O Estado de S. Paulo
Na guerra
do ‘desequilibrado’ com o ‘despreparado’, Bolsonaro esquece Guedes
O
presidente Jair
Bolsonaro desautoriza Paulo Guedes num dia e no outro também e ontem o ministro foi o
último a saber do encontro do chefe e do general Luiz Eduardo Ramos com seus
dois maiores inimigos, o deputado Rodrigo Maia e o ministro Rogério
Marinho. Soube por uma foto em que só
aparecia Maia. À vontade, íntimo da “casa”, o fotógrafo foi Marinho.
Guedes
acusa Maia de boicotar as privatizações, Maia chama Guedes de “desequilibrado”
e Guedes ataca Marinho como “despreparado”, por admitir publicamente furar o
teto de gastos. Logo, a coisa está animada na cúpula do governo, com o
presidente no meio de uma guerra entre o “desequilibrado” e o “despreparado”.
Ou melhor, no centro.
O
tema da reunião, informou-se, foi de onde tirar dinheiro para o Renda
Cidadã, mas como assim? O ministro da Economia, dono da chave do cofre, não
estava presente, não foi convidado, nem sequer foi comunicado. E chiou. Como
anda com os erros à flor da pele, envolto em dúvidas e convivendo dia a dia com
a insegurança da própria equipe, dá para imaginar que a chiadeira não foi lá
das mais calmas e elegantes.
Por enquanto o que temos, desde o dia em que o ex-Posto Ipiranga manifestou pela primeira vez sua obsessão com a CPMF, é uma política errática que com a pandemia e o esforço do deputado Maia em atrapalhar a governabilidade do Brasil, piora a cada dia.]
Na verdade, o que ministros diziam de Moro às vésperas da queda dele é o que dizem agora de Guedes: um pilar do governo; o presidente sabe a importância que ele tem; aliás, gosta muito dele, pessoalmente; a chance de ele sair é zero... Era zero com Moro e é zero com Guedes, mas só até a próxima curva. Paulo Guedes é teimoso e duro na queda, não vai engolir desaforo calado, como Moro, e depois sair atirando. Ele está guerreando pela sua posição a céu aberto, botando a boca no trombone e se esforçando para manter unida o que resta da equipe econômica, depois da “debandada” que lhe tirou os secretários da Receita, do Tesouro, das Privatizações e da Desburocratização.
Só conseguiu salvar o da Fazenda, que recebeu “cartão vermelho” do presidente, mas se manteve – com o compromisso de boca fechada. Esse compromisso Bolsonaro não vai arrancar de Guedes. Ficando ou saindo, ele vai continuar sendo Guedes, sem papas na língua. O script continua como previsto: depois de perder uma atrás da outra no governo e passar a ser sistematicamente criticado no mercado e na mídia por falar muito e entregar pouco, Guedes sobe e desce, sobe e desce, numa montanha-russa. Como na queda de Moro, ministros e assessores penduram-se no telefone para jurar que Guedes está firme feito uma rocha, mas assim mesmo começa a bolsa de apostas para lhe suceder, que nem vale citar aqui, para não botar mais fogo no circo.
Mais do que nomes, aliás, tem-se uma certeza: não será nenhum nome óbvio. E por que essa certeza? Basta ver como foram as escolhas para Educação, Saúde e Supremo: Carlos Alberto Decotelli, Milton Ribeiro, Eduardo Pazuello e Kassio Nunes. Nomes fora de qualquer lista, soprados ao ouvido sensível do presidente, que leva a sério quem toma tubaína com ele e está cada vez mais se lixando para a gritaria de robôs bolsonaristas, ou chororô de derrotados. E não se assustem com um sucessor de Guedes do Centrão, ou apadrinhado pelo grupo. Sinto informar. Guedes ainda não perdeu, mas o Centrão já venceu!
Eliane Cantanhêde, jornalista - O Estado de S. Paulo