Blog Prontidão Total NO TWITTER

Blog Prontidão Total NO  TWITTER
SIGA-NOS NO TWITTER
Mostrando postagens com marcador Eliane Cantanhêde. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Eliane Cantanhêde. Mostrar todas as postagens

sábado, 11 de março de 2023

O Foro de São Paulo em ação - Revista Oeste

Flávio Gordon

A apoio petista a Ortega e os navios iranianos no Brasil 
 
 
 Luiz Inácio Lula da Silva, na abertura do evento que deu origem ao Foro de São Paulo, com os membros da direção petista (a partir da esq.): Marco Aurélio Garcia, João Machado, José Dirceu e Luiz Gushiken, em 2 de julho de 1990 | Foto: Montagem Revista Oeste/Reprodução/ Canal Contra Mola no YouTube
Luiz Inácio Lula da Silva, na abertura do evento que deu origem ao Foro de São Paulo, com os membros da direção petista (a partir da esq.): Marco Aurélio Garcia, João Machado, José Dirceu e Luiz Gushiken, em 2 de julho de 1990 | Foto: Montagem Revista Oeste/Reprodução/ Canal Contra Mola no YouTube 

Mahmoud Ahmadinejad: — “Precisamos que a Argentina compartilhe conosco sua tecnologia nuclear. Sem a colaboração deles será impossível
avançar em nosso programa.”
Hugo Chávez: — “Farei isso, companheiro.”
Ahmadinejad: — “Não se preocupe com os custos dessa operação.
O Irã respaldará com todo o dinheiro necessário
para convencer os argentinos.”
Chávez: — “Eu me encarregarei pessoalmente disso.”

(Citado em Hugo Chávez, o Espectro: Como o Presidente
Venezuelano Alimentou o Narcotráfico, Financiou o Terrorismo e
Promoveu a Desordem Global
, de Leonardo Coutinho) 

No meu artigo de 13 de janeiro, mostrei como o Foro de São Paulo, comando estratégico do movimento comunista latino-americano, era um elemento fundamental para a compreensão da política externa do primeiro ciclo do regime lulopetista (2003-2016). 
Estava por trás, por exemplo, da recorrente e vultosa transferência de dinheiro público brasileiro tungado do assim chamado “contribuinte” — para ditaduras companheiras, como as de Cuba, Venezuela e Nicarágua. Relembrei que essa política não era realizada de modo regular e legítimo, como uma relação entre Estados, sujeita ao escrutínio das instituições democráticas, notadamente do Congresso e do Ministério Público. Como admitiu em 2005 o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em discurso comemorativo pelos 15 anos do Foro, tratava-se em vez disso de “uma ação política de companheiros”, conduzida “sem que parecesse e sem que as pessoas entendessem qualquer interferência política”. 
  
Naquele meu artigo, sugeri também que, uma vez tendo retomado o poder (“o que é diferente de ganhar uma eleição”, como alertou José Dirceu) em quase todos os países do continente, a entidade continuaria sendo o grande fator explicativo para muito do que Lula e o PT fariam em seu novo ciclo no poder. Dito e feito. 
Nos últimos dias, a sociedade brasileira presenciou dois episódios que, se deveras surpreendentes para os incautos e os maridos traídos, eram até mesmo previsíveis aos que conhecem a história e a natureza do Foro de São Paulo.  
O primeiro episódio é a indecente recusa do governo petista em assinar declaração da ONU condenando a ditadura comunista de Daniel Ortega pelos inúmeros crimes contra a humanidade cometidos na Nicarágua
O segundo, a ancoragem de navios de guerra iranianos no Porto do Rio de Janeiro, uma provocação direta aos EUA (que, por meio da embaixadora norte-americana, Elizabeth Bagley, havia solicitado ao governo brasileiro que não permitisse) e a Israel, país-alvo de reiteradas ameaças genocidas por parte do regime iraniano, que há muito busca aprimorar seu programa nuclear para fins bélicos. 
 
Quanto ao primeiro ponto, convém lembrar que, durante as eleições passadas, mais precisamente no dia 4 de outubro de 2022, o ministro do TSE Paulo de Tarso Sanseverino, atendendo a um pedido da chapa Lula-Alckmin, censurou tuítes e vídeos sobre a relação entre o petista e o ditador sandinista. Em sua decisão, o juiz justificou que as publicações censuradas “transmitem de forma intencional e maliciosa mensagem de que o candidato Luiz Inácio Lula da Silva é aliado político do ditador da Nicarágua, Daniel Ortega”. 
Graças a isso, parte do eleitorado foi privado de uma informação importante sobre um dos candidatos. 
Uma informação absolutamente verdadeira, ao contrário do que afirmou Sanseverino, que impediu a livre circulação de uma real news e, assim, favoreceu indevidamente o presidenciável petista, cuja campanha foi construída sobre a falsa imagem de defesa da democracia. 

Sim, Luiz Inácio Lula da Silva é um aliado histórico do ditador Daniel Ortega, que com ele e Fidel Castro foi um dos fundadores e membros originais do Foro. Para parafrasear a autoridade eleitoral, esse é um fato sabidamente verídico, e não há despacho judicial capaz de riscá-lo da história. A recusa petista em condenar os crimes do companheiro sandinista apenas o confirma. Quem nunca deixou de reafirmar essa aliança, aliás, tem sido o próprio Lula. Senão vejamos. 

Em agosto de 2007, iniciando seu segundo mandato, Lula fez a primeira visita oficial de um presidente brasileiro à Nicarágua.  
Logo que pôs os pés na base aérea da capital, Manágua, o petista declarou-se emocionado por voltar àquele lugar repleto de significado histórico. “Aqui estive em 19 de julho de 1980, participando do primeiro aniversário da revolução sandinista. Aqui conheci Fidel Castro pela primeira vez. Vivi todo o trabalho que o presidente Daniel Ortega fez naquele momento para consolidar a Nicarágua como país soberano” — disse então o mandatário brasileiro, acrescendo que, depois daquele primeiro encontro, havia se reunido com Ortega outras dezenas de vezes.   
O amigo de Ortega concluiu sua fala na base aérea de Manágua com a promessa de que o Brasil estava disposto a firmar “tantos acordos quantos forem necessários para que possamos contribuir para o crescimento, o desenvolvimento econômico e a justiça social aqui na Nicarágua”. Como parte desses acordos — sempre decididos em “ações políticas de companheiros”, para repetir a confissão de Lula em 2005 —, foi apresentado em 2009 um plano de construção da Usina Hidrelétrica de Tumarin, com custo inicial previsto de US$ 500 milhões (mais tarde atualizado para US$ 1,2 bilhão) e participação do BNDES. O plano fora elaborado pela Eletrobrás e uma empresa afiliada à empreiteira Queiroz Galvão, cujo presidente, Ildefonso Colares Filho, bem como o diretor Othon Zanoide de Moraes Filho viriam a ser presos pela Lava Jato, em agosto de 2016. Meses antes, constatando irregularidades no acordo, o TCU (Tribunal de Contas da União) já havia ordenado a suspensão do repasse de recursos. 

