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domingo, 7 de janeiro de 2024

A morte de Zagallo, o único a vencer quatro Copas

O Velho Lobo, como era chamado, foi duas vezes campeão do mundo como jogador e duas à margem do campo - recorde inigualável

“Zagallo era exemplo de brasileiro que não desistia nunca”, diz Lula

 
 Mário Jorge Lobo Zagallo, o Velho Lobo, como era carinhosamente chamado, morto nesta sexta-feira, dia 5, aos 92 anos, fez história no futebol com um recorde: foi duas vezes campeão do mundo jogando pela seleção brasileira, em 1958 e 1962, e duas do lado de fora do gramado, como treinador em 1970 e coordenador técnico em 1994. 
 Era, enfim, um nome de imensa relevância – mas pouco respeitado, ou com menos destaque do que merecia.
 
Como jogador, Zagallo foi pioneiro. Era um ponta-esquerda talentoso, que marcava gols, mas voltava para organizar o meio de campo e mesmo para defender. Hoje, a postura dele poderia ser chamada de “falso ponta”, função atualmente celebrada, mas que a Zagallo já intuía ser fundamental.   Ele começou a carreira profissional no Flamengo, onde atuou de 1950 a 1958. 
 Foi tricampeão carioca, entre 1953 e 1955, e marcou 29 gols com a camisa rubro-negra. Em 1958, foi para o Botafogo, e defendeu o time até 1965. Jogou ao lado de grandes estrelas, como Garrincha, Didi e Nilton Santos, e foi bicampeão carioca.

Com a camisa da seleção brasileira foi sempre vitorioso. Em 1958, ao lado de Pelé, Didi, Zito e cia., fez um dos cinco gols da vitória de 5 a 2 sobre a Suécia, na final. Quatro anos depois, em 1962, também teve atuação determinante na conquista do bicampeonato, na Copa que fez de Garrincha lenda eterna.

Depois de se aposentar dos gramados, continuou atuando no futebol como treinador. Entre 1966 e 1968 foi responsável pelo Botafogo, e seu trabalho chamou a atenção e ele foi convocado para a vaga de técnico da Seleção Brasileira, posição aberta depois da saída de João Saldanha (1917-1990). O movimento de Zagallo, no banco, durante a Copa de 1970, foi decisivo: sabia ter em mãos craques em profusão, e a esperteza seria ter todos em campo, mas com um esquema de jogo que permitisse uma máquina azeitada. 
Pôs, então, cinco “camisas 10”: Pelé, Jairzinho, Gérson, Rivellino e Tostão.  
Sabia ouvi-los, mas não abria mão da troca de posições, que coordenava com rara precisão. 
Muito se diz que, com aqueles craques, bastava entrar em campo, e pronto. 
Mas não. Zagallo, como os próprios atletas admitiriam, sobretudo Pelé, fez a diferença. A campanha foi perfeita, com seis vitórias em seis jogos, 19 gols marcados e apenas 7 sofridos.
 
Sua longa carreira como treinador inclui passagens por clubes brasileiros, como o Botafogo, em quatro ocasiões, Fluminense, Flamengo, Vasco da Gama e Bangu.  
Além da Seleção Brasileira, treinou as seleções do Kuwait, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos.
Foi ainda coordenador técnico da Seleção Brasileira em duas ocasiões: entre 1991 e 1994 e entre 2003 e 2006, em seu último trabalho nos gramados.

Foi eleito o nono melhor treinador de todos os tempos pela revista World Soccer, em 2013, e o 27º melhor jogador de todos os tempos pela revista FourFourTwo, em 2020.

LEIA MAIS: Familiares e fãs prestam homenagens a Zagallo em velório na CBF

Esporte - Revista VEJA


quarta-feira, 25 de abril de 2018

O carma do futebol-arte: o legado que a seleção de 1970 deixa para o Brasil de Tite

Jogar bonito ou vencer? ÉPOCA compilou como o escrete fez os gols nas últimas Copas para descobrir qual equipe se aproximou mais do jogo idealizado pelo torcedor 

O lateral Roberto Carlos desce do ônibus a balançar um chocalho. Ronaldinho Gaúcho surge em seguida tocando um pandeiro. Os jogadores rumam para o vestiário, onde, enquanto vestem o uniforme amarelo e azul da Seleção Brasileira, tocam samba e fazem embaixadinhas e malabarismos com uma bola. As cenas — que repetem os mais manjados clichês sobre o Brasil, seus jogadores e seu futebol — faziam parte de uma propaganda da Nike, cuja campanha lançada às vésperas da Copa do Mundo de 2006 sintetizava aquilo que o torcedor queria ver do Brasil em campo: drible, jogo ofensivo e futebol esteticamente agradável.


