A
denúncia feita pelo procurador-geral ao STF contra Cunha e Collor, com base em
investigações da operação, adiciona ingredientes à crise
O
presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), já esperava ser
denunciado ao Supremo pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot,
o que foi confirmado ontem com o pedido do Ministério
Público Federal ao STF do enquadramento do político nos crimes de
lavagem de dinheiro e corrupção passiva, fundamentado em provas colhidas pela
Operação Lava-Jato.
Junto com
ele, também são acusados a ex-deputada do PMDB
fluminense Solange Almeida, prefeita de Rio Bonito, aliada de Cunha, e o senador Fernando Collor (PTB-AL), este uma prova
cabal de que o raio da corrupção pode cair duas vezes no mesmo lugar.
Presidente cassado em 1992, por essa mesma razão, Collor também é acusado
de se beneficiar de dinheiro desviado da Petrobras. No caso, por meio de
negociatas patrocinadas na subsidiária BR Distribuidora.
Enquanto
Solange Almeida está arrolada por ter, segundo a acusação, ajudado Cunha a usar recursos
regimentais da Câmara para chantagear fornecedores da estatal que teriam
suspendido o fluxo de propinas para ele, Collor tem a companhia, no
processo, de um ex-ministro seu, Pedro Paulo Leoni Ramos, o PP, também
ligado a negócios escusos quando era ministro de Assuntos Estratégicos do atual
senador alagoano.
Dessa forma,
a Lava-Jato chega afinal ao Congresso e adiciona alguns
ingredientes à crise política. É provável que tenha havido comemorações
ontem no Planalto, pois Cunha, autodeclarado de oposição, por entender que
Janot e Palácio conspiram juntos contra ele, é
considerado forte aliado de quem deseja viabilizar o impeachment da presidente
Dilma. Isso a partir da reprovação das contas do último ano do
seu primeiro mandato, pelo TCU, ou com base numa confirmação pelo TSE de
que teria havido crimes financeiros nas doações à campanha de 2014.
Nesta
hipótese, o vice Michel Temer, do partido de Cunha, também seria atingido. O estilo pessoal de Eduardo Cunha — ele avisa,
sintomaticamente, que não renuncia à presidência da Câmara — aconselha cautela em comemorações antecipadas. O
político desce a ladeira do prestígio e do poder, até porque seria bem
fundamentada a denúncia do lobista Júlio Camargo de que ele lhe cobrara US$ 5
milhões em propinas, a serem desviadas da venda de navios-sonda da Samsung à
Petrobras.
Mas isso
não significa que ainda não possa causar estragos no Congresso. O melhor é que assim não seja,
diante da densa zona de turbulências econômicas por que passa o país, algo
também capaz de tumultuar o ambiente político. Mais do
que nunca, as instituições precisam trabalhar sem constrangimentos. Não
importa que Cunha, Collor ou outras figuras do Legislativo e mesmo do Executivo
venham a ser denunciados, processados e condenados. Exige-se
é que tudo transcorra pelos trâmites legais, sem exorbitâncias de quem acusa
e de quem é acusado.
Fonte:
Editorial – O Globo