Há menos de dois meses no cargo, o ministro Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo, é o primeiro general da ativa que largou sua posição no alto comando para tomar assento no coração do poder civil
Há menos de dois meses no cargo, o ministro Luiz Eduardo Ramos, da
Secretaria de Governo, é o primeiro general da ativa que largou sua
posição no alto comando para tomar assento no coração do poder civil e
com duas missões tão difíceis quanto aquela que ocupou em sua vasta
carreira militar: comandar a comunicação e a articulação política do
governo Bolsonaro.
"Eu não esperava ser ministro,
mas, ao longo da minha vida, principalmente depois de ser general, sem
eu perceber, estava sendo preparado talvez para essa função", afirma.
Ramos já foi adido militar em Israel, no governo Lula, foi observador na
Iugoslávia, onde contava corpos e tiros disparados. Agora, na guerra
diária da política e da comunicação, sua missão é pacificadora. Os
deputados têm elogiado. Há quem diga que agora existe um canal direto
com o Planalto. E tem uma amizade com o presidente Bolsonaro que lhe
permite dar conselhos que outros não ousariam.
Porém,
ele sabe exatamente onde pisa na relação presidencial: "O presidente
não é tutelado. Se chegar pro presidente e disser: 'O senhor vai fazer
isso', esquece. Ele não vai fazer. Acho que, brincando, só a dona
Michelle. (...) E, sinceramente, com todo o respeito: prefiro uma pessoa
que fale o que pensa, mesmo que às vezes, entre aspas, saiam algumas
besteiras no meio do que quem fala uma coisa e faz outra". Quanto ao
Exército, ele é direto: "Queimei caravelas. O governo não é do Exército.
E tem que dar certo".
O senhor é responsável pela comunicação do governo, que teve problemas no início e agora, de novo, com a saída do jornalista Paulo Fona, que ficou menos de um mês no cargo. O que houve?
Há atritos entre o porta-voz e o secretário de Comunicação?
Mas a relação do presidente com a imprensa parece complicada...
Essas declarações polêmicas do presidente não atrapalham a boa condução do governo?
O senhor é responsável pela comunicação do governo, que teve problemas no início e agora, de novo, com a saída do jornalista Paulo Fona, que ficou menos de um mês no cargo. O que houve?
Cada
ministro escolhe sua equipe. Eu cheguei aqui e fiz a mesma coisa. Temos
aqui o chefe da Secom, o Fábio Wajngarten, que é um garoto dinâmico,
muito perspicaz, e vai lançar agora, a ideia foi dele, a Semana do
Brasil, uma iniciativa maravilhosa. De 6 a 15 de setembro, várias
empresas, agências de viagem, Banco do Brasil, McDonald’s, Lojas
Americanas, Casas Bahia, Havan, até a Globo entrou. Pois bem, todos vão
dar descontos, fazer promoções. Será uma campanha muito bonita. Ele tem
um potencial enorme, escolheu a equipe dele. Estão lá trabalhando, e
tinha um cargo vago que é o de secretário de imprensa. Quinze dias
atrás, ele chegou e disse: “Ministrão, conseguimos um secretário de
imprensa que é fera, o cara é bom”. Quem é? “Paulo Fona”. E o gozado é
que ele não tem Fona no nome, né? O nome dele é Paulo Cezar. Estive 10
minutos com Paulo Fona e falei: “Seja feliz, sucesso”. Só que, assim que
começou a transitar aqui, e aqui tem uns anões, como diz o Bolsonaro,
ou jornalistas. Se o jornalista não tiver o bichinho de querer saber as
coisas, não é jornalista. Aí levantaram que trabalhou para não sei quem,
Agnelo, Roriz, PSB, Yeda Crusius, e que tem isso, tem aquilo. Não houve
nada que dissesse que era mau caráter, pessoa desonesta. Houve um
incidente, não vou dizer lamentável, um pouco desagradável, mal
conduzido, a verdade é essa.
Balela.
Os dois se dão bem, não houve problema nenhum. Pelo contrário, estão aí
em lua de mel, o general Rêgo Barros e o Fábio. Mas a imprensa, dias
atrás, fez um burburinho, e eu até entendo.
O
presidente é um homem muito público. O presidente tem um funcionamento
muito claro com as coisas dele. Tem pessoas que me dizem: “Ah, não! Ele
deu aquela declaração do cocô...” Eu digo: “Ele faz aquilo de ironia”.
O
presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, não fala como
diplomata. Tampouco como acadêmico, que sempre estuda o que vai dizer,
ou sempre busca a essência das coisas. Esse é um professor acadêmico.
Você não vai ver, no currículo do Bolsonaro, ele ministrando aulas na
UnB, em Harvard, nada. Ele tem a linguagem de um homem simples, direto, e
que, às vezes, fala as coisas e pronto. Alguém pode dizer: “Pô! Como
ele falou isso?”. Eu digo: “Ele é assim.” Mas tem gente que fala: “Mas,
ministro, ele é o presidente da República.” Eu respondo: “Vem cá: é
preferível ele falar, entre aspas, algumas besteiras, ou ele ser o
politicamente correto? Como alguns que douravam a pílula, diziam uma
coisa e, por trás, falavam outra?” Eu prefiro o cara que fale direto,
mesmo que saiam algumas besteiras no meio. Eu prefiro, falando sério,
não só como ministro atual, mas como pessoa.