 Tostão, o craque campeão de 1970, simbolizava aplicação tática e qualidade técnica (Foto: POPPERFOTO/GETTY IMAGES)

Era mais uma das encarnações do mito do futebol-arte, que persegue o Brasil há mais de 50 anos e ressuscita a cada quatro anos. É a ideia de que o Brasil deve jogar bonito e vencer por ter um time cheio de talentos, de foras de série, por natureza muito melhores que todos os seus concorrentes.

Tal ideal nasceu no bicampeonato nas Copas de 1958 e 1962 e foi realizado em sua plenitude pela Seleção Brasileira que venceu a Copa de 1970, o time treinado por Mário Jorge Lobo Zagallo, com Pelé, Tostão, Rivellino, Gérson, Carlos Alberto Torres, Jairzinho. Como várias antes, a equipe que desceu do ônibus sambando no comercial de 2006 carregava a esperança de reeditar o tal futebol bonito e eficiente por ter Kaká, Ronaldo, Ronaldinho Gaúcho e Adriano, alguns dos maiores jogadores naquele momento. 

Mas, como várias outras, ficou no quase — ou melhor, numa derrota para a França. Nas duas Copas seguintes, o triângulo formado pela Seleção, pela torcida e pelo jogo bonito foi substituído pela desconfiança. A dúvida persiste em relação à Seleção que, em dois meses, disputará a Copa de 2018: será esse time capaz de jogar bonito e vencer?
Na tentativa de dar base objetiva para que se avalie a estética da Seleção Brasileira — mesmo que tal quantificação nunca chegue a ser conclusiva —, ÉPOCA compilou as jogadas que originaram os gols feitos pelo Brasil nas Copas de 2002 a 2014. 

As possibilidades são variadas. Há times que avançam da defesa para o ataque com troca de passes, que constroem jogadas. Há equipes que priorizam rápidos contra-ataques, outras que roubam a bola de adversários no ataque para um contragolpe mais rápido. E há a bola parada, seja falta, escanteio ou pênalti. São meios distintos para o mesmo fim: o gol. A análise também leva em conta o resultado obtido, claro. Isso para tentar definir, entre as seleções mais recentes, qual delas ao menos se aproximou do futebol vistoso e vencedor.

>> Kevin De Bruyne: a peça para que a famosa geração belga convença – ou frustre de vez

A resposta é fácil: a de 2002. A Seleção treinada por Luiz Felipe Scolari tinha boa parte do que o torcedor quer ver em campo. As jogadas ofensivas se concentravam na construção, responsável por quase metade dos gols marcados, mas o arsenal contava também com recursos como as bolas paradas de Roberto Carlos e Ronaldinho Gaúcho, a roubada de bola no campo adversário e o contra-ataque vindo de trás. Felipão equilibrou a defesa com três zagueiros e o volante Gilberto Silva e liberou os homens do meio para a frente, talentosos, para que atacassem à vontade. 

Cafu pela direita e Roberto Carlos pela esquerda serviam o ataque dos “três erres” — Rivaldo, Ronaldinho Gaúcho e Ronaldo. A Seleção construía suas jogadas pelos flancos, e, se a beleza não desse resultado, Felipão tinha armas para o segundo tempo, como Juninho Paulista e Denílson, ambos habilidosos e rápidos para incrementar o gracejo da Seleção. 

O final é conhecido: Cafu, com sua camisa “100% Jardim Irene”, levantou a taça.

A Seleção de 2018 ainda não tem as jogadas de uma Copa para comparação, por isso a base aqui são as últimas partidas das Eliminatórias e seus amistosos mais recentes, com exceção do 4 a 0 na Austrália e do 1 a 0 na Colômbia, nos quais apenas reservas atuaram. O que os números mostram é que o Brasil de Tite é uma equipe que respeita a forma de jogo que o brasileiro aprecia — quase metade dos gols é oriunda da construção. 

Contra o Paraguai, pelas Eliminatórias, Philippe Coutinho pegou a bola pela direita, virou-se para o meio e tabelou com Paulinho; os marcadores foram com Paulinho, o que abriu um espaço na defesa; Paulinho devolveu de calcanhar, e Coutinho chutou da entrada da área para marcar.

Na falta de jogadas assim, o time também tem artifícios para garantir resultados, como bolas paradas. O escanteio curto que termina na cabeça do zagueiro Miranda, no gol contra a Rússia, é um exemplo recorrente. O time de Tite ainda tem o pragmatismo necessário para que contra-ataques vindos desde a defesa funcionem, responsáveis por um quinto dos gols. Até agora, o time mostrou ter capacidade de construir jogadas e de ter uma diversidade de recursos ofensivos. [pedimos desculpas aos nossos leitores pela manutenção das fotos sobre o técnico que foi a vergonha do futebol nacional: Luiz Felipe.]