Naquele mesmo ano de 2007, meses depois da visita à Nicarágua, o presidente brasileiro participou do Encontro de Governadores da Frente Norte do Mercosul. Em seu discurso, Lula frisou a importância do Foro de São Paulo na ascensão da esquerda ao poder na América Latina, e destacou, entre outros, o nome de Ortega:  “Nós fizemos uma pequena revolução democrática na América do Sul e na América Latina. Eu, por exemplo, conheci o [Fidel] em um encontro que fizemos em Cuba. Tinha acabado de ser preso, por conta do golpe, e acabado de ser liberado. Conheci o Chávez num encontro do Foro de São Paulo, como conheci também o Daniel Ortega, como conheci tantos companheiros da Argentina, do Chile, do Uruguai, do Paraguai, da Bolívia, do Equador, da Venezuela, da Colômbia. Qual é a mudança que houve nesses 18 anos [desde a fundação do Foro]? Olhem o mapa da América do Sul hoje. O que aconteceu na América do Sul é um fenômeno político que, possivelmente, os sociólogos levarão um tempo para compreender, porque aconteceu tão rápido a mudança que houve, uma mudança extremamente importante”. 

No dia 28 de julho de 2010, Ortega retribuiu a visita a Lula. Em recepção no Itamaraty, o brasileiro chegou a brincar com o amigo nicaraguense que ambos integravam um “eixo do mal” (alusão à expressão com que o presidente norte-americano George W. Bush qualificou a rede de países fomentadores de terrorismo). Relembrando o fato de ter sido o primeiro presidente do Brasil a visitar a Nicarágua, Lula enfatizou a aliança entre os projetos políticos petista e sandinista: “Nossa relação é parte integrante de um eixo latino-americano e caribenho, em franca expansão, que busca modelos de desenvolvimento progressistas, consistentes e sustentáveis. Queremos criar, em paz, oportunidades para todos, e não só para alguns”. 

Em julho de 2017, quem esteve em Manágua foi Gleisi Hoffman, para participar do 23º encontro do Foro de São Paulo. Na sua fala, a presidente petista celebrou a vitória eleitoral de Ortega (já então altamente suspeita, envolta numa série de irregularidades) e agradeceu nominalmente “aos companheiros da Frente Sandinista de Libertação Nacional por auspiciar este encontro”. 

Crimes contra a pátria
No ciclo “eleitoral” seguinte, no qual Ortega prendeu toda a oposição e concorreu sozinho, o Foro emitiu um comunicado repudiando uma resolução da OEA (Organização dos Estados Americanos) que condenava a ditadura de Ortega, e exigindo que a entidade respeitasse a soberania nicaraguense. Publicado em 16 de junho de 2021, dizia o comunicado: “Esta falsa alegação não encontra respaldo no sistema legal nicaraguense, pois as pessoas envolvidas são investigadas por crimes contra a pátria, com base numa lei de outubro de 2020, aprovada por um Poder Legislativo legitimamente eleito, que busca defender a soberania do país contra os avanços de forças extremas e imperialistas”.  

Meses antes, em discurso realizado após o ministro do STF Edson Fachin anular todas as suas condenações na Lava Jato, Lula havia citado nominalmente o Foro em seus agradecimentos:Quero agradecer às pessoas, companheiro Aloizio Mercadante, do Grupo de Puebla. Líderes da América Latina inteira, que foram solidários e confiaram na minha inocência. Quero agradecer ao Foro de São Paulo, que é uma organização da esquerda latino-americana. E quero agradecer a muitos líderes políticos”.  

Meses depois, o PT emitiria uma nota saudando a vitória de Ortega nas “eleições” nicaraguenses daquele ano. Com medo de sua repercussão negativa em um período eleitoral que se aproximava, o partido apagou o documento, e sua presidente, Gleisi Hoffman — a mesma que saudara a vitória do “companheiro” Ortega quatro anos antes —, tuitou alegando que a nota “não havia sido submetida à direção partidária”. Sem se referir em nenhum momento ao conteúdo da nota, e sem, portanto, emitir qualquer juízo sobre as prisões políticas comandadas por Ortega, a petista fez justo o contrário, repetindo o teor do comunicado emitido pelo Foro em junho, contra a resolução da OEA. “A posição PT em relação a qualquer país é a defesa da autodeterminação dos povos, contra interferência externa e respeito à democracia, por parte de governo e oposição”. 

Passados alguns dias, Lula deu uma célebre entrevista ao jornal El País, na qual, segundo o velho “centralismo democrático” leninista, reafirmou a linha partidária e repetiu o jargão da defesa da autodeterminação dos povos. Em seguida, fez a pergunta que espantou até mesmo a jornalista esquerdista do jornal espanhol: “Por que Angela Merkel pode ficar 16 anos no poder e Daniel Ortega não?” — disse o petista, deliberadamente omitindo o fato de que, ao contrário do sandinista, Merkel não havia mandado prender toda a oposição.  

Em outubro de 2022, foi a vez de Ortega parabenizar o “companheiro” e “irmão” Lula pela vitória no primeiro turno do pleito, descrita como “um momento de triunfo para as famílias e o povo do Brasil”. Repetindo Ortega em escala reduzida, o petista não havia conseguido prender toda oposição antes de concorrer, limitando-se a calar boa parte dela por via juristocrática.  

