Um dos graves problemas que provoca a mudança na
prática da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a
possibilidade de prisão de um réu condenado em segunda instância é a
assimetria de decisões com os órgãos recursais. Centrando o foco
nos condenados pela Operação Lava Jato, ao contrário do próprio STF,
cujos cinco ministros que votaram contra a prisão em segunda instância,
mais Gilmar Mendes que alterou seu entendimento, mandam soltar, os
desembargadores dos Tribunais Regionais Federais que recebem os
recursos, sem exceção, determinam a execução provisória da pena,
esgotados os recursos.
A 8ª turma do TRF-4, com sede em Porto
Alegre, que abrange os Estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande
do Sul, já vinha adotando esse critério antes mesmo da decisão do STF. O
TRF-1, com sede em Brasília, que tem sob sua jurisdição o Distrito
Federal e os estados do Acre, Amapá, Amazonas, Bahia, Goiás, Maranhão,
Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Piauí, Rondônia, Roraima e Tocantins,
faz isso rigorosamente com todos os processos.
A Segunda Seção
(formada pelas 1ª e 2ª Turmas) e a Terceira Turma executam todas as
decisões de segunda instância. Essa questão lá está, inclusive,
regulamentada, nos termos da decisão plenária do STF. Segundo o
coordenador das Turmas Criminais, desembargador federal Ney Bello, houve
a regulamentação porque não fazia sentido deixar o Ministério Público
Federal "escolher" quem queria executar. No TRF-2, com sede no
Rio de Janeiro e que abrange também o Espírito Santo, a 1ª Turma está
mandando para o juiz expedir guias para execução provisória imediata.
Isso
quer dizer que, caso a sua condenação a 9 anos e meio no processo sobre
o triplex do Guarujá seja confirmada, além de ficar inelegível pela Lei
da Ficha Limpa, Lula iria para a cadeia. Mas existe a possibilidade de o
ex-presidente se tornar inelegível e não ir preso. Seria o caso se o
TRF-4 reduzir a pena a menos de 4 anos de reclusão, considerando os
crimes de menor poder ofensivo. Nesse caso, ele poderia continuar
recorrendo em liberdade, mas teoricamente sem poder se candidatar.
Mesmo condenado por prazo superior, se não for por unanimidade, Lula
poderá recorrer, pois, conforme decisão do Superior Tribunal de Justiça
(STJ), a decisão não será final antes que embargos sejam julgados.
Segundo
a presidente Laurita Vaz, “Acórdão de apelação julgado por maioria de
votos não configura a confirmação da condenação em 2ª instância para
fins de aplicação da execução provisória da pena”. Ela lembrou, ao
julgar um recurso da defesa, que "na hipótese não se afigura possível a
imediata execução da pena restritiva de direitos, pois, embora já
proferido acórdão da apelação, o julgamento se deu por maioria de votos,
o que, em tese, possibilita a interposição de embargos de declaração e
infringentes."
Essa decisão, a rigor, não tem relação com a
inelegibilidade porque a Lei da Ficha Limpa fala em condenação em
segunda instância, não em embargos, mas é possível construir a tese de
que se o STJ está dizendo que o fato de ainda caber embargos significa
que a segunda instância não foi esgotada, então só se considera que de
fato há uma condenação em segunda instância quando esgotados todos os
recursos cabíveis. Todos esses recursos darão tempo à defesa de
Lula para postergar uma decisão final, tentando chegar a 15 de julho do
ano que vem, quando começam, pela legislação eleitoral, as convenções
para definir os candidatos. Há interpretações jurídicas de que, a partir
da candidatura oficial registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE),
não é possível mais embargá-la pela Lei da Ficha Limpa.
Há,
porém, outras interpretações do próprio TSE que dizem que a impugnação é
imediata, e pode ser feita até mesmo depois da diplomação. Teremos uma
crise institucional instalada no país. Mas há outra possibilidade
de crise, essa gerada justamente pelo desencontro de interpretações
entre os Tribunais Regionais Federais (TRFs) e parte do Supremo Tribunal
Federal (STF). Condenado pelo TRF-4, Lula impetraria um habeas-corpus
no STJ contra a decisão do TRF, e se o STJ negar entraria com outro
habeas-corpus no STF contra o STJ.
Chegando ao Supremo, o relator
do habeas-corpus de Lula será definido pelo famoso algoritmo do sorteio
eletrônico. Se cair com um dos seis ministros que são contra a prisão
em segunda instância, Lula poderá ser libertado e recorrer contra a
impugnação do TSE pela Lei da Ficha Limpa, fazendo campanha eleitoral
saído diretamente da cadeia.
Fonte: O Globo - Merval Pereira
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sábado, 2 de setembro de 2017
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