No Brasil atual vivemos um
desencontro de estratégias e possibilidades, isto é, capacidades militares
inadequadas para a execução dos planos operacionais, devido ao completo desinteresse
dos governos e políticos pelos assuntos de defesa. Os conceitos estratégicos
estão bastante adiante das realidades em recursos militares e táticas da Força
Terrestre.
O Gen Charles Krulak, do Corpo de
Fuzileiros dos EUA, comenta no livro o Gladiador Moderno de Hyrum W. Smith, um
registro do século IV, em pleno declínio do Império Romano, de um general
comandante de legião: “Quando, por negligência ou preguiça,
os exercícios militares de solo foram abandonados, a armadura habitual começou
a pesar, uma vez que os soldados raramente, ou nunca, a usavam. Portanto,
primeiro eles pediram ao imperador para dispensá-los do uso das couraças e das
cotas de malha, e, finalmente, dos elmos. Assim, nossos soldados enfrentaram os
godos sem qualquer proteção para o coração e para a cabeça, e foram pesadamente
atingidos por arqueiros. Apesar de ter havido muitos desastres, que levaram à
perda de importantes cidades, ninguém tentou reequipar a infantaria com suas
armaduras. Eles as despiam e, sem elas, estavam também sem sua integridade”.
Foi uma questão de poucos anos para que a legião consumasse seu declínio e se
tornasse incapaz de proteger as fronteiras... os bárbaros batiam à nossa
porta”.
Verifica-se, portanto, desde aquela
época, que uma Força Armada cujo preparo para o emprego não seja sua atividade
principal e permanente encontra-se doente, até que finalmente o inimigo
demonstre que está morta. Tudo que é exigido do preparo é “o produto acabado”
forças de combate bem equipadas e adestradas, o uso destes meios é relacionado
com a teoria da guerra, pois eles são desenvolvidos com este propósito, quando
falha a dissuasão.
O combate (guerra) é o objetivo, a
razão de ser, a suprema manifestação dos Exércitos. Qualquer medida que se
afaste disso, e que relegue o combate a um segundo plano, é enganadora,
quimérica e funesta.
A guerra se faz com efetivos enormes
e, na massa, o homem desaparece. O que chama a atenção, numa primeira vista, é
a quantidade. Não deve ser esquecido, no entanto, que é a qualidade do
combatente que fará a diferença. Hoje, como sempre, somente o preparo
infatigável será capaz de levar à vitória.
Em decorrência das grandes distâncias
e da dispersão, no Exército Brasileiro somos levados a compreender o imperativo
da qualidade, da disciplina, da solidariedade mais estreita, da confiança, e do
treinamento, mais do que em qualquer outra área. “Não é bom levar para o combate 80
mil homens, dos quais somente 50 mil vão combater. Melhor seria levar os 50 mil
e todos combaterem. Os combatentes estariam de corpo e alma envolvidos na
batalha, mas não teriam confiança em camaradas que não se empenhassem nela.”
“Se trezentos homens determinados
podem pôr em fuga uma nação, é preciso achar esses trezentos homens”. (Gedeão, o
herói bíblico vencedor dos Midianitas)
O combate para ser bem executado
exige uma coesão moral, uma solidariedade muito forte. No Exército, devido às
suas características, os laços podem se alongar, e para que não se partam,
cumpre que sejam fortes.
Necessitamos de Laços Fortes com
nossos subordinados em todos os níveis.
“Quem manda estranhos à vindima não
tem amor às uvas”. (ditado português).
Quem manda soldados despreparados e
mal equipados para o combate está derrotado!
Somente o pensamento militar
transformador e o preparo viril, mais próximo possível do real, geram o êxito e
podem manter uma Força Armada vitoriosa. Disciplina, solidariedade e confiança
não se improvisam. Combatentes não nascem adestrados.Não basta afirmar, é
preciso prová-lo todos os dias.
O enfraquecimento do poder militar
representa um risco indesejável, que deve ser afastado no mais curto prazo
possível. Nesse sentido, se o provimento de recursos as Forças permanecerem
insuficiente, colocando em risco o cumprimento de suas missões constitucionais
de defesa da Pátria, as Forças Armadas deverão advertir o Governo quanto a essa
incongruência ou, então, compartilhar a culpa pelo resultado desastroso.
A armadura moral do combatente somente
será efetiva se ele for mantido bem
equipado, adestrado e consciente da importância de seu papel para o sucesso do
Exército e do Brasil.
A ascensão e o declínio dos
“Legionários Romanos” não foram mera obra do acaso. Seu exemplo permanece atual
e não pode ser esquecido.
Por: Carlos Alberto Pinto Silva, General de Exército da Reserva,, ex-comandante de Operações Terrestres (COTer), do Comando Militar do Sul, do Comando Militar do Oeste, Membro da Academia Brasileira de Defesa, e do CEBRES.