Diante de todo esse histórico, é deveras curioso ver jornalistas como Eliane Cantanhêde dizendo que “o Brasil não pode abandonar as vítimas de Ortega” e que “elas precisam de nós”. Ora, se a preocupação da jornalista é sincera, talvez ela não devesse ter apoiado com tanto afinco, sob o pretexto da defesa da democracia, justo o candidato com essa retrospectiva de amizade e aliança com o ditador nicaraguense. Afinal, assim como não se podem plantar sementes de mamão e esperar colher bananas, também não é possível esperar uma real defesa da democracia de quem se construiu politicamente em associação com notórias ditaduras socialistas, vendo-se como “parte integrante” de um mesmo “eixo latino-americano e caribenho”. 

Quanto ao segundo ponto, a ancoragem dos navios iranianos, eis outro caso preocupante, que nos remete também ao Foro de São Paulo, e sobretudo à maneira como, por meio dele, o então ditador venezuelano Hugo Chávez fez da América Latina um porto seguro para a prática de toda sorte de crimes transnacionais, incluindo o narcotráfico e o terrorismo. Compreende-se perfeitamente o temor dos EUA — que, via senador Ted Cruz, ameaçou sancionar o Brasil — e de Israel. Afinal, não é de hoje a aproximação entre governos socialistas latino-americanos e o regime iraniano. 

Como mostra Leonardo Coutinho no imprescindível Hugo Chávez, o Espectro: Como o Presidente Venezuelano Alimentou o Narcotráfico, Financiou o Terrorismo e Promoveu a Desordem Global, o falecido ditador venezuelano foi o responsável por costurar um acordo clandestino de cooperação nuclear entre a Argentina e o Irã, acordo que acabou tendo como desdobramento o assassinato (“suicídio”, segundo a versão oficial) do promotor argentino Alberto Nisman, que investigava a atuação dos Kirchners para acobertar a participação do governo iraniano no atentado contra a Associação Mutual Israelita Argentina (Amia), em 1994. Segundo as diversas fontes e os documentos acessados por Coutinho, o acordo incluía a transferência de tecnologia, informação e material nuclear argentino para o programa iraniano, uma demanda que Mahmoud Ahmadinejad fez diretamente a Hugo Chávez. 

“Enviado aos Estados Unidos, fui apresentado a ex-chavistas exilados que me descreveram em detalhe as relações clandestinas entre esses governos” — escreve Coutinho. “De um deles veio o relato de que Venezuela e Irã se associaram para comprar segredos nucleares da Argentina. O homem era a testemunha ocular de uma conspiração que poderia estar na origem da morte do procurador, que, ao denunciar Cristina Kirchner e seu chanceler, Héctor Timmerman, dava sinais inequívocos de que seu governo havia feito uma inflexão em favor dos autores do atentado contra a Amia. Quanto mais me aprofundava, mais percebia a presença de Chávez em todo o desarranjo global que começava a se desenhar (…) Havia uma relação espúria entre a Casa Rosada e Teerã, e Hugo Chávez oferecia a fachada para despistar o plano que levaria Teerã a concluir seu programa nuclear. Em meio à catarse que o relato causou na Argentina, recebi milhares de páginas até então mantidas sob sigilo pelas autoridades argentinas. Trata-se dos principais arquivos produzidos pela inteligência argentina sobre o caso, a base da investigação de Nisman. Além disso, um backup de milhares de horas de escutas telefônicas monitoradas pela equipe do procurador bem como uma cópia integral do HD de seu notebook pessoal. Um labirinto de dados que, até o presente momento, em que descrevo esse processo, não fui capaz de percorrer completamente. Apesar disso, foi possível encontrar nesses documentos oficiais pistas e provas que permitiram calibrar as investigações e, aos poucos, tornar públicas algumas das relações criminosas identificadas pelos investigadores argentinos. O uso do Brasil como centro logístico para a preparação de atentados e os pontos de contato entre as redes de extremismo islâmico, o narcotráfico e o modo como todos os países da região eram afetados ou utilizados como bases dessas organizações — cada uma dessas novas descobertas demandava uma nova linha de investigação, uma nova série de entrevistas.” 

Os informantes de Coutinho, um grupo de ex-chavistas no exílio, contaram-lhe detalhes sobre o encontro entre Ahmadinejad e Chávez, no qual o primeiro acionou o amigo venezuelano a fim de obter ajuda da Argentina para o desenvolvimento do programa nuclear iraniano. No mesmo encontro, os dois presidentes decidiram criar um banco binacional, e Chávez abriu o sistema financeiro de seu país para que Teerã contornasse as diversas resoluções do Conselho de Segurança da ONU. “Em julho de 2015, um ex-executivo da PDVSA que se juntou ao grupo de exilados disse que dezenas de malas ‘desceram da Venezuela’ rumo ao sul” — escreve Coutinho. “Segundo ele, além das intermediações de pagamentos do Irã para a Argentina, os chavistas patrocinaram campanhas de Evo Morales, na Bolívia, Pepe Mujica, no Uruguai, Fernando Lugo, no Paraguai, e de Luiz Inácio Lula da Silva, no Brasil (…) Os presidentes da Venezuela e do Irã sabiam que não bastava criar um corredor seguro entre os dois países. Para que a operação fosse ainda mais eficiente, o país latino-americano deveria funcionar como um hub, para que os passageiros pudessem alcançar o maior número possível de destinos estratégicos. Para isso, Hugo Chávez deu ordens expressas para que Nicolás Maduro, então ministro das Relações Exteriores, colocasse em prática dentro da chancelaria um plano para que o trânsito de extremistas fosse facilitado.” 

Em face desse histórico de acordos clandestinos envolvendo os membros do Foro de São Paulo e governos pró-terrorismo como o Irã — que incluíram a transferência, via instituições de fachada, de segredos nucleares —, é perturbador imaginar o que pode estar por trás da ancoragem dos navios iranianos em águas brasileiras. O evento foi, aliás, ocasião de uma solenidade ocorrida a bordo da fragata iraniana Iris Dena, da qual fizeram parte representantes do governo brasileiro. Terá sido palco também de novas “ações políticas entre companheiros”? É novamente nesse tipo de “eixo” que o Brasil aceitará ser inserido por obra de seu governo socialista? Em se tratando do relacionamento com um regime que, ademais de financiar o terrorismo ao redor do mundo, tem verdadeira obsessão com a construção de seu arsenal nuclear (um projeto que viola vários acordos internacionais dos quais nosso país é signatário), cabe à sociedade, por meio de seus representantes e de suas instituições, manter-se vigilante. 

