Reinaldo Azevedo
Presidente da corte vai pautar mudança no regimento para tornar obrigatória ida ao plenário de despachos monocráticos
Após o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Luiz Fux, prometer uma atuação contra as decisões individuais na corte, Gilmar Mendes reagiu e cobrou coerência do colega. “Respeitem um pouco a inteligência alheia, não façam muita demagogia e olhem para os próprios telhados de vidro", disse o ministro.
Os dois participaram nesta sexta-feira (16) de um evento virtual realizado pelo site Conjur. Fux afirmou que irá “democratizar o STF”, que só terá decisões colegiadas, mas Gilmar respondeu o colega. Ambos pertencem a alas opostas do tribunal, principalmente em julgamentos criminais. Enquanto Gilmar integra o grupo que impõe derrotas à Lava Jato por considerar que muitas investigações não respeitam garantias dos réus, Fux atua para manter viva a operação.
O presidente do Supremo fez a abertura do evento e, logo depois, Gilmar usou a palavra. Ele recordou decisões monocráticas de Fux e do ministro Luís Roberto Barroso, que também defende a ideia de mudar o regimento interno para obrigar que despachos individuais sejam remetidos ao plenário automaticamente. "Eu vejo agora muita gente entusiasmada: 'vamos proibir a liminar, não se pode’. A liminar mais longa que eu conheço na história do Supremo Tribunal Federal, ao menos que tenho lembrança, é aquela do auxílio-moradia, por que não vem no plenário de imediato?”, questionou Gilmar.
Ele fez referência ao despacho individual de Fux em 2014 que estendeu a todos os juízes do Brasil o auxílio-moradia. A medida valeu por mais de quatro anos até perder os efeitos no fim de 2018. [A lentidão na análise da liminar foi motivada,- dizem as más, ou bem informadas línguas - pelo fato da desembargadora Mariana Fux, filha do ministro Fux, trabalhando no Rio, receber auxilio moradia, mesmo sendo proprietária de dois apartamento no Leblon.
A situação se resolveu em 2018 e fazemos remissão apenas para esclarecer o comentário do ministro Gilmar sobre a longevidade de um despacho do atual presidente do STF.]
Fux, porém, quer deixar como uma das marcas de sua gestão à frente do STF o fim das decisões dadas por apenas um ministro que levam anos até serem confirmadas ou revogadas pelo plenário ou por uma das duas turmas do tribunal.
Para isso, como mostrou a Folha, ele deve pautar na próxima sessão administrativa uma emenda ao regimento que torna automática a ida dessas decisões ao plenário da corte. A ideia ganhou força após Fux individualmente derrubar o habeas corpus que havia sido concedido pelo ministro Marco Aurélio a André de Oliveira Macedo, 43, conhecido como André do Rap, um dos líderes da facção criminosa PCC.
“O Supremo do futuro é um Supremo que sobreviverá sempre realizando apenas sessões plenárias. Será uma corte em que sua voz será unívoca. Em breve, nós desmonocratizaremos o STF, que as suas decisões sejam sempre colegiadas numa voz uníssona daquilo que a corte entende sobre as razões e os valores constitucionais”, disse Fux no evento desta sexta. Fux avalia que a libertação do traficante, após decisões tomadas em instâncias inferiores e a um custo elevadíssimo da operação da Polícia Federal que o deteve, além de ter equívocos jurídicos, maculava a imagem do Supremo.
A discussão sobre a necessidade de regulamentação de todas as ordens monocráticas não é novidade no tribunal. Outras decisões individuais já foram alvo de contestação.Em 2018, Marco Aurélio deu uma liminar que suspendeu a prisão de pessoas que estivessem presas após condenação em segunda instância, sem o trânsito em julgado. A medida foi reformada pelo então presidente do STF, Dias Toffoli, durante um recesso do Judiciário.
Folha de S. Paulo - Coluna Reinaldo Azevedo