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segunda-feira, 9 de novembro de 2020

Uma ponte com o mundo - Fernando Gabeira

In Blog

Na noite das eleições pensei em ver um jogo da Copa do Brasil para não passar a noite em claro, sofrendo com algo que não posso influenciar. Trump ou Biden, Botafogo ou Goiás? Este último duelo tinha funcionado para embalar meu sono na semana anterior. No entanto passei mais uma noite em claro. Afinal, há tanta coisa em jogo. Minha ideia dos Estados Unidos não se alterou. Como nunca fui lá, conecto-me pela cultura, e alguns pontos importantes do mapa são Nova York e a Califórnia. Nesses lugares, Trump foi derrotado de forma acachapante. Continuam, de certa maneira, familiares para mim.

O problema são as decisões tomadas em Washington. No dia anterior, os EUA formalizaram sua saída do Acordo de Paris, deixando os outros países com a enorme tarefa de adaptação ao aquecimento global. Para os estrategistas, uma solução pró-Trump seria interessante para a China, pois acentuaria a decadência americana no mundo. Para mim, ela representaria a perda de esperança na sobrevivência da própria humanidade, deixando-nos com a alternativa de apenas lutar para que isso seja mais lento.

No meu país, seria um estímulo para que Bolsonaro e Salles acelerem a destruição dos recursos naturais e reduzam as chances de encontrarmos nossa moderna vocação econômica: a exploração sustentável da Amazônia, das fontes renováveis de energia, a abertura de milhares de empregos num projeto de recuperação verde. [um pequeno registro: o ilustre articulista é um expert em meio ambiente, o que lhe permite ser sabedor com exatidão que os 22 meses transcorridos desde a posse do presidente Bolsonaro - período que ele tem tentado governar sob um fogo cerrado dos outros Poderes, dos inimigos do Brasil e dos representantes de tudo que não presta - foram insuficientes para o capitão e o ministro do Meio Ambiente tenham tido êxito em causar às florestas brasileiras, os danos que os ongueiros vendidos aos estrangeiros vendidos  e os serviçais dos inimigos do Brasil = insistem em dizer que ocorreram.]

Alguma coisa não funcionou na primeira noite. As pesquisas se equivocaram, e Biden não conquistou uma vitória esmagadora. Aconteceu o que todos anunciavam; Trump tumultuaria o processo e buscaria uma saída no tapetão. Ele, como todo mundo, sabia que a maioria dos democratas votou pelo correio e que esses votos demoraram a ser contados. [votos que demoram a chegar ao destino, à segurança das mesas apuradoras, também são passíveis de fraudes, acréscimos fantasmas, etc.]

Independentemente do resultado, tudo isso me faz pensar no Brasil. Lá como aqui, a polarização domina o país. Lá como aqui, o populismo é muito mais resiliente do que pode parecer quando nos referimos apenas aos círculos intelectuais. Antes de criticar as pesquisas que falharam, é importante registrar que algumas pessoas têm medo de revelar seu voto; outras o escamoteiam porque veem nos institutos de pesquisa um braço do sistema e de dominação, denunciado pelos populistas.

E, antes de criticar os democratas por terem esperado uma onda azul que não arrebentou na praia, é preciso estudar se existem alternativas para certas tendências humanas. 
Como não se importar com os imigrantes ilegais, inclusive centenas de crianças separadas dos pais? [- os imigrantes que concorrem com os nacionais na busca por emprego, sofrem uma normal rejeição; 
- o fato de ser um latino legalizado não constitui razão para se tornar solidário aos que buscam uma legalização;
- da mesma forma, a cor da pele não impõe a obrigação de ser aliado e defensor de um transgressor com a pela da mesma cor. 
Fiquem cientes de que no Brasil um cidadão brasileiro, desempregado e sem teto, é preterido por  um venezuelano que ingressou ilegalmente no Brasil,  nas mesmas condições. 
É mais fácil um venezuelano desempregado e sem teto conseguir emprego a e abrigo do que brasileiro que com ele concorrer.]
Nem sempre os latinos legalizados são solidários com os ilegais. Nem sempre os negros se compadecem dos seus irmãos asfixiados até a morte pela polícia.Na medida em que a vitória de Biden se anunciava de forma mais lenta que o esperado, Trump optou por entrar na Justiça e, de certa forma, tumultuar o processo. Isso preocupa não só pelos Estados Unidos. Trump é uma inspiração para Bolsonaro, que tem uma tendência a questionar resultado das eleições, até mesmo quando as vence.

Há tantas lições a tirar deste momento que ele nos deixa uma tarefa para muito tempo. Mas é claro que o populismo de direita é enraizado na visão de mundo de seus seguidores, e não podemos subestimá-lo, mesmo diante da derrota eleitoral. Aliás, a vitória nesse caso lembra-me a fala de um oficial no filme “A Guerra da Argélia”: “É muito difícil chegar ao governo, mas as dificuldades começam de verdade quando se chega lá”.

Biden é um homem com recursos oratórios modestos, mas realizou a tarefa de ser o candidato mais votado da história americana. [Trump recebeu mais de 70.000.000 de votos, número  que nem o próprio Biden contesta; o democrata recebeu, sob intensa e motivada contestação, pouco mais de 74.000.000 = diferença que não alcança nem 5%.]  = O panorama que encontra diante de si é minado não só pela pandemia, crise econômica, mas também pelo legado do populismo. Desconfiança nas instituições, notícias falsas, teorias conspiratórias, divisão profunda na sociedade, tudo isso modela um caminho muito difícil de transpor.

Muito mais que a paciência e a unidade necessárias para derrotar o populismo de direita, será necessário construir pontes, apesar dos sabotadores que as explodem com frequência. A primeira e grande ponte será com o próprio mundo, voltar ao esforço multilateral, reconhecer a importância do trabalho conjunto para enfrentar o grande desafio planetário. A volta ao Acordo de Paris e a reconstrução verde da economia americana seriam um grande começo. [desde que as contestações judiciais não impeçam a posse do esquerdista, este terá o direito de governar com os interesses dos norte-americanos e lembrando sempre que o Brasil é uma nação soberana e que apesar de muitos brasileiros = maus brasileiros = defenderem o rompimento entre os EUA e o Brasil, o Brasil é uma NAÇÃO SOBERANA e certamente os irmãos do Norte não querem outro Vietnam.]

Blog do Gabeira -  Fernando Gabeira, jornalista

Artigo publicado no jornal O Globo em 09/11/2020