Se
condenado, Lula não pode protelar recurso. O ex-presidente Lula pode
não ter tanto tempo para recorrer contra a inelegibilidade, caso sua
condenação seja confirmada pelo TRF-4, quanto sugere a legislação
eleitoral. A Lei da Ficha Limpa não fala em recursos, considerando que a
segunda condenação é suficiente para impedir uma candidatura. Um de
seus autores, Marlon Reis, que na época era juiz, diz que houve inclusão
da possibilidade de recurso com prioridade através do artigo 26C da Lei
das Inelegibilidades a fim de que não alegassem que o direito a uma
medida liminar para suspender os efeitos da lei fora retirado dos
condenados.
O artigo foi escrito com a intenção de, ao mesmo
tempo em que garante o direito ao recurso, não permitir ações
protelatórias. Diz lá que o órgão colegiado do tribunal ao qual couber a
apreciação do recurso (no caso de Lula, o Superior Tribunal de Justiça)
poderá, em caráter cautelar, suspender a inelegibilidade sempre que
existir plausibilidade da pretensão recursal e desde que a providência
tenha sido expressamente requerida, sob pena de preclusão, por ocasião
da interposição do recurso (incluído pela Lei Complementar nº 135, de
2010).
Segundo o Código de Processo Civil, preclusão é a perda de
direito de se manifestar, por não ter feito atos processuais na
oportunidade devida ou na forma prevista. A lei prevê que “conferido
efeito suspensivo, o julgamento do recurso terá prioridade sobre todos
os demais, à exceção dos de mandado de segurança e de habeas corpus
(incluído pela Lei Complementar nº 135, de 2010)”.
Mantida a
condenação da qual derivou a inelegibilidade ou revogada a suspensão
liminar mencionada no caput, serão desconstituídos o registro ou o
diploma eventualmente concedidos ao recorrente (incluído pela Lei
Complementar nº 135, de 2010). A prática de atos manifestamente
protelatórios por parte da defesa, ao longo da tramitação do recurso,
acarretará a revogação do efeito suspensivo (incluído pela Lei
Complementar nº 135, de 2010).
Isso quer dizer que, quando os
advogados de Lula entrarem com um recurso no STJ contra a decisão do
TRF-4, terão também que pedir a suspensão da inelegibilidade. Se não o
fizerem, para esperar até agosto, depois da convenção partidária, terão
perdido o prazo para anular a inelegibilidade. Prevalecendo essa
interpretação, o STJ decidirá simultaneamente o recurso contra a
condenação e também sobre a inelegibilidade de Lula, afastando a
possibilidade de que o recurso se prolongue até a convenção partidária.
Muito antes de 5 de agosto, portanto, a situação de Lula estará definida
e, confirmada a sentença condenatória, seu nome não poderá nem mesmo
ser apresentado na convenção do PT.
O presidente Michel Temer foi
mais um político a dizer que prefere que Lula seja derrotado nas urnas a
impedido de se candidatar à Presidência da República este ano. O
raciocínio, que aparenta ser uma defesa da democracia, peca pela base e
segue a mesma linha do mantra petista de que “eleição sem Lula é golpe”. [dizem que Temer é tão prudente no falar que antes de dar um bom dia ele analisa todas as implicações de dar o bom dia ou não; mais uma vez fica provado, devido algumas asneiras ditas por Temer, que muitos que falam pouco, quando decidem falar é para dizer o que não devem. Caso típico foi o comentário feito por Temer e referido no inicio deste parágrafo.]
Se
o ex-presidente for impedido de se candidatar, terá sido em decorrência
de uma lei, e não há possibilidade de uma legislação em vigor valer
para uns e não para outro, mesmo que esse outro seja um líder popular e
ex-presidente da República. Ao contrário, esses atributos só fazem
aumentar sua responsabilidade diante da sociedade e, consequentemente, a
gravidade de sua culpa. Condenado em primeira instância pelo
juiz Sérgio Moro, os petistas e Lula resolveram denunciar não apenas uma
suposta parcialidade do juiz de Curitiba, como também dos
desembargadores do TRF-4, que julgarão seu recurso na próxima semana. Se
para Lula não há juízes isentos, ou se apenas sua absolvição
demonstrará que no Brasil a Justiça é independente, estaríamos diante de
um impasse institucional grave. É o mesmo que dizer que somente as
urnas podem condená-lo, como sugere o presidente Michel Temer.
Como
se sabe, as urnas não absolvem ninguém, pois se assim fosse diversos
deputados hoje envolvidos na Operação Lava-Jato, alguns condenados como
Eduardo Cunha, teriam um salvo-conduto como vencedores de eleições. A
Lei da Ficha Limpa, projeto de lei de iniciativa popular que reuniu
cerca de 1,6 milhão de assinaturas, teve o objetivo de impedir que
candidatos já condenados por um colegiado de juízes (segunda instância)
pudessem disputar a eleição, adequando as regras de elegibilidade à
necessidade de moralidade dos agentes públicos.
Não é uma
legislação autoritária. Foi concebida pela sociedade, apoiada por
parlamentares que assumiram a autoria da proposta, aprovada pela Câmara e
Senado e sancionada pelo então presidente Lula. [que a tornou autoritária, absurda mesmo, foi o Supremo quando concedeu a mesma caráter retroativo até mesmo para punir políticos já punidos por leis existentes na época em que cometeram o delito - mesmo assim, no caso do condenado Lula da Silva, ela não estará retroagindo.]
Merval Pereira - O Globo
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domingo, 21 de janeiro de 2018
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