O Estado de S.Paulo
Reunião foi do balacobaco e ministro da Saúde tem de fazer o que dr. Jair manda
Nada faz mais sentido, com as versões oscilando entre inacreditáveis e
ridículas. Mas vamos ao principal: o vídeo da reunião ministerial de 22
de abril confirma toda a versão do ex-ministro Sérgio Moro e deixa o
presidente Jair Bolsonaro na patética situação de alegar que não falou
em Polícia Federal, só em PF... Ah, bem!
[PERGUNTA-SE: Será que o ministro Celso de Mello, em nome de um direito dos brasileiros saber onde estão metidos, vai autorizar a divulgação integral do vídeo e com isso METER, ENFIAR DE CABEÇA PARA BAIXO, os brasileiros em um poço sem fundo?
na saúde e mais ainda na economia?]
O trecho divulgado pela Advocacia Geral da União, que defende Bolsonaro,
deixa tudo em pratos limpos. Bolsonaro não apenas citou a PF como a
citou em primeiro lugar. E todo o contexto não deixa dúvidas: “querem
F.... com ele e a família”, é preciso cuidar da segurança da família e
dos amigos.
O órgão responsável pela segurança pessoal da família não é a Polícia
Federal (ok, a PF), é a Agência Brasileira de Inteligência (Abin),
vinculada ao GSI. E nem a PF nem a Abin cuidam da segurança de amigos,
vamos convir. Logo, o presidente não estava falando da segurança física
nem da Abin. Estava falando, sim, da PF. E os desdobramentos confirmam à
sobeja. “Vou interferir. Ponto final”, avisou o presidente. E interferiu. Onde?
Na PF. Quem foi demitido foi o diretor geral da PF, delegado Maurício
Valeixo, não o também delegado Alexandre Ramagem, da Abin, que chegou,
inclusive, a ser nomeado para a vaga de Valeixo. O presidente promoveu
quem não estava cuidando direito da segurança pessoal da família e dos
amigos?! Não.
Assim, o presidente usa nomes falsos em exames de covid-19, demora meses
para entregar os laudos à Justiça, diz que não falou na Polícia
Federal, mantém a versão sem sentido da “segurança pessoal”. Dr. Jair,
médico renomado, também insiste em desconsiderar estudos científicos do
mundo todo para impor o uso da cloroquina em pacientes iniciais, como
insiste na sua cruzada contra o isolamento social. E instiga a guerra
contra governadores, que “querem quebrar a economia para atingir o meu
governo”. Non sense.
Saiu Luiz Henrique Mandetta, entrou Nelson Teich e nada mudou. O
presidente exige que o ministro da Saúde, seja quem for, faça o que ele
próprio tem na cachola. A Dra. Damares Alves topa o jogo, falando em
“milagre da cloroquina”. Mas, se insistir em nomear um general para o
Ministério, Bolsonaro vai criar uma saia justa. O estudo mais completo,
claro e realístico sobre a importância do isolamento social foi feito
pelo... Exército. Um ministro-general vai seguir os estudos científicos
ou os achismos do presidente?
A semana, portanto, começa sob duas expectativas. Quem será e o que vai
dizer e fazer o novo ministro da Saúde num momento dramático da
pandemia?
O relator Celso de Mello, do STF, vai quebrar o sigilo
integral ou só parcial da reunião do dia 22? [o decano do STF certamente tem responsabilidade com o Brasil, com o Poder Judiciário, de cuja chefia é o decano, o que fortalece o entendimento, a esperança, de que autorizará a divulgação apenas e tão somente da parte que envolver o presidente Bolsonaro e Sérgio Moro.
Divulgar outras partes em nada contribuirá para que encontrem crimes em alguns atos do presidente Bolsonaro - atos necessários ao exercício de suas atribuições constitucionais - mas, contribuirá para comprometer relações internacionais do Brasil e até mesmo a ordem pública.
Agora mesmo, funcionários do Banco do Brasil estão querendo processar o ministro Guedes por este ter dito durante a tal reunião que " “vender logo a porra do BB”.
Desaforos, palavrões ocorrem em reuniões, mesmo não sendo necessários e convenientes, e quando lá pronunciados não possuem o impacto negativo que causam quando revelados, especialmente uma divulgação sujeita maximizar o lado negativo , de algo que quando emitido foi um mero desabafo.]
Há quem defenda que ele
libere geral, em nome da transparência, há quem ache melhor a divulgação
em parte, em nome da segurança e da imagem do Brasil.
Curiosos foram os argumentos do procurador geral Augusto Aras, contra a
divulgação integral: trata-se de um “arsenal de uso político” e de
“instabilidade pública”, “proliferação de querelas” e de “pretextos para
investigações genéricas sobre pessoas”. A conclusão é que a reunião foi
do balacobaco. Além do presidente falando palavrão, mostrando que é
capaz de qualquer coisa para proteger a família – o que consta dos
trechos da AGU –, há ministros falando qualquer coisa para agradar ao
presidente. [o chefe da PGR pode não ter sido feliz na escolha dos argumentos, mas o decano, cônscios dos seus deveres e responsabilidades de cidadão, de magistrado, de patriota, não vai querer encerrar sua carreira contribuindo para autorizar a divulgação de fatos negativos para a imagem do Brasil, sua Pátria e de todos nós, especialmente em uma ocasião que os horrores de um morticínio e de uma recessão econômica nos ronda.
Que o Brasil está sendo afetado por tais malefícios é fato, não havendo dúvidas, que a tendência é que o sofrimento dos brasileiros perdure por alguns anos, tempo este que inevitavelmente será agravado por qualquer imagem negativa do Brasil que venha a ser divulgada.
Qualquer publicidade negativa, gerará efeito multiplicador da catástrofe.]
Um verdadeiro vale tudo com provocações gratuitas contra o maior
parceiro comercial do Brasil, proposta de botar na cadeia os onze
ministros do Supremo, a ideia de prender junto os governadores. Celso de
Mello, portanto, vai ter de decidir se os brasileiros têm ou não o
direito de saber onde estão metidos e se o mundo precisa saber o que
está ocorrendo no Brasil.
[fechando: Será que o ministro Celso de Mello, em nome de um direito dos brasileiros saber onde estão metidos, vai meter, enfiar, os brasileiros em um poço sem fundo? na saúde e mais ainda na economia?]
Eliane Cantanhêde, colunista - O Estado de S. Paulo