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segunda-feira, 23 de março de 2020

Crise coronavírus: prefeituras podem virar o jogo - O Estado de S.Paulo

 Armínio Fraga, Miguel Lago e Rudi Rocha


Para evitar um caos hospitalar, a semana que se inicia é crucial. O governo federal, os estados e municípios precisam tomar medidas imediatas que possam achatar a curva de contágio
Na última sexta-feira (20/03), o ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta declarou que o período de pico de infecções por covid-19 no Brasil será nos meses de abril, maio e junho. O ministro já admite que ao final de abril nosso sistema de saúde entrará em colapso. Esse cenário se apresenta como ainda mais severo que o vivido pelos italianos. Para evitar um caos hospitalar dessa magnitude, a semana que se inicia é crucial. O governo federal, os estados e municípios precisam tomar medidas imediatas que possam achatar a curva de contágio e organizar o fluxo de atendimento do sistema de saúde.

[Um registro se impõe: 
UFA... finalmente, uma das raras matérias que busca oferecer sugestões, ideias, para combater a Covid-19, colocando a vida humana em primeiro lugar, deixando de lado a prática do esporte preferido: malhar o presidente da República.
A matéria tem presente que as eleições presidenciais são para 2022.
PARABÉNS!!! ao Estadão e  autores do artigo.]
A matéria é uma das poucas, raras mesmo - há algumas, mas o número é mínimo - sugere manter vivo os eleique não esquece que as eleições são para 2022 

O impacto da covid-19 em nossos hospitais será tremendo. O Brasil já não tem capacidade hospitalar suficiente para atender o quadro sanitário existente. Persistem em nosso território os desertos sanitários: são ao todo cento e vinte três regiões sanitárias sem nenhum leito em UTI. O aumento de demanda por leitos ocasionado pelo coronavírus agrava essa situação e exigirá um aumento significativo da produção hospitalar. O Instituto de Estudos de Políticas de Saúde (IEPS) estima que cada um por cento de população infectada corresponderá a um bilhão de reais de gastos em hospitalizações adicionais em unidades de tratamento intensivo. Com a declaração do estado de calamidade, o Tesouro está livre para fazer este investimento, sem dúvida de alto retorno social e humanitário.

Existem outras e rápidas medidas que podem contribuir para limitar os danos da pandemia. No topo da lista está o distanciamento social. Evidências demonstram que tal medida é capaz de achatar a curva de contágio da epidemia, o que minimizaria o número de casos graves desatendidos.

No entanto, é ilusório acreditar que o terço mais pobre do Brasil, composto de pessoas que ganham menos de meio salário mínimo, deixará de circular nas cidades só com decretos impositivos, toques de recolher e outras medidas de vigilância. É necessário garantir um mínimo de assistência para compensar a extraordinária perda de renda causada pelo distanciamento social. E é necessário fazer isso já. O governo federal tem as condições de injetar recursos na economia ainda nesta semana, diretamente a mais de setenta milhões de brasileiros. O Brasil dispõe de uma base de dados organizada com informações que identificam esses indivíduos – o Cadastro Único, que lista beneficiários de todos os programas sociais focados nas famílias de baixa renda. Ao abarcar os indivíduos listados no Cadastro Único, sem necessidade de triagem adicional, o governo federal poderá evitar importantes custos e demoras de implementação.

Essas medidas de apoio socioeconômico contribuirão imediatamente ao controle do contágio. Mas elas não são suficientes: é fundamental que sejam complementadas com esforços na triagem e organização do atendimento hospitalar. Nesse sentido o SUS é fundamental, com sua rede de Atenção Básica resolutiva, cuja responsabilidade compete aos municípios. No momento, existe grande disparidade na capacidade de resposta por parte das prefeituras.

É fundamental que elas comecem a trabalhar de maneira coordenada, cumprindo um mínimo de repertório de ações. O IEPS preparou um check list de enfrentamento à covid-19 direcionado aos municípios, prevendo ações de rápida implementação em quatro dimensões essenciais. 
O protocolo indica como as prefeituras podem orientar suas ações a partir dos dados e evidências existentes; 
adaptar a organização dos serviços de saúde; 
fortalecer a prevenção através da comunicação com a população; e, 
por fim, reformular estratégias de gestão instaurando uma cadeia de comando e controle eficiente durante o período de crise. 
Não há tempo a perder: 
se quisermos evitar o total colapso do sistema hospitalar do país dentro de um mês, é necessário que governo federal e as prefeituras implementem essas ações esta semana.

O Estado de S.Paulo/Saúde - Armínio Fraga, Miguel Lago e Rudi Rocha,  Presidente do Conselho e diretores do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde.