Episódios lamentáveis de hostilidade e até de violência contra autoridades não são novidade na democracia brasileira – e nem foram inventados pelas redes sociais.
Só na história recente, deputados já foram atingidos com sacos de farinha, ovos, embalagens de pizza, lama e purpurina. Nos anos 2000, houve uma breve onda de tortas na cara – que atingiram Ricardo Berzoini, ministro do Trabalho de Lula, e José Serra quando ministro da Saúde de FHC, entre outros.
O exemplo mais lamentável de hostilidade envolveu o então governador de São Paulo Mário Covas. Já sofrendo de câncer na bexiga, Covas foi agredido por bandeiradas de professores e manifestantes de esquerda, ficando com diversos hematomas na cabeça e no supercílio.
Nos anos recentes, porém, políticos e juízes passaram a utilizar dois artifícios para intimidar manifestantes – tanto os violentos quanto os pacíficos
O primeiro é a ideia, equivocada, de que hostilizar autoridades equivale a ameaçar instituições democráticas ou o Estado de Direito. O costume de dizer “quem me ofende atenta contra o Estado” é antigo: surgiu com os imperadores romanos para perseguir opositores e inspirou as primeiras leis de lesa-majestade.
Ao se considerar o episódio de agressão um crime maior – uma ameaça à ordem e à democracia – justifica-se o abuso de autoridade e as reações desproporcionais contra seus autores.
Foi o que ocorreu esta semana depois da confusão entre a família do ministro Alexandre de Moraes e a de um empresário paulista no aeroporto de Roma. Num claro exemplo de intimidação, a Polícia Federal fez buscas na casa dos acusados e chegou até a apreender celulares e computadores da família.
Se confirmada, trata-se de uma agressão execrável– que não justifica, no entanto, inquéritos de ofício e abusos de autoridade.
O segundo artifício que tem sido utilizado por integrantes das cortes superiores é interpretar o Código Penal, a Constituição e os regimentos internos sempre da maneira que mais lhes confere poder.
Apesar do suposto crime contra a família do ministro Alexandre de Moraes ter sido cometido na Itália, cabendo então a responsabilidade de ser apurado por autoridades italianas, rapidamente se considerou que havia motivo para a “extraterritorialidade”, ou seja, para que fosse investigado e punido no Brasil.
E apesar dos envolvidos não terem foro privilegiado, poucos comentaristas se perguntaram por que a Polícia Federal entrou no caso, e não a Polícia Civil de São Paulo – como ocorreu, por exemplo, na ocasião de um crime mais grave, de furto cometido por um brasileiro a outro brasileiro no Japão, em 2011.
Ao utilizar esses artifícios para perseguir e intimidar dissidentes, os ministros prejudicam ainda mais a reputação e a legitimidade do STF perante a população.
Para que haja um princípio de conciliação entre a sociedade brasileira e o STF, é preciso que os integrantes da corte voltem a agir dentro dos limites da lei.
Reproduzido Editorial - Partido Novo
* Reproduzido de https://novo.org.br/editorial/stf-arbitrariedades/