pessoal, contido na Constituição, é exaustivo. Está no artigo 169. Permite a redução dos gastos de pessoal, primeiro afastando 20% dos detentores de cargos de confiança, depois exonerando os servidores não estáveis e por último até os estáveis, desde que pagando-se uma indenização de um mês por ano trabalhado. Mas tem que conciliar todo ajuste à irredutibilidade dos salários dos servidores — disse.

Nesse artigo a Constituição estabelece que os salários dos servidores de qualquer esfera administrativa do setor público não pode exceder o limite estabelecido por lei complementar. E faz a lista desses ajustes que podem ser feitos. Nada impede agora que o governo federal diante da conhecida queda de arrecadação reduza em 20% os cargos comissionados. Mas, pelo visto, na negociação com o centrão para defender seu mandato, o presidente está fazendo o caminho oposto. Aumentando as nomeações de apadrinhados.

Os efeitos econômicos do coronavírus no mercado de trabalho são como um bombardeio sobre os postos de trabalho. Os servidores que têm estabilidade já estão num abrigo antiaéreo. Na outra ponta, estão 19 milhões de trabalhadores que foram afastados e, desses, quase 10 milhões ficaram sem remuneração alguma. Somando-se os brasileiros que gostariam de procurar trabalho mas não estão procurando por causa da pandemia e os desempregados, há 36,4 milhões de brasileiros “pressionando o mercado de trabalho”, como disse o IBGE.

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Em todas as áreas o que se vê no Brasil durante a pandemia é o aprofundamento das desigualdades. A falta da cobertura de banda larga no país, a falta de computadores nos lares dos mais pobres, a falta de celulares afastam pessoas do mercado e tiram a capacidade de aprendizado dos estudantes. E pensar que quando foi criado o FUST era para ser, como o nome diz, um fundo para universalizar os serviços de telecomunicação. O dinheiro ficou parado no fundo, no meio de muito debate sobre o seu destino, e agora o governo Bolsonaro propôs sua extinção.

Míriam Leitão, jornalista - com Alvaro Gribel, São Paulo - O Globo