(...)
Isso não atrapalha a imagem do Brasil no exterior?
O que o senhor destaca?
(...)
E os militares no governo?
Isso não atrapalha a imagem do Brasil no exterior?
É ruim,
não vou dizer que é bom. Mas é o que eu digo: é preciso olhar o
histórico. Agora mesmo, na viagem a Pelotas, na inauguração do trecho de
duplicação da estrada, lembraram uma historinha. Vocês lembram a
gravação em que o ex-presidente Lula tava arrumando a gravata do
prefeito e disse assim: “Vem cá: nesta cidade só tem viado e tal”. Tudo
bem que estava falando em off, mas o que Bolsonaro falou sobre a Paraíba
foi em off também. Enfim, vamos ver o que foi feito de bom realmente de
janeiro até aqui. Tenho a relação de coisas altamente positivas, são
seis páginas de letras pequenas.
Está
aqui: o 13º antecipado para aposentados; medida provisória do FGTS; o
novo mercado de gás, da parte da Petrobras; isenção do habite-se para
população de baixa renda, ou seja, se comprar, e for pobre, não precisa
mais do habite-se; modernização das normas de segurança do trabalho;
alíquota zero do Imposto de Renda para exportadores; a conclusão do
acordo do Mercosul com a União Europeia; transformação digital de mais
de 300 serviços; cadastro positivo; o lançamento do projeto do Araguaia;
reconhecimento de territórios de comunidades quilombolas...
Bateram nele na campanha, mas, quando ele faz o negócio, ninguém fala. O Future-se; o fortalecimento da autonomia financeira das universidades. Conheço um reitor de esquerda que falou que foi um golaço e que, graças à incompetência nossa, ainda não foi divulgada a potência que é o Future-se. O presidente foi à Bahia, lançou uma usina voltáica flutuante. O governo estabeleceu diretrizes e ampliou liberdades para acordos internacionais do transporte aéreo. Doze aeroportos leiloados, etc. Aí o presidente sai e diz: “Fazer cocô num dia, fazer cocô no outro...” E vira assunto de primeira página?
Bateram nele na campanha, mas, quando ele faz o negócio, ninguém fala. O Future-se; o fortalecimento da autonomia financeira das universidades. Conheço um reitor de esquerda que falou que foi um golaço e que, graças à incompetência nossa, ainda não foi divulgada a potência que é o Future-se. O presidente foi à Bahia, lançou uma usina voltáica flutuante. O governo estabeleceu diretrizes e ampliou liberdades para acordos internacionais do transporte aéreo. Doze aeroportos leiloados, etc. Aí o presidente sai e diz: “Fazer cocô num dia, fazer cocô no outro...” E vira assunto de primeira página?
As
pessoas dizem: “Ah, os generais do governo são isso, são aquilo”.
Criaram uma figura de que os generais do governo fazem de tudo, mas a
gente nem se reúne. O primeiro ponto é esse. E olha que os generais do
governo estavam todos na reserva há muito tempo. General Heleno, por
exemplo. Eu era coronel e ele foi pra reserva em 2010. General Santos
Cruz, antes de vir, tinha ido pra reserva em 2012. General Fernando foi
pra reserva em 2018. Não tinha ninguém na ativa. Por que digo isso?
Estava na ativa, comandando São Paulo, um comando militar estratégico. A
greve dos caminhoneiros começou e terminou ali. Estava lá, morando em
um apartamento do Exército, apartamento bom, dois andares, morando no
bairro do Paraíso, do lado do Ibirapuera. A gente acordava de manhã e ia
fazer musculação, corridinha... Larguei tudo. Em 3 de julho, passei o
comando e, dia 4, estava aqui. Joguei tudo para o alto. Por quê? Porque
eu me senti à vontade dentro da amizade que tenho com o presidente, e é
uma amizade muito sincera. Se olhar ali no quadro (aponta a foto dele
com o presidente Bolsonaro), se olhar o sorriso, é difícil ver uma foto
com um sorriso daquele. Foi o dia em que confirmei que seria ministro
dele. Foi em São Paulo, à noite, no Aeroporto de Congonhas.
Alguns dizem que o senhor é um grande influenciador do presidente…
(...)
Então, o senhor passou para a reserva?
O
senhor diria que essa experiência em campo, de alguma forma, mais do
que o credencia para participar dessa guerra da articulação?
O custo político da indicação de Eduardo vai ser alto?
Essa relação com a imprensa melhora quando? O senhor entrou para isso…
O senhor disse mais cedo que Bolsonaro não é tutelado. Em algum momento tentaram?
Mas falo sobre a tutela com base no período em que o Carlos Bolsonaro teve entreveros com Mourão...