Leia também “A morte do Carnaval”

 Flávio Gordon, colunista - Revista Oeste

 

domingo, 13 de novembro de 2022

Comentarista da GloboNews desperta a ira da esquerda

Eliane Cantanhêde criticou Janja

A jornalista Eliane Cantanhêde, durante crítica a Janja - 11/11/2022 | Foto: Reprodução/GloboNews
A jornalista Eliane Cantanhêde, durante crítica a Janja - 11/11/2022 -  Foto: Reprodução/GloboNews

Depois de criticar o “excesso de espaço” da futura primeira-dama, Janja, no governo de transição do presidente eleito, Lula, a comentarista de política da GloboNews Eliane Cantanhêde tornou-se alvo da fúria da esquerda nas redes.

A jornalista também interpelou por que Janja esteve sentada ao lado de Lula, o vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB), e a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, durante encontro com aliados na semana passada, em Brasília. “Ela estava ali sentada, mas não é presidente do PT, líder política ou presidente de partido”, observou Eliane, no programa Em Pauta, transmitido na sexta-feira 11. “Enfim, por que ela estava ali? Qual era o papel da primeira-dama?” [Ciro Gomes definiu bem o papel de uma primeira-dama quando,  em passado recente,  foi questionado: 'ela dorme comigo' - supõe-se que no sentido bíblico; 
já para a futura primeira-dama, do eleito, talvez o sentido literal seja mais provável.]

Eliane citou a socióloga Ruth Cardoso, ex-mulher do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, como exemplo de primeira-dama. A jornalista ressaltou o “brilho próprio” de dona Ruth e que ela “não tinha voz nas decisões políticas”.

“Se tinha protagonismo, era a quatro chaves, no quarto do casal”, disse Eliane. “Já incomoda, porque Janja vai começar a participar de reunião, dar palpite e, daqui a pouco, vai dizer ‘esse aqui vai ser ministro, esse aqui não pode’. Isso dá confusão. Se é assim na transição, imagina quando virar primeira-dama.”


Nas redes sociais, a jornalista da GloboNews, que é crítica do presidente Jair Bolsonaro, foi atacada pela presidente nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann. “Apavora-me o machismo incrustado na cabeça das mulheres ditas esclarecidas”, publicou Gleisi, no Twitter. “Desprezível, a fala de Eliane Cantanhêde. Ter opinião e participação política é direito das mulheres.”

De esquerda, o colunista do jornal Folha de S.Paulo Thiago Amparo afirmou que “a referência a quatro paredes dá uma análise de discurso sobre submissão”. No Twitter, esquerdistas fizeram subir a hashtag “Respeita a Janja, Cantanhêde”.

Leia também: “Globo inquieta”, reportagem publicada na Edição 85 da Revista Oeste

 

terça-feira, 6 de outubro de 2020

O último a saber - Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

Na guerra do ‘desequilibrado’ com o ‘despreparado’, Bolsonaro esquece Guedes

O presidente Jair Bolsonaro desautoriza Paulo Guedes num dia e no outro também e ontem o ministro foi o último a saber do encontro do chefe e do general Luiz Eduardo Ramos com seus dois maiores inimigos, o deputado Rodrigo Maia e o ministro Rogério Marinho. Soube por uma foto em que só aparecia Maia. À vontade, íntimo da “casa”, o fotógrafo foi Marinho.

Guedes acusa Maia de boicotar as privatizações, Maia chama Guedes de “desequilibrado” e Guedes ataca Marinho como “despreparado”, por admitir publicamente furar o teto de gastos. Logo, a coisa está animada na cúpula do governo, com o presidente no meio de uma guerra entre o “desequilibrado” e o “despreparado”. Ou melhor, no centro.

O tema da reunião, informou-se, foi de onde tirar dinheiro para o Renda Cidadã, mas como assim? O ministro da Economia, dono da chave do cofre, não estava presente, não foi convidado, nem sequer foi comunicado. E chiou. Como anda com os erros à flor da pele, envolto em dúvidas e convivendo dia a dia com a insegurança da própria equipe, dá para imaginar que a chiadeira não foi lá das mais calmas e elegantes.

O Planalto e Bolsonaro tiveram um trabalhão para convencê-lo de que se tratava de um cafezinho inocente e que o presidente mantém inalterados tanto a defesa do teto de gastos quanto a confiança e apreço pelo seu Posto Ipiranga. Se o próprio Guedes tem lá suas dúvidas, certamente o mercado e a opinião pública não ficam atrás. Quando se pergunta no governo qual a diferença entre Sérgio Moro e Paulo Guedes, a resposta é uníssona: Moro, segundo eles, com replique nas redes bolsonaristas, foi “desleal”, “mau caráter”, uma “surpresa” [ruim, desagradável, intolerável]. enquanto Guedes não é nada disso e é praticamente indemissível. [A demissão de Guedes se impõe por várias razões, uma delas - obviamente, : não a única - a necessidade da governabilidade e do Brasil ter uma política econômica do Poder Executivo
Por enquanto o que temos, desde o dia em que o ex-Posto Ipiranga manifestou pela primeira vez sua obsessão com a CPMF, é uma política errática que com a pandemia e o esforço do deputado Maia em atrapalhar a governabilidade do Brasil, piora a cada dia.]

Na verdade, o que ministros diziam de Moro às vésperas da queda dele é o que dizem agora de Guedes: um pilar do governo; o presidente sabe a importância que ele tem; aliás, gosta muito dele, pessoalmente; a chance de ele sair é zero... Era zero com Moro e é zero com Guedes, mas só até a próxima curva. Paulo Guedes é teimoso e duro na queda, não vai engolir desaforo calado, como Moro, e depois sair atirando. Ele está guerreando pela sua posição a céu aberto, botando a boca no trombone e se esforçando para manter unida o que resta da equipe econômica, depois da “debandada” que lhe tirou os secretários da Receita, do Tesouro, das Privatizações e da Desburocratização. 

Só conseguiu salvar o da Fazenda, que recebeu “cartão vermelho” do presidente, mas se manteve – com o compromisso de boca fechada. Esse compromisso Bolsonaro não vai arrancar de Guedes. Ficando ou saindo, ele vai continuar sendo Guedes, sem papas na língua. O script continua como previsto: depois de perder uma atrás da outra no governo e passar a ser sistematicamente criticado no mercado e na mídia por falar muito e entregar pouco, Guedes sobe e desce, sobe e desce, numa montanha-russa. Como na queda de Moro, ministros e assessores penduram-se no telefone para jurar que Guedes está firme feito uma rocha, mas assim mesmo começa a bolsa de apostas para lhe suceder, que nem vale citar aqui, para não botar mais fogo no circo.

