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domingo, 8 de janeiro de 2023

Quem opera a mordaça? - Guilherme Fiuza

 Revista Oeste

Como a TV Globo sabe de onde veio a ordem e quem é o seu autor, se o atingido não foi notificado e não conseguiu obter nem número de processo através de advogado?  

Foto: Shutterstock

Foto: Shutterstock 

Uma ordem judicial levou ao bloqueio de minhas redes sociais. Como saber que a ordem é judicial? Não há como saber. Só dá para supor — a partir de um e-mail enviado por uma das plataformas, informando que o trancamento do perfil se dava em cumprimento a uma decisão da Justiça, e que ela, a plataforma, não tinha nada a ver com isso.

Mas existe decisão judicial sem processo, sem nem mesmo uma alegação, ou pedido de liminar conhecido pelo atingido? No Brasil, sim. É exatamente isso: uma ordem “judicial” que resulta na supressão do direito à livre expressão de um jornalista em canais que alcançam milhões de usuários se consuma como mágica de origem desconhecida. Mas há quem conheça a origem — e não é o atingido pela medida, nem seu advogado.

Quem conhece a origem da medida é a TV Globo.

Pelo menos é o que está publicado no site G1, do grupo Globo. Textualmente: “Segundo apuração da TV Globo, o bloqueio das contas foi determinado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes”.

Foto: Reprodução G1

Parênteses: a vírgula depois de “STF” indica que, para o G1, Alexandre de Moraes é o único ministro da Corte. A única outra hipótese é o analfabetismo dos responsáveis pelo veículo noticioso. Não se pode descartá-la. Fecha parênteses.

Tratar comobolsonarista” um escritor com mais de dez livros publicados (quase 300 mil vendidos), com obras adaptadas para o cinema e críticas sobre todos os governos nas últimas três décadas e meia é tão criterioso quanto chamá-lo de “golpista”

Dito isso, fazemos aqui da planície a modesta pergunta: como é que a TV Globo sabe de onde veio a ordem e quem é o seu autor, se o atingido não foi notificado e não conseguiu obter nem número de processo através de advogado?

A informação sobre a “apuração” da TV Globo foi publicada no site G1 algumas horas após a execução do bloqueio das redes. A matéria veio com o seguinte título: “Guilherme Fiuza tem perfis retidos no Twitter, Instagram, YouTube, Facebook e Telegram”. 
 Ou seja: é uma matéria só sobre o meu caso, um privilégio significativo considerando-se que outros alvos de medidas similares não mereceram esse destaque exclusivo.
Foto: Reprodução G1

Mas a exclusividade começou antes da ordem de bloqueio. Em matéria publicada pelo jornal O Globo, onde o assunto era outro (uma tese sobre financiamento de manifestações contra a eleição de Lula através de rifas), o veículo encaixou na parte final do texto uma referência a mim — exclusivamente a mim — fora do assunto tratado até ali (os supostos financiamentos de atos “antidemocráticos”). Segue a transcrição do trecho:

“O chamado ao tumulto é endossado por figuras públicas com grande repercussão. O bolsonarista Guilherme Fiuza, seguido por 1,9 milhão de pessoas no Twitter, tem incentivado o golpismo.”

Segue-se então uma citação a um post meu onde afirmo que os que suspeitam da eleição de Lula e se manifestam nas ruas por isso são democratas e estão no seu direito.

Foto: Reprodução O Globo

Essa matéria precedeu a decisão “judicial” de bloqueio das redes sociais do “bolsonarista golpista”, que algumas horas depois a TV Globo disse saber de onde veio.

São as coincidências da vida.

Leia também “Flagrantes do ano que não terminará”

 

Guilherrme Fiuza, colunista - Revista Oeste