Não
sou influenciador. O presidente não é tutelado. Se chegar para o
presidente e falar: “O senhor vai fazer isso”. Esquece, ele não vai
fazer. Acho que, brincando, só a dona Michelle. Ele pode me ouvir, e me
ouve em algum sentido assim, mas não vim aqui para tutelar o presidente,
pois sei que ele não é tutelado. Mas, voltando: larguei tudo, no
sentido realmente de largar, deixei de ser general da ativa e pedi para
ser chamado de ministro. Primeiro, pelo simbologismo, que é não ter um
militar da ativa. Fui afastado do alto comando, não uso mais farda, não
participo de reunião nenhuma. Os quatro estrelas têm um grupo seguro,
que não é o Telegram. Eu fui excluído. Tem um grupo que troca mensagens
entre os quatro estrelas, só generais de Exército. Aí, um diz: “Você não
pertence mais a esse grupo”. É forte.
Vou
explicar agora. Quando ele (Bolsonaro) anunciou em 12, 13 de junho, meu
aniversário é 12, até achei que anunciaria no dia 12 e pedi pra não
anunciar, pois estava tentando ver se conseguia me salvar. Ele me
anunciou no dia 13. “Mas por que o senhor só vai em julho?” É um
simbolismo, não podia assumir um ministério com tropa no meu comando.
Isso não existe. Ministro é político. Estou aqui, mas não passei o
comando de São Paulo, tenho 25 mil homens debaixo do meu braço. Não é
atitude, isso foi pensado. O Exército pensou nisso.
(...)
Ela
me perguntou qual a missão mais difícil. Essa foi a da Iugoslávia, uma
missão de risco de vida. A outra, eu fui adido militar em Israel. Tem um
fato muito pitoresco. Esse ninguém sabe. Em Israel, quando cheguei, o
israelense é um povo muito direto. Não sou judeu, mas tenho admiração
muito grande, até porque morei lá. Eu cheguei exatamente dois meses
depois do ex-presidente Lula ter tirado foto abraçado ao presidente do
Irã, Mahmoud Ahmadinejad. O Ahmadinejad disse que varreria Israel do
mapa. Quando cheguei, dois meses depois, junho de 2005, eu fui recebido
pelo general Nitzan. Até hoje lembro dele: “O seu país é um país que,
para nós, tem uma relação de amizade com o Irã, e o senhor saiba disso”.
A partir dali, senti nitidamente. Os judeus são muito diretos. Foi uma
missão difícil pra mim. Mas estava lá, era adido, tinha que fazer algo
diferente. Aí comecei a estudar hebraico. Já falava inglês, por causa da
missão da Bósnia. Mas qual foi minha intenção? Queria fazer algo
diferente para mostrar pra ele que eu não era político, era adido
militar. E acabei em uma cerimônia muito emotiva, a céu aberto, que eles
fazem com os parentes, todo mês de maio, se não me engano, para
relembrarem o Holocausto. Lá, todo mundo perdeu alguém. Guerra dos Seis
Dias, Guerra da independência, Guerra do Yom Kippur... Todo mundo tem um
parente que morreu. Eles vão com as camisas dos parentes, têm um
discurso altamente emotivo e, nesse dia, eu fui, sentei na primeira
cadeira, na primeira fileira e cantei o Hino Nacional em hebraico.
Cantei o hino e ninguém esperava, né? Ganhei. O primeiro cara que pulou
na minha frente foi o ministro da Defesa. Aí, eu falei que amava Israel.
E ele me abraçou emocionado. A partir daí, mudou o tratamento. Saltei
de paraquedas com ele várias vezes, sou paraquedista. Fui convidado para
várias atividades, como o único adido sul-americano.
(...)
Sinceramente,
não. O que eu tenho feito com os senadores que aqui me visitam, falo
exatamente dessa minha posição, com credibilidade, pois fui adido, sei
distinguir bem uma função técnica, que vai exigir talvez uma preparação
longa, de uma pessoa que saiba receber as outras, saiba representar o
seu país em cerimônias, saiba participar de um evento diplomático no
país.
A
relação não está boa? Vou perguntar uma coisa: quem é o maior
comunicador do governo? Sou eu, ou é o presidente? É o presidente. Quem é
que substitui o presidente Jair Messias Bolsonaro? Ninguém. Ele fala
uma frase e sai na CNN, no Le Monde...
O senhor disse mais cedo que Bolsonaro não é tutelado. Em algum momento tentaram?
Não, nem tentem, porque não conseguem.
Mas falo sobre a tutela com base no período em que o Carlos Bolsonaro teve entreveros com Mourão...
Não,
não é isso, não. O Carlos Bolsonaro que eu conheço, que conheci muito
no hospital dia e noite, e seus outros filhos também iam, mas estavam
atarefados na campanha. Eu vi um filho extremamente amoroso, preocupado
com o pai, em preservar a vida dele, em preservar que ele tivesse
tranquilidade. Esse é o Carlos Bolsonaro que eu conheço.
Correio Braziliense, acesse para entrevista Completa
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