Mais do que nomes, aliás, tem-se uma certeza: não será nenhum nome óbvio. E por que essa certeza? Basta ver como foram as escolhas para Educação, Saúde e Supremo: Carlos Alberto Decotelli, Milton Ribeiro, Eduardo Pazuello e Kassio Nunes. Nomes fora de qualquer lista, soprados ao ouvido sensível do presidente, que leva a sério quem toma tubaína com ele e está cada vez mais se lixando para a gritaria de robôs bolsonaristas, ou chororô de derrotados. E não se assustem com um sucessor de Guedes do Centrão, ou apadrinhado pelo grupo. Sinto informar. Guedes ainda não perdeu, mas o Centrão já venceu!

Eliane Cantanhêde, jornalista - O Estado de S. Paulo


domingo, 27 de setembro de 2020

Outubro efervescente - Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

Eleição, economia, pandemia e o novo ministro terrivelmente amigo no STF

Outubro será agitado, com as campanhas eleitorais aprendendo a contornar a pandemia (que ainda mata mais de “dois Boeings” por dia), o governo e o Congresso convergindo para desoneração da folha de pagamentos compensada por um novo imposto e o presidente Jair Bolsonaro se divertindo com a aflição dos muitos candidatos à vaga de Celso de Mello no Supremo, porque ele já tem dois nomes no colete: Jorge Oliveira e André Mendonça.

[o presidente será iluminado pelo BOM SENSO e indicará o mais capaz e um dos menos cotados: IVES GANDRA MARTINS FILHO.

Clique, leia e conteste - obviamente, se tiver argumentos.]

Bolsonaro está no centro de toda essa efervescência, mexendo as peças sem se queimar e entrando no jogo apenas em caso, e na hora, da vitória. Só apoiará candidato para ganhar, só apoiará o novo imposto depois de Paulo Guedes e o Centrão garantirem o resultado e só vai anunciar o novo ministro do STF depois de ter sugado o possível dos candidatos frustrados.

Até aqui, ninguém deu bola para a eleição municipal e o interesse do eleitor continua caindo a cada pleito, mas a tendência é esquentar, com foco óbvio em São Paulo, pelo seu peso político e econômico, no Rio, pela chocante situação de governador e prefeito, e nos neófitos, como o próprio Wilson Witzel, que caíram de paraquedas pelo sopro do bolsonarismo. Elegerão seus candidatos? [sem o menor sentido realizar eleições municipais este ano - além do Brsil estar saindo de uma pandemia, serão gastos milhões que poderiam ser poupados adiando as eleições para 2022 - eleições gerais a cada quatro anos, economia superior a 40%.]

Em São Paulo, Celso Russomanno (Republicanos) conta com Bolsonaro para fugir da sina de sair na liderança e acabar fora até do segundo turno. O prefeito Bruno Covas (PSDB) precisa driblar a frustração pelo segundo lugar e evitar perda de votos para Márcio França (PSB). Jilmar Tatto empurra o PT para o balaio dos nanicos e para o apoio a Guilherme Boulos (PSOL), a novidade de 2020. No Rio, o prefeito Marcello Crivella (Republicanos) está inelegível. Conseguirá reverter a decisão no TSE e manter o apoio de Bolsonaro?

Na economia, Bolsonaro lavou as mãos: Paulo Guedes que se vire. Se articular apoio para a “nova CPMF”, não vai atrapalhar. Guedes recupera liderança e força, o governo comemora a troca dos novatos do PSL pelo trator Centrão e a pergunta que não quer calar é: como desonerar a folha, como Guedes quer, e encorpar o novo Bolsa Família, como Bolsonaro exige, sem furar o teto de gastos nem aumentar a carga tributária? A conta fecha? [Guedes é um ministro que complica e o presidente Bolsonaro é o presidente da República, quer e precisa governar - oposição por oposição, a do Judiciário, do Poder Legislativo e outras são mais que suficientes. Para que manter um ministro que atrapalha ?]

Enquanto isso, Bolsonaro acompanha com prazer o rebuliço em torno da indicação para o Supremo, com as decisões do procurador-geral Augusto Aras sempre sob suspeita por algo que ele jura que não quer e que não vai acontecer, o juiz do Rio Marcelo Bretas repreendido por participar de atos políticos e o plenário do STJ em alvoroço, como sempre, diante de uma vaga na alta Corte. O ministro “terrivelmente evangélico”, porém, afunila para Jorge Oliveira, advogado e policial militar sem credenciais jurídicas compatíveis com o Supremo, mas secretário-geral da Presidência e filho de grande amigo de Bolsonaro. E para André Mendonça, advogado, pastor presbiteriano, ex-advogado-geral da União e atual ministro da Justiça. Transformou a Justiça em órgão de defesa do presidente, mas ainda é bem aceito no STF.

Celso de Mello deixa a Corte em 13 de outubro, após 31 anos, à frente da investigação do presidente por intervenção na PF. Celso, decano que sai, determinou depoimento presencial para Bolsonaro. Marco Aurélio, o novo decano, jogou para o plenário virtual e defendeu depoimento por escrito. O lance seguinte pode ser tirar do virtual (votos por escrito) para o plenário real (ao vivo).

Logo, Bolsonaro vai trocar um ministro ostensivamente crítico por outro terrivelmente amigo e um decano adversário por outro nem tanto e, na presidência, entrou Luiz Fux com a expectativa de maior independência em relação ao Planalto do que Dias Toffoli. O que se sabia de Supremo não se sabe mais. Exemplo: e a prisão após segunda instância, que caiu por um único voto? [ficará como está; até o momento de ser usada por eventual apoiador do presidente Bolsonaro.
neste caso é pautada para o dia seguinte, por um voto volta a ser pela prisão - preso o bolsonarista, assim permanecerá até chegar o momento de ser invocada para um adversário do capitão.]

Eliane Cantanhêde, colunista - O Estado de S. Paulo 


terça-feira, 22 de setembro de 2020

Realidade paralela - Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo 

Bolsonaro vai ser Bolsonaro hoje na ONU, mas, fora do Brasil, quem acredita no que ele diz? 

