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quinta-feira, 17 de agosto de 2017

A farda da dor eterna

Reinaldo Bessa, taxista de 52 anos, gira as oito imagens de um porta-retratos em forma de cubo até achar uma delas, que mostra oito pessoas sorrindo. Explica que é a última foto com a família inteira: a mãe, o pai, os quatro irmãos e duas irmãs. “Dois oito, sobraram quatro”, suspira, para cair no choro em seguida. Não estão mais vivos o pai e a mãe, o irmão mais velho, que há dez anos não resistiu a um acidente de moto em Acari, e a irmã Elisângela, que na na foto é uma jovem magrela de cabelos cheios. As lágrimas que escorrem pelo seu rosto são por ela.  — A gente vai morrendo aos poucos — lamenta Reinaldo.
 O fim. Fotos da PM Elisângela Bessa fardada ainda estão no quarto que ocupava na casa da mãe - Domingos Peixoto / Agência O Globo


Ele viu Nana (apelido da cabo da Polícia Militar Elisângela Bessa, de 41 anos) pela última vez no dia 11. Passou à tarde pela barraquinha de batatas fritas que a irmã mantinha há alguns meses com o marido, em Nilópolis. Horas depois, Elisângela e o marido Rodrigo encerraram as vendas e foram para casa onde moram, em Colégio. No caminho, foram abordados por criminosos. Elisângela passou os últimos segundos da sua vida tentando segurar a arma de seu assassino. Não conseguiu e foi atingida na cabeça.  Reinaldo, que tem a foto do suspeito de ter baleado sua irmã na memória do celular, a todo momento repete inconformado, olhando para a imagem, “quem mata policial tem que ficar mais tempo na prisão”.

Luto e sonho de formar sobrinha
Elisângela não tinha medo de nada, só de viver sem a mãe. A dor da morte dela, em novembro de 2016, ainda era enorme. Elisângela revezava suas fotos do perfil do Facebook com as da mãe. Irritado, Reinaldo pediu a irmã recentemente que deixasse a mãe “descansar em paz” e parasse de postar as imagens. Ele nem podia imaginar que o mesmo aconteceria com a própria Elisângela, homenageada da mesma forma por amigos e colegas de farda.

Ele e Nana são filhos do potiguar José e da carioca Deise. José passou 35 dias a caminho do Rio em busca de oportunidades. Em solo carioca, trabalhou no que podia, de engraxate a motorista de lotação. Foi nessa função que conheceu Deise e se casou. José insistia com a mulher que queria ter uma filha. Depois de quatro meninos, veio Nana. O pai exibiu a garotinha para o restante da prole, curiosa, da janela de uma maternidade em Caxias. Daí em diante, Deise criou a menina cheia de cuidados, mas, depois dos 30 anos, Elisângela deixou de lado o trabalho como esteticista para ser policial. Fez o concurso depois de ver que duas cunhadas já tinham passado na prova.

Nos últimos meses, encarava uma segunda jornada na barraca de batatas fritas, o que lhe ajudava também a esquecer a perda da mãe. O sonho da policial, que não tinha filhos, era viajar para Natal, onde o pai nasceu, para formar a sobrinha e afilhada Rayane, de 22 anos, que estuda medicina. O padrinho com quem Elisângela batizou Rayane, policial como ela, também foi assassinado há cerca de seis anos.

Reinaldo, que já foi assaltado 14 vezes, diz que a irmã em pensava em deixar a polícia. Aluna empolgada da academia, guardava o manual dos calouros no quarto que fora dela na casa da mãe, repleto de suas fotos com farda. A bagunça estava à espera de Nana.
— Esperava que ela própria viesse arrumar tudo — diz Reinaldo.

Fonte: O Globo