Lobista
diz que Dirceu viajou 113 vezes em seus jatos em dois anos
Segundo
Júlio Gerin Camargo, delator da Operação Lava Jato, viagens
do ex-ministro totalizaram 105 mil quilômetros, o equivalente a duas
voltas e meia ao mundo
Entre
os anos de 2010 e 2011, o ex-ministro da Casa
Civil (Governo Lula) José Dirceu usou 113 vezes
os jatos do lobista Júlio Gerin Camargo, delator da Operação Lava Jato,
totalizando 105 mil quilômetros percorridos, o equivalente a duas voltas e meia
ao mundo. Ouvido na sexta-feira, 22, pelo juiz federal Sérgio Moro - que conduz os processos da Lava Jato em primeira instância -, Julio Camargo afirmou que as horas de voo usadas por Dirceu
foram abatidas de uma conta de R$ 1
milhão de propinas restantes
a ser paga por ele para o ex-ministro por contratos na Petrobras.
"O saldo de R$ 1 milhão (de propina)
entrou em uma conta de afretamento de aviões. O ministro se utilizava dois
aviões que eram de minha propriedade. E isso representava um débito e era
compensado nessa conta de R$ 1 milhão que ficou
restante", afirmou o empresário. Os dois são réus em processo por corrupção, lavagem de
dinheiro e organização criminosa, envolvendo contratos da
petrolífera.
O valor de R$ 1 milhão restante seria
referente a um acerto de R$ 4 milhões que teria sido fechado com dois
representantes da Diretoria de Serviços da Petrobras, que eram seus contatos
diretos sobre o assunto "propina"
na estatal: Renato Duque, ex-diretor indicado ao
cargo pelo ex-ministro, e Pedro Barusco, o
ex-gerente de Engenharia, braço direito de Duque. Ambos eram cota do PT no esquema de fatiamento
político das diretorias da estatal, que
incluía ainda o PMDB (que controlava a Diretoria de Internacional) e PP
(Diretoria de Abastecimento).
Planilha de voos
Para provar o que diz, Julio Camargo apresentou ao juiz Sérgio Moro, no
interrogatório de sexta-feira, uma
planilha com os registros de voos, data, hora da partida e da chegada, período
de voo e quilometragem, com identificação do
passageiro "J". Nesta
segunda-feira, 25, o documento foi anexado ao processo
penal em que Dirceu, Duque e Julio
Camargo são réus - junto com outros envolvidos - pelo recebimento de propina da empreiteira Engevix.
São dois jatos, um Citation Excel PT-XIB e outro um Citation
Mustang PP-EVG. O primeiro teria
sido comprado por Dirceu em 2011 e devolvido, em seguida. O segundo consta como sendo propriedade da empresa Riomarine, do
operador de propinas e também delator Mário Goes, segundo o blog O Antagonista.
Moro perguntou se era feita alguma
simulação de pagamento para cobrir o abatimento das horas de voo dentro do
caixa da propina. Julio Camargo explicou que era feito
um acerto de contas mensalmente entre ele, o operador de propinas Milton
Pascowitch, o irmão e sócio de Dirceu, Luis Eduardo, e seu assessor Roberto
Marques, o Bob - os três, também
réus do processo.
O magistrado pediu para Julio Camargo apontar se alguma vez Dirceu pagou pelo
uso das aeronaves de Julio Camargo. "Se
não me falha a memória uma ou duas vezes foram pagos. Mas se o senhor
considerar os inúmeros voos que foram feitos, diria para o senhor que foi muito
pequena (as) parte (s) que foram pagos diretamente."
Venda do avião
O Ministério Público Federal
acusa Dirceu de ter comprado uma cota de um terço do jato prefixo PT-XIB,
em 2011, por meio do operador de propinas Milton Pascowitch. Ligado à
empreiteira Engevix, ele confessou, também na sexta-feira, 22, ao juiz da Lava
Jato ter adquirido parte da aeronave para uso do ex-ministro. "O
denunciado Dirceu, de modo consciente e voluntário, no contexto das atividades
da organização criminosa" teria dissimulado e ocultado a origem e a
propriedade da parte de 33% dos Cessna Aircraft, modelo 560XL. "Quota parte essa que foi adquirida em
favor de Dirceu por Milton, José Adolfo (Pascowitch) e Júlio Camargo, por
intermédio das empresas Jamp e Avanti, com recursos provenientes dos crimes de
cartel, fraude a licitação e corrupção praticados pelos executivos da Engevix,
Hope e Personal, em detrimento da Petrobras", registra a denúncia da
força-tarefa da Lava Jato.
Os dois operadores de propina na Petrobras e delatores nos processos disseram
que o negócio foi desfeito logo depois, e que apenas uma parcela do valor total
de R$ 1 milhão foi paga. O dinheiro
teria saído da empresa de Pascowitch, a Jamp Engenheiros Associados - usada para movimentar propinas - para
Julio Camargo.
Com o fim da transação, Julio Camargo
teve que devolver a primeira parcela paga. Foi só então que ele diz ter
tomado conhecimento do suposto envolvimento de Dirceu no negócio. "Milton que comprou a aeronave pela
Engevix e me cobrou com o nome do doutor José Dirceu, a devolução do valor que
ele tinha pago."
O lobista, que representava no Brasil os interesses da japonesa Toyo
Engineering Corporation e também de algumas brasileiras, como a Camargo Corrêa,
Setal e UTC, disse que decidiu vender uma cota da
aeronave por não fazer uso constante dela. Pascowitch teria informando
que a Engevix precisava de um novo jato, especialmente após a compra do
Estaleiro Rio Grande (RS) - adquirido da Wtorre, outra investigada da Lava
Jato, para construção de plataformas para a Petrobras, via Sete Brasil. "Eu vendi uma parte desse avião, e se
o senhor verificar, esse contrato de venda para a Engevix aconteceu em 7 de
julho de 2011. Se o senhor pegar a tabela que eu vou lhe entregar o senhor vai
verificar que os últimos voos do ministro, do ex-ministro, foram em junho de
2011, nessa aeronave", afirmou Julio Camargo, com o documento entregue
a Moro.
Mau negócio
"Se ele (Pascowitch) tivesse me dito
que a aeronave era para o senhor José Dirceu eu não teria vendido. Porque isso
já estava me causando inúmeros problemas. Porque toda vez que o senhor José
Dirceu entrava no avião, aparecia o prefixo do avião e 'doutor José Dirceu
usando avião fretado, andando de jatinho para baixo para cima'. Aquilo deu uma
visibilidade no avião que perdeu o seu preço, porque ficou rotulado como um
avião do José Dirceu", contou Julio Camargo.
Defesa
O advogado Roberto Podval, que defende José Dirceu, disse que está conferindo todos os dados relativos aos
voos do ex-ministro chefe da Casa Civil do Governo Lula. O criminalista
anotou que as informações sobre o número de horas de voo apontadas na planilha
do lobista e delator Júlio Camargo não são exatas. "Estamos checando esses dados e não me parece que são corretos.
Não são corretos. Ainda estamos verificando voo a voo, é um pouco complexo,
data por data, para onde foi, de onde foi, para podermos fazer essa prova. Mas
já sabemos que não é isso. Pode até ter voado, mas com outras pessoas, outros
lugares. Existem voos que sabemos não têm nenhuma relação com o José Dirceu.
Estamos batendo voo a voo para saber o que exatamente diz respeito a ele. Esses
voos (da planilha de Júlio Camargo) não são 100% de José Dirceu."
Fonte: Revista Isto É