Seria exagero de retórica dizer que o mundo inteiro estará de olhos e ouvidos abertos para o discurso do presidente Jair Bolsonaro hoje, na abertura da Assembleia-Geral da ONU, mas não há como contestar que raras vezes o mundo esteve tão atento, perplexo e preocupado com o Brasil, insistentemente chamado de “pária internacional”. Em vez de amenizar, o risco é Bolsonaro aprofundar os temores de governos, sociedades e investidores. 

[A Organização das Nações Unidas tem a obrigação de todo ano conceder  palanque mundial ao Presidente da República Federativa do Brasil e que atualmente é JAIR BOLSONARO e tudo que que constar do seu pronunciamento é a posição oficial do Brasil.
Aquele palanque no período de 2003 a 2015, foi desvalorizado, apequenado,  pelos que representaram o Brasil.
Bolsonaro falará em nome dos mais de 210.000.000 de brasileiros - os quase 60.000.000 de votos recebidos pelo capitão o tornam legítimo e único representante da Nação brasileira.
Os que não gostam, não aceitam, terão  que engolir e se acostumar - não sendo necessário que aceitem.
O que os Macron,  presidente da Noruega, a pirralha e outros do mesmo naipe não importa. Cuidem dos seus países e tenham sempre a lembrança que as florestas que possuíam foram eles que destruíram.]

O tema da ONU neste ano é multilateralismo, mas Bolsonaro deve entrar na contramão, ao lado de seu mentor Donald Trump, com críticas à própria ONU, à Organização Mundial da Saúde (OMS), à Organização Mundial do Comércio (OMC) e ao debate sobre questões de gênero. E, claro, ele não perderia a chance de dizer que o Brasil é “um sucesso” (?!) no combate à pandemia, na recuperação da economia e na preservação do ambiente. 

Ninguém se surpreende mais com as falas de Bolsonaro, o surpreendente é que, quanto mais estrangeiros se chocam, mais brasileiros acreditam e até replicam as barbaridades sobre a covid-19, meio ambiente e uma tal ameaça comunista. O documentário O Dilema das Redes explica muita coisa, mas não como tanta gente com diploma, carreira, livros nas estantes e acesso a múltiplos meios de informação compra o que ele diz – sem ruborizar. 

 A covid-19 já atinge 196 países em todos os continentes, com 31 milhões de casos confirmados (na realidade, são muito mais), e vai atingir um milhão de mortos ainda em setembro, mas eles dizem que não é pandemia, só histeria da mídia. Jura? Se não é pandemia, é o quê? E, no Brasil, já estamos chegando a 140 mil mortos, mas o presidente, sem máscara, sorridente, foi aplaudido por produtores rurais ao dizer que o “Fica em casa” é “conversinha mole para os fracos”. 

Amazônia e Pantanal estão em chamas e o avião do presidente teve de arremeter abruptamente por excesso de fumaça em Mato Grosso. O que ele diz? Que há “alguns focos” de incêndio, mas o Brasil é “um exemplo” de preservação. Em fila, o vice Hamilton Mourão e os ministros batem continência. A verdade, porém, é que está muito quente e seco e o risco de incêndio aumenta muito, mas há sérios indícios de incêndios criminosos e o governo foi displicente, imprevidente. 

O Brasil, os fundos internacionais, oito grandes democracias, ex-ministros da Economia, ex-presidentes do Banco Central, os maiores grupos do agronegócio nacional e, evidentemente, ambientalistas das mais variadas tendências e regiões do mundo cobram ações, mas na realidade delirante do presidente, as críticas têm origem “oculta”, com o objetivo de derrubá-lo – como disse ontem o general Augusto Heleno. 

Por fim, o discurso na ONU, gravado, ocorre em meio a mais um fuzuê na política externa, com a visita do secretário de Estado Mike Pompeo a Roraima, de onde lançou ameaças a Nicolás Maduro. Afora Gleisi Hoffmann e um petista ou outro, ninguém apoia Maduro e o regime da Venezuela, mas daí permitir que um terceiro país use o Brasil para atacar um vizinho? A 46 dias das eleições americanas? E quando os EUA vão presidir o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), após 66 anos? Rodrigo Maia considerou uma “afronta”. Fernando Henrique Cardoso e ex-chanceleres classificaram como “utilização espúria do solo nacional”. [a opinião do deputado Maia e do sociólogo e de outros não seriam sequer contadas;
só está sendo contada, considerada, comentada, por ser contra o presidente Bolsonaro = falar mal do nosso presidente, do presidente do Brasil é esporte predileto dos que nada tem a dizer de útil.] E o ministro Ernesto Araújo, que serviu de escada para Pompeo, reagiu com populismo e o “sofrimento do povo venezuelano”. Não colou. E serviu para acordar Câmara, Senado, diplomatas, academia e a mídia. Assim, o discurso de hoje não é só mais um de presidentes brasileiros abrindo, ano a ano, a Assembleia-Geral da ONU, mas uma boa chance para Bolsonaro expor ao mundo quem ele é. Aliás, será que ele acha que a Terra é plana?

Eliane Cantanhêde, colunista - Folha de S. Paulo

terça-feira, 28 de julho de 2020

O candidato Bolsonaro - Eliane Cantanhêde

O Estado de S.Paulo

O governo vai mal, mas a campanha de Bolsonaro à reeleição vai muito bem, obrigada

O governo vai mal, mas a campanha do presidente Jair Bolsonaro à reeleição vai de vento em popa, repetindo os acertos de 2018, mas adaptando o candidato, os aliados, o discurso e as armas às circunstâncias de 2022. O pragmatismo, para evitar o impeachment e garantir maioria parlamentar, mira não só o presente e a governabilidade, mas também o futuro e a sucessão.

Depois de usar o “Jairzinho Paz e Amor” e o retiro da covid-19 para pontes com Judiciário e Legislativo e desanuviar o ambiente político, Bolsonaro volta à rotina diferente. Menos ataques, mais diálogo. Em vez de dividir, somar. No varejo e no atacado: além de apoiadores no Alvorada, viagens pelo País. Segundo o Estadão, Bolsonaro até liberou o funcionamento de 440 rádios comunitárias em março e abril, recorde na década. Para tocar música é que não é...

