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quarta-feira, 22 de abril de 2020

Quando o procurador Aras vai procurar Bolsonaro? - Blog do Josias

O  inquérito aberto no Supremo Tribunal Federal para apurar quem organizou e financiou as manifestações antidemocráticas do último domingo está crivado de ironias e de dúvidas. A primeira ironia é o uso de ferramenta da ditadura — a Lei de Segurança Nacional— para processar pessoas que pedem a volta do regime militar. A segunda, o fato de as manifestações terem sido magnificadas pela presença de um presidente que sustenta que não houve ditadura no Brasil. 

Quanto às interrogações, as duas mais incômodas são as seguintes: Por que manter o inquérito sob sigilo? Alega-se que há a suspeita de envolvimento de parlamentares. Mais uma razão para submeter a apuração à luz do Sol.

 Por que Bolsonaro foi previamente excluído do rol de investigados? Sustenta-se que o presidente "apenas" participou do ato. 
[o Presidente da República continua sendo cidadão - portanto, em pleno exercício de seus direitos constitucionais, incluindo o de livre expressão - e por ocupar um cargo político se espera que participe de eventos políticos.

O evento já ocorria quando o presidente chegou ao local onde era realizado e fica próximo ao destino original da comitiva presidencial: Forte Apache = QG do Exército, Setor Militar Urbano, Brasília, DF.

Lá discursou por menos de três minutos, não disse nenhuma palavra contra nenhum dos Poderes da República, não criticou o isolamento imposto à população do DF por decisão exclusiva do chefe do Poder Executivo do DF - que agora não sabe como sair do isolamento que impôs - , manteve a distância de segurança fixada pelo GDF,  ainda que tal distância de isolamento tenha sido estabelecida com base no 'chutômetro', não abraçou nem apertou a mão de nenhum manifestante. 
Investigá-lo com base em que?]

Ora, o episódio ganhou relevância justamente porque um presidente que deveria zelar pela ordem democrática discursou em ato urdido por defensores do estilhaçamento da democracia. A exclusão de Bolsonaro é injustificável. Fica a impressão de que o procurador-geral da República Augusto Aras ainda não se deu por achado. Ele tem dificuldades para perceber que deve obrigações não ao presidente que o indicou para o cargo, mas à Constituição e ao brasileiro que lhe paga o salário. Há uma outra esquisitice no inquérito. Não ficou claro como o pedido de Aras foi parar na mesa do ministro Alexandre de Moraes. Ele é relator de outro inquérito secreto, aberto no Supremo em março do ano passado, por iniciativa do presidente da Corte, Dias Toffoli. Coisa destinada a apurar supostas notícias falsas contra o Supremo e ataques aos seus ministros.

Esse inquérito de Toffoli, cuja legalidade é contestada, tornou-se multiuso. Já serviu até para censurar notícia verídica contra Toffoli. Se a investigação que excluiu Bolsonaro for acoplada a esse outro inquérito maroto, começará com o pé esquerdo. Ficará demonstrado que as coisas nem sempre são tão ruins quanto parecem. Elas podem ser muito piores.

 Blog do Josias - Josias de Souza, jornalista - UOL


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