O “Paz e Amor” passou no primeiro teste: apesar de tudo, de todos e dele mesmo, Bolsonaro segurou seu patamar nas pesquisas, em torno de 30%, e até recuperou uns pontinhos. Mas, na estratégia para 2022, é preciso, a cada desastre, um culpado: governadores, prefeitos e Supremo pelos agora quase 90 mil mortos, [cara colunista: por favor, aponte culpados que não sejam os governadores e prefeitos - com provas - e mostre que os desmandos estaduais e municipais não tiveram o aval, público e indiscutível, do Supremo Tribunal Federal.] o vice Hamilton Mourão pelo desmatamento da Amazônia, Ricardo Salles pelo desmanche do ambiente...

Na mesma toada, transformar derrotas em vitórias. O governo foi contra o Fundeb, apresentou um monstrengo de uma última hora e só se rendeu porque perderia feio. Confirmado o fiasco, cria-se a narrativa: o governo venceu! Um governo da ajuda emergencial de R$ 600 não ficaria contra um fundo para o ensino de milhões de crianças pobres, não é? Os 30% bolsonaristas acreditam piamente. E os beneficiários agregam pontos a esses 30%.


Ato seguinte: reforçar os laços com o Centrão, mas sem perder os bolsonaristas raiz, que não têm muita serventia no Congresso, mas ajudam a manter a ilusão de que Bolsonaro era e continua sendo aquele da família, da religião, contra a velha política e a corrupção. Foi por isso, equilibrar Centrão e bolsonaristas, que Bolsonaro derrubou a deputada Bia Kicis (PSL) da vice-liderança do governo na Câmara, mas depois foi tirar foto sorridente com ela e suspendeu a troca do Major Vitor Hugo, bolsonarista, por Ricardo Barros, do Centrão, na liderança do governo.

Ao mesmo tempo, o presidente usa a Advocacia-Geral da União (AGU) – que não tem nada a ver com isso – para manter no ar as redes bolsonaristas de fake news. Em vez de ajudar, elas passaram a atrapalhar o presidente Bolsonaro, mas ainda serão muito úteis para o candidato Bolsonaro. Como em 2018. Se equilibra bolsonaristas com Centrão no Congresso e convence os protestos golpistas de deixarem de ser golpistas, o presidente cuida também do outro lado: dos críticos. Assim como a AGU, também o Ministério da Justiça está à disposição para seus interesses políticos. Como informa o repórter Rubens Valente, funcionários e estruturas de governo estão produzindo dossiês contra “antifascistas”, ou antibolsonaristas. Inclusive, acreditem, o humanista Paulo Sérgio Pinheiro. [Vale lembrar que é dever do presidente da República ao tomar conhecimento de ilegalidades sendo praticadas contra cidadãos, impedindo que direitos constitucionais sejam exercidos, adotar as medidas necessárias, sendo natural que a AGU seja acionada.]

É preciso saber como Bolsonaro vai retaliar os 152 bispos, bispos eméritos e arcebispos da Igreja Católica que assinam um manifesto contra o que chamam de “mensagens de ódio e preconceito” e aqueles outros “esquerdistas” que criticam seu governo: presidentes de países democráticos da Europa e da América Latina, fundos internacionais de investimento, bancos, grandes empresas, pessoal da Saúde.

Eles não estão ajudando, nada, nada, a reeleição, mas Carlos Bolsonaro, o 02, sabe muito bem como dar um jeito nisso e está se mudando de malas, bagagens e expertise eleitoral para Brasília. O “gabinete do ódio” assume nova roupagem: é o comitê de campanha, a mil por hora.

Eliane Cantanhêde, jornalista - O Estado de S. Paulo

sexta-feira, 3 de julho de 2020

Devassa - Eliane Cantanhêde

O Estado de S.Paulo


A guerra da PGR contra a Lava Jato está só começando e pode virar uma devassa
A guerra da Procuradoria-Geral da República (PGR) com a força-tarefa da Lava Jato está só começando, com troca de críticas em público e de acusações nos bastidores. Vem aí uma devassa numa operação anticorrupção que ganhou fama mundo afora, mobilizou o Brasil e, com a prisão de um ex-presidente, ex-governadores, ex-presidentes da Câmara e os maiores empreiteiros do País, gerou a esperança de que a lei valeria para todos.

Segundo o procurador-geral, Augusto Aras, em conversa ontem com a coluna, “não se trata de linchar quem quer que seja, até porque isso seria cair nos mesmos vícios”. Ele, porém, admite: “Mas é preciso corrigir rumos e seguir regras universais para todos os procuradores. Não podemos ter animais que são mais iguais do que os outros, como em A Revolução dos Bichos (George Orwell)”.

Aras não diz isso tão claramente quanto outros integrantes da PGR, mas a avaliação é de que a Lava Jato foi ótima, até “virarem a chave”. Ou seja, até os procuradores de Curitiba passarem a ultrapassar limites e driblar a falta de provas. Assim, há um “esgotamento” do modelo e é preciso transparência e tirar o excesso de poder e voluntarismo da Lava Jato, garantindo compartilhamento de dados e a participação da PGR. “Eu sou procurador-geral e não tenho o direito de saber o que acontece em Curitiba?”, reclama Aras. [convenhamos que é algo inaceitável, restringir o acesso do procurador-geral a uma operação;
tudo isso devido: boicote dos procuradores ao procurador-geral, devido o presidente da República não ter aceito a imposição que os membros do MPF pretendiam: escolher o chefe da PGR entre os escolhidos pelos que seriam chefiados pelo escolhido.
Transformaria o chefe da PGR em reféns dos subalternos e o a PGR em um sindicato.]

Isso cria mais uma situação estranha num ambiente político já tão estranho. A PGR de Aras, acusado de “bolsonarista”, faz um discurso semelhante ao do PT quando o foco é Lava Jato e Curitiba, algozes do ex-presidente Lula. Como ficam os petistas? 
Contra Aras, mas a favor da intervenção na Lava Jato? 
Ou contra tudo e todos?
Aliás, pouco se fala sobre isso, mas o procurador-geral tem tomado sucessivas decisões que contrariam o Planalto. Exemplos: no combate à pandemia; na denúncia contra o deputado Arthur Lira (PP), do Centrão e aliado do presidente Jair Bolsonaro; nas “apurações preliminares” sobre declarações do deputado Eduardo Bolsonaro e do general Augusto Heleno (GSI) com viés antidemocrático. O seu teste de fogo, porém, será denunciar ou não Bolsonaro por intervenção política na PF. [um procurador-geral, isento, imparcial, como se espera que Aras seja, só denuncia os que cometeram crimes e com base em provas.
Assim, para manter a isenção e imparcialidade dele esperadas,  Aras não tem elementos para denunciar o presidente.]

O fato é que as acusações da PGR contra a Lava Jato, e da Lava Jato contra a PGR, vão piorar, com forte questionamento a ações e decisões de Curitiba. Na lista, as delações premiadas. Na avaliação da PGR e outros órgãos de controle, as multas aplicadas aos delatores não chegam a 10% de um valor razoável e eles estão leves, livres, soltos – e nadando em dinheiro desviado. Na versão da Lava Jato, a intenção da PGR e do próprio Aras é destruir não só a operação, mas o próprio combate à corrupção. Eles dizem que é o oposto: retomar e aprofundar o combate à corrupção, que parou, em novas bases e práticas. Eles acusam a força-tarefa de ter engavetado 1.450 relatórios prontos, sem nenhuma consequência.

A lista da Lava Jato divulgada pelo site Poder 360, camuflando investigações indevidas contra os presidentes da Câmara (“Rodrigo Felinto”) e do Senado (“David Samuel”), foi só um aperitivo para tentar provar o uso de “métodos heterodoxos” da força-tarefa. Eles também não usavam simples gravadores, mas sim interceptadores. Ou seja: a PGR suspeita que grampeavam seus alvos sem autorização judicial. Nessa guerra, ninguém está totalmente certo nem errado, mas a previsão é de que, entre mortos e feridos, os mais atingidos sejam os líderes da Lava Jato que tanta esperança trouxeram ao Brasil. Aí se chega a Sérgio Moro, o inimigo número um do PT, que passou a ser também dos bolsonaristas e agora corre o risco de ver a Lava Jato, a maior operação de combate à corrupção da história, virar um sonho de verão – ou um pesadelo. [Moro não tem direito a reclamar, caso a operação que o projetou como paladino do combate ao crime vire um sonho de verão.
Afinal, a ambição desmedida de Moro, os efeitos da picada da 'mosca azul', transformaram o modelo de modalidade de milhões de brasileiros em sonho de verão.
A conduta desastrada de Moro, somada a sua ambição política desmedida, é que estão abrindo caminho para a destruição da Lava Jato.] 

Eliane Cantanhêde, jornalista - O Estado de S. Paulo


sexta-feira, 17 de abril de 2020

A grande cartada - Eliane Cantanhêde

sexta-feira, 3 de janeiro de 2020

Incertas e não sabidas - Eliane Cantanhêde

O Estado de S.Paulo

Eleições municipais de 2020 encontram velhos e novos partidos em maus lençóis

Atenção: vencer ou perder as eleições municipais não significa, pelo menos não necessariamente, vencer ou perder as eleições presidenciais dois anos depois. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. As votações nos municípios confirmam a força ou a fraqueza de partidos e candidatos naquele momento, mas as projeções para as urnas nacionais dependem de vários fatos e fatores atrelados à dinâmica do País e da política.

Um exemplo recente: o PT foi fragorosamente derrotado nas eleições municipais de 2016, quando perdeu em todas as capitais, exceto uma, Rio Branco, no Acre. Detalhe: com a desincompatibilização do prefeito Marcos Alexandre, para disputar o governo estadual (aliás, sem sucesso), o partido ficou sem nenhuma das 26 capitais e nenhuma das cidades com mais de 200 mil eleitores. E o que aconteceu com o partido de Lula em 2018, dois anos depois? Ultrapassou todos os demais partidos e empurrou Fernando Haddad para o segundo turno contra Jair Bolsonaro, do até então inexpressivo PSL. Perdeu no final, mas mostrou que está vivo.


Isso não significa que as eleições municipais não sejam importantes. Claro que são, e não só porque se trata da escolha de prefeitos e vereadores que vão definir os rumos das nossas cidades, onde, afinal das contas, as pessoas moram. É importante também para organizar o tabuleiro partidário, testar a imagem de siglas e líderes, desenhar as articulações e alianças nacionais. As eleições deste ano têm uma característica muito peculiar, porque encontram um quadro político e partidário confuso e completamente desorganizado. Logo, novo, imprevisível.

Os partidos tradicionais parecem baratas tontas. O MDB, dono do maior número de prefeituras no País, enfrenta dramas éticos e falta de liderança: o ex-presidente Michel Temer é investigado, o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha caiu, foi cassado e está preso, o ex-governador do Rio Sérgio Cabral foi condenado a mais de 200 anos. Sem disputar a Presidência, ora pendurado no PSDB, ora no PT, o partido depende desesperadamente de bases municipais e estaduais. O PSDB, que foi um sucesso em 2016 e domina o maior número de grandes cidades, acaba de sair de um desastre eleitoral: Geraldo Alckmin teve em 2018 o pior desempenho do partido numa disputa presidencial e os principais líderes tucanos no Congresso naufragaram nas urnas. Restou uma crise existencial: o que é o PSDB? Pior: quem é o PSDB?

O PT... bem... depois de construir sua história em cima da ética, o partido foi atingido em cheio pela Lava Jato, que levou à prisão o próprio Lula, seus ex-presidentes e ex-tesoureiros. Além de ter de responder pelo fracasso de Dilma Rousseff na Presidência. Mas o PT continua visceralmente dependente de Lula, que não aponta para o futuro, e ainda reelegeu uma presidente, Gleisi Hoffmann, capaz de defender o regime macabro de Nicolás Maduro e de brincar de Foro de São Paulo em Cuba, a esta altura da vida e dos acontecimentos.

Se as velhas siglas estão em maus lençóis, o que dizer das novas? O partido do presidente, qualquer presidente, sempre sai na frente e em vantagem em eleições municipais e em processos de reeleição. Já o Aliança, de Bolsonaro, tem uma corrida de obstáculos, a começar da criação da própria sigla. Até lá, é uma incógnita, na dependência de templos, escolas – e quartéis? E o PSL, que surfou na onda Bolsonaro e conquistou a segunda bancada da Câmara com neófitos da polícia, da área militar, da Justiça, do Ministério Público? Esqueçam. Foi um meteoro que passou. Se tiver um papel na eleição, será o de azucrinar o Aliança, o presidente e seus seguidores. Uma guerra, aliás, nada santa.
Eliane Cantanhêde, colunista  - O Estado de S. Paulo